Tags

from the vault

A história de como eu terminei com você e como você perdeu a minha versão que ninguém nunca teve
Autorais, Livros

A história de como eu terminei com você e como você perdeu a minha versão que ninguém nunca teve

Eu nunca contei a história de quando eu terminei com você. De quando eu senti, dentro de mim que tudo tinha chegado ao fim. Quando eu decidi botar um ponto final. Quando eu senti que, se transformasse o ponto final em ponto e vírgula, eu me sentiria aprisionado, murcho, triste.

Leia ouvindo: Babe, Taylor Swift (Taylor’s Version)

Era um dia ensolarado de julho, um feriado. Minha mãe me convidou para ir para a praia, onde nasci e cresci. Eu te convidei para ir junto, mesmo a gente não se falando tanto. Estávamos em um ciclo vicioso de brigas, silêncios, vácuos, espaçamentos. Mas, chamei. Minha mãe tinha te chamado também e ela nunca tinha feito isso. Você ficou feliz e eu também fiquei. 

+ Será que algo disso foi real?

Fomos todos de carro até a praia mais importante da minha infância. Eu, você, minha mãe. Sentamos ali na areia na cadeira de praia e conversávamos sobre a vida enquanto minha mãe comentava sobre o divórcio dela. Eu estava de coturno na praia. Eu odiava como a areia entrava no vão dos meus dedos do pé. Você, dizia que isso era ridículo. Minha mãe concordava, rindo. Eu não estava nem aí. 

Saímos para comprar protetor solar, para comprar sorvete, para tirar fotos… Voltamos. Ainda havia hostilidade nos nossos diálogos. Como um quebra-cabeças que luta para dar certo na peça errada. Parecia que estávamos forçando a barra. 

Sentei ali, quieto e abri meu Instagram. Vi que um amigo meu estava vindo para a praia com o namorado dele. Não era a mesma praia que a nossa, mas eles pareciam felizes com o sol e com o vento na cara enquanto passavam pela serra quente. Eu queria sentir aquela felicidade ali com você mas não tinha como forçar. Abri outro vídeo, e outro amigo estava também com seu namorado na praia. Amigo esse que já fora meu ficante um dia e que terminei tudo para ficar com você. Poderia ser eu ali com ele. Poderia ser eu sentindo aquela felicidade que o namorado dele agora sente no banco do passageiro. 

Mas estou com você nessa luta de tentar encaixar peças que não servem juntas. E não estou com aquele sorriso no rosto. Droga, será que escolhi a pessoa errada?

Já é fim de tarde e o sol começa a abaixar quando resolvemos ir embora da praia. Vamos dar uma volta no centro da cidade e voltar para a vida normal. Lá, você tenta agradar minha mãe, mas fala mal de mim com ela. Você não entende que ela pode falar mal de mim mas você não pode concordar? Você não entende que ela quer te ver ao meu favor e não contra mim? Não é assim que você vai ganhar.

Você parece arrogante. Superior. Minha mãe tem umas falas doidas, a gente sabe, mas não é pra você falar com ela assim. Eu sinto que tem algo apagado dentro de mim quando diz respeito a você, mas ainda não tenho coragem de jogar fora. Não sei como jogar fora.

Entramos no carro para pegar a estrada de volta e eu vou olhar para a janela, como sempre faço em viagens longas. Quando passamos naquela avenida da praia que tanto amo, vejo meu amigo saindo do shopping com o namorado. Os braços dele estão passados por cima do ombro do garoto e eles parecem rir, gargalhar como se o mundo fosse apenas um plano de fundo para um roteiro incrível que acontece ali, entre os dois. Poderia ser eu com as mãos dele em cima dos meus ombros. Poderia ser eu, ali, naquela trama, rindo como se não houvesse ninguém em volta.

Paramos no sinal e observo aquela cena. Olho para o terraço do shopping que dá para a praia e vejo os outros dois, que mais cedo vi no Instagram. Como que pode? Eles sequer se conhecem e estão no mesmo lugar, ao mesmo tempo. Um deles estica o braço para tirar uma selfie dos dois com a praia de fundo. Ali, não poderia ser eu. Éramos apenas amigos. Mas não consigo deixar de imaginar que poderíamos ser nós. 

Eu não sei em que ponto o quebra-cabeças se tornou impossível de ser montado, mas ali, vendo aquela selfie, aqueles braços sobre o ombro, as gargalhadas, eu tive certeza que poderia ser eu, mas nunca poderíamos ser nós porque eu não queria mais montar esse jogo com você. 

Seguimos viagem e o sol estava se pondo quando estávamos passando pela serra. Nesse dia ele demorou. Teve um eclipse no meio do caminho que fotografei tão ávido. Lembra de quando você me deixou sozinho no eclipse pra conversar com outro menino? Não, mas eu lembro. O sol se abaixava na linha do horizonte enquanto eu pensava repetidamente:

Poderia ser eu sorrindo naquele carro. Poderia ser eu com os braços no ombro. Poderia ser eu naquela selfie no terraço. Poderia ser eu, feliz na cidade que amo. Poderia ser eu sem coturno na praia não me importando com a areia no vão dos meus dedos. Poderia ser eu com alguém que minha mãe gostasse genuinamente. Poderia ser eu com alguém que eu não precise lutar, que eu não precise me afirmar todas as horas. Eu poderia ser eu se não fosse por você. 

Não me entenda mal. Eu gostava de verdade de você, apesar de achar que a recíproca nunca foi verdadeira. Era eu. Poderia ser eu em todos os cenários, mas em nenhum deles poderia ser você.

E quando o sol se pôs e o dia se fez noite, eu tive certeza de que não havia mais nenhum motivo pelo qual eu devia estar com você. Quando o sol se pôs, você perdeu a minha versão que ninguém nunca teve. E que bom que ninguém nunca teve porque em todos os cenários que imaginei, nunca poderia ser você.

Nunca poderia ser você porque eu não me orgulho da versão que eu era de mim mesmo quando estava com você. Eu não era eu. 

Eu só pude ser eu quando não pôde mais ser você. 

Será que algo disso foi real?
Autorais, Livros

Será que algo disso foi real?

Frequentemente eu me questiono se alguma coisa entre nós dois foi real em algum dia, em alguma hora ou em algum milésimo de segundo que seja. Parece que escrevo um romance do tipo “será que você algum dia me amou de verdade?” mas a realidade é que questiono tudo: a parte boa e as partes ruins. Sério? Eu não consigo acreditar que isso pode ter sido real agora, com 25. Mas, quando vejo meus olhos com 17, vejo tanto brilho. Eu acreditava naquela época. Como você teve coragem? Como as coisas mudaram tanto? Como a gente mudou tanto?

Leia ouvindo: All too well (10 minute version, Taylor’s Version), Taylor Swift

Eu chamava isso de amor, mas você nunca deu nome aos bois. Cara, como eu era ingênuo. Que ódio. Como eu te aguentava? Como eu suportava cada vez que você ignorava minhas playlists mas ouvia a do menino ao lado? Como eu conseguia relevar todas as vezes que você soltava minha mão para segurar a dele? É, eu era um babaca abusivo ciumento. Você me guardava como se eu fosse um segredo, o maior segredo da sua vida, enquanto eu… ah, eu te guardava como se fosse uma pérola. E seu egozinho inflado amava, né? Saco.

+ São quatro da manhã no meio da noite

Eu sinto raiva agora enquanto questiono se alguma coisa entre nós foi real, mas eu sei perdoar e entender a pessoa que fui. Mas você sempre foi casualmente cruel em nome da honestidade. A verdade é que sua honestidade era a crueldade. E eu? Eu era seu segredinho perverso que só servia como a porra de um pedaço de carne que você até gosta do sabor, mas que não vale a pena oferecer para a visita. Para as visitas, a gente compra algo melhor. Para a família então… Melhor comer fora, né?

Eu lembro de tudo, mas questiono minha memória. Será que isso foi real? Será que todas as vezes que você olhou nos meus olhos e disse que eu era a melhor coisa que tinha acontecido na sua vida algo passava perto da verdade? Será que todas as vezes que você olhou ao seu redor e viu que eu não estava ali, você sentiu minha falta? Ou será que você só sentiu falta da constante aprovação que eu te dava? Porque convenhamos, a gente sabe que eu não tinha a autoestima das melhores, nem você, mas eu te dava o que restava da minha. E você sugava até o último talo. Até a última mísera gota da minha alma.

É, eu sou legalmente obrigado a fazer terapia porque sou terapeuta mas, quando me perguntam o que me levou pra lá, eu poderia dizer que é você. Isso até inflaria seu ego. Mas a real é que o que me levou até aquela porta branca do consultório seis foram os machucados que você deixou para trás quando você explodia. Você foi uma bomba atômica e eu o território que te recebeu.

E ainda questiono? Será que tudo isso foi real? Será que você foi tão ruim assim? Será que não é minha mente abusando? Será? A gente sempre tende a diminuir nossas experiências depois que elas passam, né? Será que você me deixou mesmo com vontade de chorar no momento mais importante da minha vida? Não, acho que eu era muito emotivo e imaturo emocionalmente. Será que você se sentiu mal por mim quando eu fui promovido para o cargo que eu mais queria no mundo mesmo? Não, era só um dia ruim, né?

Será que todas as vezes que você não quis trabalhar, você estava realmente indisposto? Ou será que você só queria boicotar a minha felicidade da mesma forma que você acha que boicotei a sua quando você não foi embora para a faculdade que queria? Eu sei que você diz que nunca foi por mim, mas a verdade é que você não foi por você. Assuma os riscos das suas escolhas e consequências.

Mas, será que tudo isso foi real mesmo? Todas as vezes que você pegou minha mão em público e disse que éramos nós dois contra o mundo e que você era minha família? Será que foi real mesmo quando você simplesmente cuspiu na minha cara? Será que foi real mesmo quando sua família me ameaçou e você não fez porra nenhuma?

Afinal, a culpa sempre foi minha, né? Eu era livre demais. Eu usava piercing e nunca iam aprovar meu piercing. Chega a ser patético, né? Considerando que o problema “nunca foi” sua sexualidade. Será que foi verdade mesmo quando você me levou pra outra cidade pra boicotar a porra da única festa de aniversário que tive com amigos na minha vida? Não, acho que eu quis ir junto.

Eu sei que você guardou aqueles meus dois casacos. Eu sei que eles ainda cheiravam a mim e te lembravam de inocência, dos meus olhos grandes e brilhosos. Eu sei que você tenta desesperadamente caber dentro deles. Será que isso também foi real?

Ingratidão que corrói
Autorais, Livros

Ingratidão que corrói

Eu sempre te ajudei. Me lembro como se fosse hoje quando você me chamou no chat e perguntou se podíamos marcar um encontro. Topei, fizemos coisas lindas juntos. Fomos ao infinito e além em direção daquilo que a gente sempre sonhava. Até que chegou o dia que chamo de dia da ingratidão. Até hoje não entendi o que aconteceu, nem o porquê, se quer saber a verdade.

+ Quero abraçar o mundo todo, todo o tempo

Eu confiava minha vida em você e você veio, em tom seco e ríspido, cortando meu barato dizendo que eu tinha te decepcionado. Parecia uma projeção. Era de mim mesmo que você estava falando? Hoje, sei que não. Você não se referia a mim. Você estava com seus próprios problemas, mas, chegou com a faca afiada e enfiou dentro do meu peito. Sangrei por dias e noites, sem entender a sua ingratidão. Você não me deu a chance de entender.

Leia ouvindo: You need to calm down, Taylor Swift

Eu recebi a facada com a faca que eu te ajudei a construir e depois, de tão bom grado, te ajudei a afiar. Como se eu fosse uma pessoa qualquer que sequer sabia como afiar ou fazer uma faca, sendo que, eu que tinha aberto as portas para você passar. Como você pôde? “Eu não confio mais em você”, falou de forma ríspida, como se fizesse terapia à fio por anos, como se fosse analisado e estivesse colocando limite em alguém que fora abusivo.

Depois disso, sem falar comigo, você usou as facas que aprendera a construir na minha oficina e jogou fora aquelas primeiras que fizemos juntos, mal feitas, quanto estávamos nos aperfeiçoando. Ingrato. Sim, você fingiu que era um ferreiro profissional e que tinha aprendido tudo sozinho, há anos, quando na verdade tinha me esfaqueado com a minha própria faca. Que fiz com minhas próprias mãos.

Hoje, você sequer tem uma faca para afiar. Você veio e me pediu uma emprestada. Eu até emprestaria, mas sei que não preciso e não quero fazer isso porque, meu anjo, eu nunca precisei esfaquear ninguém para ser um ferreiro de primeira. Posso ter tido recaídas, mas ainda estou aqui e, nessa oficina, você não pisa nunca mais.

É, anjinho. Nunca precisei esfaquear ninguém, mas também não sou um santo, não. Além de facas, sei afiar um bom tridente para te empurrar nos mármores mais quentes do inferno. Você e sua ingratidão.

Tarô, revele meus segredos mas não conte se houver coisas ruins
Autorais, Livros

Tarô, revele meus segredos mas não conte se houver coisas ruins

Entrei no supermercado com Mary e fiquei no canto com ela e o carrinho enquanto sua mãe ia atrás das melhores frutas para a sobremesa do almoço. Lembrei que meu tarô tinha ficado em casa, droga.

— Socorro, Mary, dei um match no tinder! — Falei, querendo contar para alguém que era Hugo. Mas ela nem sabia da existência dele. Ou sequer lembraria, já fazia muito tempo.


Leia ouvindo: Heaven, Julia Michaels

— Como assim Tinder, menino? Você não namora?

— Não mais. — Sorri de lado. — Como eu mando oi no Tinder? Será que “Hey” é uma boa?

— Meu Deus. Você está impossível. Saiu quinta e sexta, né? — Ela estava me julgando.

+ Sou apaixonados pelo final
+ Coisas pequenas (e ir na balada) ferem mais

— Não me julgue, bitch.

— Tá. Mas “hey” é ridículo. — Ela disse, e saiu para ir encontro com a mãe dela. — Fica de olho no meu carrinho.

Abri a janela do Hugo e mandei hey. Desliguei meu 3G e guardei no celular. Não queria ver o momento exato em que ele me responderia ou desse unmatch, depois que se lembrasse de tudo que fiz no passado.

E nada de Lucca aparecer. Honestamente, ele estava sendo a mentira mais bem contada que eu vivi e acreditei por dois longos anos. Não temos reciprocidade. E sem reciprocidade não é amor, é insistência. E qualquer número multiplicado por zero, continua sendo zero.

— Vamos, migo? Minha mãe já pegou tudo. — Mary quebrou meu diálogo interno e fomos encontrar Rose no centro da cidade. Ela estava surtada por esperar meia hora na chuva, com razão.

— Eu vou dar na cara de vocês dois, ridículos. — Rose era muito amorosa.

— Vamos comer? — Eu não tinha comido nada desde ontem.

— Vamos, mas você vai contar todos os detalhes do seu término na mesa.

Topei e fomos para o shopping. Pedi meu Subway vegetariano e assim que elas voltaram, me olharam com cara de quem diz “vai, desembucha”.

— Ah, não estávamos bem há algum tempo. Muitas promessas não cumpridas e logo na segunda semana do ano, brigamos. Agora ele sumiu, não fala comigo há mais de uma semana…

— Sumiu? Caralho, que embuste. — Rose era bem parecida com Ann nesse quesito, desbocada.

— Sim. E eu baixei o Tinder. Estou tentando não ligar muito para isso, já que 2018 é o ano do karma, regido por Júpiter, tudo o que a gente plantou, vamos colher. — Continuei. — O tarô também disse que tínhamos que dar um tempo…

— É verdade. Tem muita gente reatando. — Mary completou.

— Caralho, lê meu tarô? Não estou bem com o corno do meu namorado também… – Rose era do Rio, por isso ainda falava palavrão como se fosse bom dia.

— O que houve? E como assim ele é corno, Rose? — Mary e eu rimos, Rose só ficava mais indignada.

— Ai, longa história. Depois conto para vocês. Vai rolar o tarô?

— Posso fazer, mas estou sem meu baralho. Tem algum lugar aqui perto que vende? Preciso comprar um novo. — Por favor, que sim. Eu quero muito um baralho novo.

— Tem. Vamos comer, passamos lá e ficamos em casa de tarde, pode ser?

— Fechado, Mary. — Respondemos juntos.

Depois que comemos, paramos em uma lojinha super pequena que vende velas e imagens de vários tipos de santo. De várias religiões diferentes.

— Boa tarde, você tem baralho de tarô? — Perguntei.

— Tenho baralho cigano, tarô de marselha e esse simples aqui. — A moça, com uma energia ótima, me respondeu. Eu sabia sentir a energia das pessoas, e isso é algo que eu digo ter herdado da Sasha, minha cachorrinha. Foi por ela que virei vegetariano. Sabe que, a primeira vez que Lucca foi em casa, ela sentiu uma energia estranha vindo dele? Achei que era pela altura. Lucca era bem alto.

Você acredita em energias? Há quem diga que somos seres humanos e por isso não emanamos nenhum tipo de força. Maior besteira que alguém pode dizer. Energia é física. Movimento produz energia. Um carro andando, uma cachoeira… Tudo gera energia, e ela é a moeda de troca no universo em que vivemos. Se você faz o bem, você recebe o bem. Se faz o mal, recebe o mal. Se te derem o mal, dê a eles o perdão. Você também vai receber quando precisar.

Tive um tio-avô super homofóbico, que zoava todo mundo, inclusive meu avô, que tinha menos dinheiro que ele. Ele era uma pessoa nojenta energicamente. Existem pessoas com energias boas, ruins e energias nojentas. Sabe quando você conversa com alguém e sente vontade de vomitar? Então, é isso. Ele pegou câncer uma vez, e virou a melhor pessoa do mundo. Se curou. Achou que o rei morava em sua barriga de novo, e voltou ao mundo de maldades.

Agora, o câncer voltou. Ele não tem mais sistema digestório e está vivendo entubado dentro de um hospital, quase morto de remorso. Fui vê-lo, apesar de eu ser a bichinha da família. Dei o perdão quando ele me deu o inferno, e é assim que devemos ser.

— Quero o simples. Vou passar no cartão de crédito. — Respondi.

— Certo. — A moça cortou um pedaço de papel e embrulhou a caixinha do baralho com todo o cuidado do mundo. Entreguei meu cartão de crédito.

Recusado.

— Ué, acho que deixei bloqueado no aplicativo. Deixa eu ver aqui, moça… — Peguei meu celular. “Nova mensagem de Hugo em Tinder”. Tremi.

— Cobra aqui no dinheiro mesmo, moça. — Ela cobrou e saímos. Guardei meu celular, ansioso para ler a mensagem de Hugo.

— O crush respondeu, socorro. — Disse, mas as meninas nem ligaram.

Chegamos na casa da Mary e a primeira coisa que fiz foi abrir o Tinder.

“Hey”

“Tudo bem?”

Hugo havia me mandado duas mensagens.

“Tudo e você?”

“Quanto tempo. :(”

Desliguei o celular mais uma vez.

— Vamos consultar o tarô?

— Vamos, mas se sair coisa ruim não me fala, tá? Não vai mudar nada. — Rose estava com medo.

Coisas pequenas (e ir na balada) ferem mais
Autorais, Livros

Coisas pequenas (e ir na balada) ferem mais

O meu despertador é escandaloso. Bosta, eu esqueci de tomar água entre as latinhas de Skol Beats na balada ontem e a minha cabeça está explodindo. Me vesti, e peguei o celular só depois de estar pronto para sair de casa. Nenhuma mensagem de Lucca. É Pietro, é você e você e as coisas pequenas que só você se importa.

+ Sou apaixonado pelo final

“Bom dia, miga! Vamos na Clock Out, hoje?” Mandei no Whatsapp para a Anna e segui para a minha jornada de 40 minutos até o trabalho. Era longe, e eu sempre levava o Kindle na bolsa, apesar de nunca lembrar de ler. Mas hoje, eu estava sem sono e de ressaca, precisava de uma distração. Não se apega, não, da Isabela Freitas parece perfeito. Já li três vezes, e nunca é tarde para o início da quarta.


Leia ouvindo: Kissing Strangers, DNCE & Nicki Minaj

Eu sei que ela terminou com o namoro de dois anos e todo mundo ficou espantado. Qual é, eu também terminei. Algumas pessoas se espantaram, mas a maioria falou que eu tinha me livrado de um super embuste. Será? A verdade é que ninguém nunca sabe o que se passa dentro do nosso relacionamento, só nós mesmos. Eu já ouvi de tudo:

“Nossa, ele parecia ser super amoroso com você, e você sempre parece tratá-lo mal.”

É, ele era amoroso comigo. Depois de cortar minha vibe e me deixar puto por me magoar de alguma forma. Sou fã das coisas pequenas, e são elas que também me deixam mais triste. Então sim, ele era um amor. Só que tínhamos acabado de brigar, e na sua frente, ele estava sendo cínico. Sim. Ele estava ignorando tudo o que tinha acontecido, quando eu queria conversar ou discutir até resolver nosso desentendimento. Se você namora, saiba disso. Nunca ignore ou negligencie nada que a outra pessoa sente. Sério. Coisas pequenas machucam mais que uma traição. A gente passa a vida toda sabendo que se um dia a gente for traído, vamos bloquear nas redes sociais e encontrar alguém que nos valorize. Mas o que a gente faz quando a pessoa diz que sua ideia de trabalho de graduação é uma bosta e nunca vai ter capacidade de tirar um 10? Porque a dele é muito melhor, ele é mais velho e tem muita experiência. Você contém as lágrimas e quer ficar no seu canto, certo? Aí a pessoa, volta como se nada tivesse acontecido. Ah, oi né? Prazer. Dois anos comigo e você ainda não sabe que odeio chiclete e não posso sentir o cheiro de feijoada que me dá enjoo.

“Você precisa dar mais uma chance. Só mais uma.”

Meu amor, quem quer faz perfeito em uma chance. Ok, somos humanos e sempre merecemos uma segunda chance, talvez uma terceira. Minha mãe sempre dizia que errar uma vez é tudo bem, mas persistir no erro é burrice. Então reprovei uma vez na autoescola. Ela ficou triste, mas disse que na segunda vez eu passaria. Só burros não passavam. Reprovei de novo. E ela disse que também estava tudo bem. Passei na terceira. O problema aqui é que eu já dei 600 chances. Foram dois anos comigo, uma chance por dia. No começo, não íamos dormir brigados em hipótese alguma. Ou sem dar boa noite. Depois, as brigas ficaram mais sérias e dormimos brigados. A coisa começou a definhar, eu temia o fim, então me agarrava aos bons momentos e ia até onde dava. Uma hora não deu mais. E “não deu mais” bem tarde. Eu tinha medo de me sentir só. Mas aos poucos eu sinto um comichão da liberdade dentro de mim. Eu não precisava ter dado mais que três chances. Não dê ao outro aquilo que você não dá nem para si mesmo.

“Vocês eram um casal perfeito. Achei que fossem casar.”

O que é um casal perfeito? Aquele que é lindo na frente das pessoas e entre quatro paredes, há só xingamentos e julgamentos? Porque se for assim, éramos. Lucca não tinha uma religião muito conhecida e eu sempre respeitei. Até o dia em que resolvi aprender a jogar tarô e ele me zoou. Porra, eu respeito sua crença e você não respeita a minha? Pera lá. Não, Lucca, não era só uma brincadeira. Toda brincadeira tem um fundo de verdade e eu sei que você zoa as pessoas para se sentir melhor. Mas não sou seu amiguinho hétero. Eu sou… Eu era o seu namorado. Aquele que você cozinhou por três meses no banho e maria antes de assumir, deu um fora no meio da balada, disse que nós nunca poderiamos ficar juntos, logo antes de virar as costas e o deixar chorando na sarjeta sem nem um táxi próximo. Não é rancor. Certas cicatrizes penetram fundo demais para sumirem. E agora, parece que o jogo virou. Ou não. Você nem sequer falou comigo ainda. Talvez queira terminar e nunca teve coragem de dizer, preferiu sumir como um covarde faria.

Piiiiiii.

Era o meu ponto. Quase perdi em meio aos devaneios, sorte que o cobrador me conhece e deu o sinal para descer, bem ali, próximo do quartel onde meninos de 18 anos estão saindo do alistamento militar obrigatório. Que medo. Isso me lembrava o Hugo, um menino que dei match no Tinder antes de namorar com o Lucca. Conversamos algumas vezes, saímos duas, nos beijamos e depois, sumimos da vida um do outro. Eu havia seguido ele no Instagram de novo, há alguns dias, e ele me seguiu de volta. Será que eu devia chamar? Não. Ele deve ter ranço de mim.

“Vamos. Quero ver você cheio dos novos contatinhos, hein.” Anna me respondeu, e vi assim que entrei no prédio em que eu trabalho.

“Estava pensando em um menino que fiquei anos atrás. Acho que destruí ele, queria tanto resolver essa pendência.” Comentei.

“Como assim destruiu? Me explica!” Ann respondia rápido.

“Vou te mandar um áudio…”

“Minha história com o Hugo foi rápida mas intensa. Um dia, demos match no Tinder e combinamos de nos encontrar no parque próximo ao meu trabalho na hora do almoço. Ele era do signo de libra também, tímido e parecia um pouco comigo. Nos encontramos antes disso. Ele estudava na escola que fiz o ensino médio, no período da manhã. Nesse dia, eu já tinha tirado meu horário de almoço, mas meu chefe saiu e eu saí para encontrar ele em uma praça, que era bem longe. Sentamos e conversamos por horas sobre a vida, não nos beijamos nesse dia. Nenhum de nós tomou a iniciativa. Ele também falou que não beijava em primeiros encontros. Continuamos conversando depois desse dia, ele era legal e me mandava bom dia todos os dias. Nesse meio tempo, eu já conhecia o Lucca, mas ele estava me dando vários foras. Eu gostava dele, mas não podia abrir mão dos meus contatos. Então beijei o Hugo no segundo encontro, e ele ficou apaixonado por mim. O melhor amigo dele shippava a gente…”

Enviei.

“Hugo não ia muito em baladas, mas um dia, o melhor amigo dele descobriu que eu ia, e levou o Hugo com ele. A ideia era que ele me encontrasse e ficássemos de novo. Mas nesse dia, fui na balada com o Lucca e o Hugo veio me cumprimentar. Eu o tratei como um qualquer, fui bem embuste. Não o vi o resto da noite, fiquei com o Lucca e depois descobri que o Hugo deu um PT enorme. No dia seguinte eu estava bloqueado em tudo.”

“Estou ouvindo, comovida.”

Alguns minutos se passaram até que Anna ouvisse meu áudio interminável.

“Olha amigo, eu acho que você devia chamar ele. Vocês já se seguiram no Instagram e agora estão trocando likes. Explica que tinha 18 anos. Vocês dois eram crianças, sabe? Tudo tem um jeito.” Ann ponderava bem as situações e eu gostava disso nela.

“É, talvez. Mas preciso de um sopro de coragem ainda.”

“Hoje a noite você vai ter! Quero rebolar até o chão ouvindo Vai Malandra”

Comecei a gostar de funk depois que saí a primeira vez com Anna. Antes eu abominava, agora, não posso ver que minha bunda mexe sozinha. Meu dia de trabalho passou vazio, então fui embora mais cedo. Chegando em casa, resolvi baixar o Tinder e dar alguns likes para ver se as pessoas ainda se interessavam por mim.

Nada.

Comecei a me arrumar para sair com a Anna. Coloquei minha roupa de balada, meu coturno e ela chegou pontualmente com o carro tocando Vai Malandra no som máximo. Me tornei aquela pessoa que abominava: o ser que anda ouvindo a música de vidros abertos e berrando cada letra. Êta loca, tu mexendo com o bumbum. An an. Fomos comer uma pizza antes, vegetariana.

– Ann, baixei o Tinder.

– Você tá me zoando? E aí? – Ela parecia mais animada que eu.

– Estou dando uns likes, mas nada de matches ainda.

– Quero só ver. E quero ver você voltando da balada hoje com a boca inchada de tanto beijar. Igual eu, quando voltei da micareta de carnaval, lembra? – Ô se eu lembrava.

– Ah, não sei. – Ri de nervoso. – Talvez. Vamos indo para a fila da Clock Out? Os 200 primeiros entram de graça, quem sabe a gente consegue.

– Vamos. Não está muito cedo?

– Só vamos.

Chegamos ao som da música da Anitta de novo, e logo na entrada encontrei Gabriel, um amigo de longa data que já estava mais pra lá que pra cá. Força, migo. Você sobrevive a essa noite. Claro que a fila já estava imensa e não conseguimos entrar de graça, mas Ann fez várias amizades. Enquanto isso eu estava só passando umas fotos no Tinder. Sem paciência para socializar.

– CARALHO, ANNA, OLHA ISSO. – Puxei ela da sua rodinha nova de amigos para que olhasse a tela do meu celular, que mostrava “Hugo, 21”. – Será que dou like? Eu fiz um jogo de tarô perguntando se deveria chamar ele e deu que sim… Mas também pedi um sinal, será que é esse?

– VOCÊ AINDA DUVIDA? APERTA ESSE CORAÇÃO AÍ.

Apertei, mas não deu match. Tudo bem, talvez ele ainda não tenha visto.

A fila começou a andar e entramos na Clock Out às 23h30. Já chegamos bebendo e indo até o chão no cantinho do palco, onde a gente mais gostava de ir.

– Oi, você é o Pietro Corrêa? – Um menino chegou falando comigo do nada.

– Sou. – Estava surpreso, e assustado.

– E essa aqui é a Anna Pereira? – Ele aponta para Ann do meu lado.

– É, por quê? – Rindo.

– Caralho, eu amo vocês! – E ele abraçou Anna como se conhecessem há muitos anos. De longe, vi meu amigo Augusto e dei um tchauzinho. Ele veio na minha direção.

– Oi, migo, como você está? – Augusto era bem fofo, e uma pessoa com coração enorme.

– Estou bem, e você? – Gritei, enquanto Ann ainda conversava com o desconhecido.

– Também. Não vi o Lucca….

– Ah, acho que terminamos. – Cortei antes que ele falasse mais alguma coisa. Augusto acompanhou meu relacionamento desde o início, todos os sofrimentos por conta do Lucca. Sua cara foi de espanto.

– Poxa… Mas vamos dançar!

– Vamos! – Continuei dançando, e ele foi para o cantinho dançar com o desconhecido. Ann voltou para o meu lado.

– Que porra foi essa? – Perguntei.

– Lembra daquela tour polêmica do LDRV que conversamos com um desconhecido?

– Lembro.

– Era ele. Você podia dar um beijinho nele.

– Ah, melhor não. Vamos dançar.

Dançamos mais algumas músicas, até que o funk acabou e começaram a tocar pop. Típico da Clock Out.

– Amigo, vamos lá fora? Minha pressão baixou. – Ann me puxou.

Ficamos um tempinho na área externa da balada e não demorou para eu me sentir tonto também. Tinha alguma coisa estranha ali. Só sei que entramos, e passamos o resto da noite sentados, de novo. Levantávamos em algumas músicas, mas não conseguíamos ficar em pé. Já era uma da manhã.

– Ann, vamos embora?

– Amém, vamos. Não sirvo mais para vir em balada não.

– Nem eu. – Respondi, rindo mais uma vez. Nós nunca aguentávamos nada.

Cheguei em casa da mesma forma que a noite anterior, e só me deitei na cama, dando mais alguns likes no Tinder.

“Ei, vamos no centro da cidade amanhã cedo?” Era a mensagem no grupo Galera de Caubói, com minhas duas melhores amigas do ensino médio.

“Vamos. 11h todos nos encontramos na praça?” Respondi.

“Fechado. Pi, te pego aí se quiser. Estarei por aí nese horário.” Mary respondeu.

“Beleza! Quero, Mary. Vou dormir agora porque tô beudo. Não sou mais jovem pra ficar indo em balada.”

A próxima coisa que me lembro é do meu despertador tocando. Caraca, vou atrasar a Mary. Corri para o banho, sem nem olhar para o celular pensando em uma mensagem de Lucca. Elas não sabiam que eu estava mais pra lá que pra cá no meu relacionamento. Na verdade, Rose sabia, e ela havia dito para eu terminar várias vezes.

Saí do banho e Mary estava me esperando na portaria com sua mãe e avô no carro. Sentei atrás.

– Migo, minha mãe quer passar no mercado, tudo bem para você?

– Claro, Mary. Sem pressa. – E peguei meu celular para ver as notificações do dia.

Nada do Lucca.

“Parabéns, você tem um novo match no Tinder. Mande um olá para Hugo.”

Tremi.

Sou apaixonado pelo final
Autorais, Livros

Sou apaixonado pelo final

Cá estou eu de novo, começando mais uma narrativa, mais uma história na biblioteca da minha vida. Só que pelo final. Sempre começo pelo fim, não sei qual é o meu problema com os inícios. Hoje é quinta-feira, o ano acabou de começar, e eu já cheguei ao final do meu namoro. Na verdade, ele terminou comigo. Ou não. Não sei bem.


Leia ouvindo: TiO, Zayn Malik

É fato que já estávamos brigando todos os dias no último ano. Mas eu, bem trouxa, sempre perdoei todas as vezes em que ele sumiu nos finais de semana, me deixou falando sozinho, me cortou no banco de trás do carro dos meus amigos quando eu estava falando algo muito importante para mim. O fato é que eu nunca poderia estar em uma posição melhor. Talvez seja normal que casais gays vivam em uma eterna competição. Mas eu sempre achei melhor correr nela a favor dele do que contra. Mas ele nunca pensou da mesma forma.

+ Crônica: Augusta, que saudade

Hoje é quinta e desde sábado, ele não fala nada comigo. Não mandou uma mensagem, uma direct no Instagram e nem uma ligação. E ele teve motivos para falar comigo: meu avô está em estado grave na UTI, e ele é tudo para mim. Lucca sempre soube que eu era instável quando se tratava do meu vô Antônio. Eu também descobri que vou ter que operar o nariz. Meu nariz que já serviu de cópia para pelo menos três plásticas, não funciona. E nada me amedronta mais que operar o nariz. Ah, também surgiu uma manchinha perto do meu olho que o Google diz ser câncer de pele. Ele poderia ter sumido em todas as semanas, menos essa. Eu realmente precisava de algum apoio.

— Pi, vamos na balada hoje? Estou sozinha. — Era minha amiga Anna, anos mais velha e mais sábia, que esteve comigo nesses últimos dias. É incrível como a amizade perfeita aparece nos momentos mais improváveis. Conheci Anna em um emprego que ela odiava e eu também. Nunca seríamos amigos, éramos muito diferentes. Mas o destino cruzou nosso caminho. É como dizem, a perfeição jaz na exceção.

— Vamos, Ann. O Lucca não falou comigo até agora mesmo. — Bufei, desanimado.

— Existem níveis e níveis de cuzãozisse, Pietro. Você está solteiro. Não tem como você esperar que ele volte, talvez ele nem volte. — Ela fez uma pausa — Me desculpa. Mas sua vida não pode parar pelas pessoas. Você está solteiro agora, aproveite isso. Passo aí em 15 minutos.

— Estarei pronto. Vamos naquela balada de hétero? — Sorri, já me animando um pouco mais.

— Bff, é o que tem pra hoje, né viado?

Anna é uma pessoa incrível, e poucas pessoas conseguem ver isso nela. Ela é peculiar, mas do jeito que fala na lata. Não economiza nenhuma palavra, e também não mede esforços pelos seus amigos. Sua vida há teve muitos altos e baixos, e muitas das preocupações que tenho, ela não tem mais. Por isso levo os conselhos dela tão a risca.

Coloquei uma calça jeans, uma camiseta neutra e uma camisa xadrez por cima. Ann chegou em ponto, e assim que entrei no carro, ela colocou um sertanejo bem alto para tocar.

— Que porra é essa, Anna? — Ela não gostava, assim como eu.

— Já que vamos para o habitát dos héteros, temos que nos acostumar. — E fomos. Não foi estranho estar sem meu namorado hoje, porque já vim nesse lugar várias vezes sozinho. Me permiti dançar e beber duas latinhas de Skol Beats.

O Trup, bar e casa noturna dos héteros não dava para suportar por muito tempo.

— Pietro, vamos embora? Cansei. — Anna se apoiou no meu ombro.

— A gente chegou tem 47 minutos. Vamos. — Ri.

Fomos embora depois de pouco tempo mesmo, porque simplesmente não dá. E ainda era dia de semana. Também era inevitável parar de olhar para o celular e esquecer Lucca.

— Acho que chegamos ao final, Anna. — Quebrei o silêncio no caminho de volta. Ela abaixou o som.

— Você acha, Pietro? Ele não te mandou uma mensagem sequer, e todo mundo do grupo ficou apavorado quando você deu a notícia da cirurgia. — O grupo era nossa conversa no WhatsApp com os amigos da vida. Um da balada, outro do trabalho, um amigo de outra amiga… — Vamos na Clock Out amanhã? Podemos comer e ir.

— Fechado. Mas só se ficarmos mais de 40 minutos dançando.

— É a noite do funk, bebê. Vamos nos falando. Beijo! — Desci do carro e entrei no meu prédio, ainda sem acreditar que depois de anos, eu ainda conseguia sair no meio da semana. Eu não estava morto não.

Antes de adormecer, baixei o Happn. Se eu estava solteiro, precisava conhecer pessoas novas. Não para beijar ou namorar. Eu precisava mesmo conversar com pessoas novas. Sabe aquelas conversas fúteis que começam com um oi e você chega ao final contando sua história de vida? Então. Deixei ligado e dormi, sem pensar em nada.

O coração humano é um instrumento de muitas cordas
Autorais, Livros

O coração humano é um instrumento de muitas cordas

Nicholas – 1:13 AM: Oito horas amanhã. Evite atrasos. Era a mensagem do meu namorado no visor do meu celular que fazia meu coração vibrar de ansiedade. Fazíamos um mês hoje. Um mês que a minha vida tinha mudado definitivamente, apesar dos primeiros passos terem começado meses atrás. Viajaria para São Paulo em algumas horas, eu queria tudo perfeito em mim mesmo. Queria estar impecável, porque ele não merecia menos que isso, jamais.

Ok, eu me atrasei quarenta minutos. Peguei dois ônibus. Porra Gabriel, você não consegue cumprir horários não? Cheguei ao terminal rodoviário e fui à procura dele.

Gabriel – 8:44 AM: Onde você está????? Cheguei.

+ Muito para o meu final feliz
+ Você sabia (e usou isso ao seu favor)

Vi-o vindo ao meu encontro no exato momento em que pressionei enviar. Nick me envolveu naquele seu abraço cheiroso mais uma vez. Feliz um mês. Um mês, cara. Um mês que eu havia contado aos meus pais que estava apaixonado por um garoto. Um mês, que esse mesmo garoto me levou ao cinema e me pediu em namoro. Um mês desde o dia que eu esperei minha vida toda. Um mês que eu era a pessoa mais feliz do mundo.

Vamos comer? Pão de queijo e Toddynho? Eu amava essa combinação mais que qualquer outra. Comemos frente a frente, e, porra, como seus olhos eram perfeitos. Como sua boca era um paraíso. Eu podia observar Nicholas por horas sem nem mesmo pensar em enjoar. Observar cada centímetro da sua pele, cada detalhezinho que eu tanto amava.

Leia ouvindo: Today was a fairytale, Taylor Swift

Embarcamos, finalmente. Não sei como Nicholas se sentia, mas eu me sentia refugiado da realidade quando estava em seus braços, longe de casa. Sabe aquela sensação de insegurança que sentimos quando começamos a sair sozinhos e que sempre nos acompanha como uma pontada interna? Não existia com ele. Não existiam medos, nada. Seus braços ao redor de mim eram tudo o que eu precisava, ali.

A viagem começou tranquila e levou cerca de duas horas. Duas horas de beijos intermináveis, duas horas de ar rarefeito, duas horas de comemoração. Um mês. VOCÊ CONSEGUE ACREDITAR? Às vezes é difícil até pra mim. Sabe, pensa na pessoa que você mais gosta nesse momento. Pensa agora, na sensação de fazer um mês de namoro com ela. Um mês de promessas cumpridas e felicidades plenas. PENSOU? Isso talvez seja 1% do que eu sinto. Lembra que eu dizia que nosso problema é sentir demais por quem sente de menos? A nossa solução, é sentir demais por quem tem reciprocidade. Preenchimento.

Nick e eu temos gostos parecidíssimos. Chegamos em São Pauo para a nossa comemoração, então. Eu sempre fui aquela criança fascinada por histórias. Talvez seja por isso que tenha começado a criar as minhas. Mas era fato que eu sempre gostei de saber de onde as coisas vieram e pra onde elas foram. Eu tinha aquela curiosidade.

Certa vez, quando tinha sete anos, pesquisei uma apostila de cerca de cem páginas sobre histórias em geral. Imprimi, acabei com a impressora da minha tia. Ela não ficou brava, mas me prometeu me levar ao museu algum dia. Eu nunca havia estado em um, até então. Mas o mundo dá voltas e ela nunca foi capaz de cumprir sua promessa. Eu sendo criança, jamais esqueci. Mas crescemos também, e certas coisas ficam para trás.

Quer ir ao Museu da Língua Portuguesa? Tremi, e sem pestanejar, aceitei. Eu finalmente iria a um museu, então? Assim, sem nem me preparar? UAU. Entrei com meu namorado no elevador, e logo estávamos numa sala escura diante de um corredor enorme ladeado por uma televisão de caralhocentos metros. Nicholas me abraçou por trás enquanto eu apreciava aquela visão e tirava umas fotos. Era minha primeira vez em um museu, eu mal conseguia falar. Sabe, não é o museu em si que te deixa sem palavras. É o ato de ter uma promessa cumprida. Talvez não pela pessoa que a prometeu, mas existe o desejo dentro da gente mesmo quando as promessas não são cumpridas. Porque elas criam expectativas. E agora, com ideia de 1% do meu sentimento de fazer um mês, acrescente a realização de uma promessa, com a melhor pessoa na sua vida.

A entrega saiu melhor que a encomenda, não é como dizem? Esperar dói, mas retribui uma hora.
Apreciar museu é uma arte que poucos têm capacidade de fazer. Não são todos que tem paciência para acompanhar a história de uma coisa. Ainda mais a história da língua que se fala. Você pode pensar, assim como eu, que isso talvez seja meio absurdo, impensável. Mas é normal. Extintos são aqueles que são curiosos. E acrescente mais isso na minha lista de sortes na vida: Nick sabia apreciar museu da maneira que eu gostava de apreciar. Ele tinha aquela paciência de me abraçar enquanto eu via algo, dar suaves beijos no meu pescoço e murmurar coisas ao meu ouvido que me faziam sentir infinito. Assim como era o meu amor por ele.

Nosso primeiro beijo foi caloroso ao som de Hozier. Naquele desespero, eu jamais imaginaria que estaria beijando-o apaixonadamente meses depois dentro de um museu sobre língua e literatura. Sim, eu tinha mania de transformar minha vida em episódios que dariam um livro. E cá estou. Sentindo aquele amor capaz de incinerar o mundo ou ergue-lo em glória.

Andamos de mãos dadas por um bom tempo, despreocupados. É ótimo viver em lugares onde a probabilidade de encontrar alguém conhecido é praticamente nula. Andar de mãos dadas foi uma coisa mágica, porque é um gesto que poucos entendem. Trata-se de manter o contato, falar sem palavras. É algo do tipo “quero você comigo, não vá”.

Saímos de lá quando crianças de escolas surgiram por todos os lugares. Não me entenda mal, mas realmente não tem como apreciar um museu lotado. E já tínhamos visto tudo, então pegamos um metrô rumo à Paulista.

Eu gostava de lá, eu costumava dizer para os meus amigos que era um pedacinho de Nova York no Brasil. Podíamos encontrar tudo lá. Eu amava, apesar de nunca ter andado de verdade por ela da maneira com que queria. Eu sempre via todo mundo caminhando em suas melhores roupas, com tempo de ver cada construção diferente, o ápice de ser hipster, talvez. Mas nunca tinha feito isso. Queria muito.

Nick me levou para lá, então, e ia me contando histórias conforme passávamos por lugares icônicos. Eu amava isso nele. Meu vô foi meu contador de histórias preferido da infância, porque ele foi o único – até então – a compreender minha fascinação sobre como as coisas surgiram. Nicholas fazia o mesmo, contava histórias sobre como as coisas sugiram, citava nomes que eu jamais seria capaz de repetir… Eu gostava de vê-lo empolgado contando isso, e juro que tentava absorver o máximo possível do que ele falava. Claro que ficava hipnotizado inúmeras vezes pelas suas feições, mas quem nunca?

Depois de caminhar um pouquinho, fomos para “A” Livraria Cultura. Sim, aquela que vemos nas televisões e babamos pelo tamanho. Quantas vezes já não pedi para meus pais me levarem lá? No mínimo umas sete. Mas poucas pessoas se importam com o que queremos. Nick se importa, e é isso que o faz tão raro. A maneira singular com a qual ele cuida de mim e consegue tirar meus mais sinceros sorrisos. Ele nem precisava se esforçar pra isso.

Fiquei claramente entorpecido pelo milhão de títulos que meus olhos alcançavam. A livraria era interminável, e o cheiro, maravilhoso. Gostou, amor? Esse garoto existia mesmo? Seu recorde de me deixar sem palavras era cada vez maior. Já não sou uma pessoa de muitas palavras, mas sempre soube o que falar. Não agora.
Eu amei. Eu te amo, amor. Nós temos que chamar as coisas pelos nomes delas. Por isso o chamava de amor.
Sei que perdemos um grande tempo ali, e depois em uma livraria anexa, onde me deixei perder por um livro qualquer no chão. Eu poderia ficar por ali, com Nicholas, pra sempre. Era um escape tão genuíno da rotina, da realidade, que eu não queria que acabasse jamais.

O resto do meu dia, dos brilhos da minha constelação, transcorreu da maneira mais mágica possível. Nick rindo das minhas graças, nossas mãos entrelaçadas em público. Beijos na testa mostrando proteção. Alguns outros no pescoço que fica marquinha. Sabe, o amor nos faz imortal. E o meu amor por Nicholas, que já era infinito, ficou muito maior. Porque citando diretamente Charles Dickens, eu definitivamente o amava, e jamais me cansava de dizer isso. O coração humano é um instrumento de muitas cordas. O perfeito conhecedor dos homens, sabe fazê-las vibrar todas. Será que estava aparente que todas as minhas cordas dançavam em perfeita harmonia entre si, como jamais antes? E aqui, até concordo com Jane Austen, Ninguém jamais poderá amar verdadeiramente mais de uma vez na vida.

Nunca houve dois corações mais abertos, nem gostos mais semelhantes, ou sentimentos mais em sintonia. E sim, Nicholas, eu te amo, e te amarei até o dia em que eu morrer, e caso tenha vida após isso, eu te amarei por lá também. Se é que já não te amo de alguma vida anterior porque as tais cordas do Dickens não vibram por acaso, nem por força de destino. Elas vibram porque simplesmente foram feitas para serem tocadas única e exclusivamente pelos seus ágeis dedos. A vida é isso. A eterna busca pela alma gêmea que fará suas cordas vibrarem.

Não é fácil. Não são todos que conseguem. E é isso que torna a sensação tão rara e especial. E, nossa, dentre os meus azares, tive a maior sorte do mundo. A sorte de te (re)encontrar, alma gêmea. Amor das minhas vidas.

Você e eu poderíamos ser a melhor coisa de todas
Autorais, Livros

Você e eu poderíamos ser a melhor coisa de todas

Engraçado. Improvável. A melhor coisa de todas. Um mês desde que a gente se viu pela primeira vez e agora estávamos indo para São Paulo de novo. Improvável porque era uma terça-feira qualquer em que, eu provavelmente acordaria entediado para ir ao trabalho. Mas não hoje. Acordei mais cedo, um pouco feliz, o que é raro e fui ao shopping, andando para te encontrar. Não era o shopping do primeiro dia em que nos encontramos, mas isso não importava.

Leia ouvindo: Timebomb, Tove Lo

Estava indo para te encontrar e ir para São Paulo com você, mais uma vez. Pode parecer besteira minha, mas isso contava muito para mim. Sou fã das coisas pequenas e que não contam muito para as pessoas comuns. Mas eu não conseguia ser comum, apesar de tudo. Podia até tentar em vão, mas eu não conseguia. A beleza, para mim, sempre esteve na imperfeição. E o segredo em acreditar no improvável.

+ Os últimos momentos
+ Eternamente responsável por aquilo que cativo?
+ Aquilo (não) foi real

Acreditar no nosso país das maravilhas, sabendo que ele não é e nunca seria para sempre. Sabendo que poderíamos ser a melhor coisa de todas. Nós não somos para sempre, mas você e eu poderíamos ser a melhor coisa de todas… Enfim, só devaneios.

Devaneios póstumos, eu arrisco dizer. Coisas que pensei ao te beijar, sempre como se fosse a primeira vez. Devaneios que tive quando olhei no fundo dos seus olhos claros, decifrando coisas que você nunca teve coragem de dizer em palavras. Ou coisas que só existiam nas fantasias da minha cabeça. Nunca vou saber.

Nossa cabeça é meio vadia e eu lembrava de você nas coisas mais ridículas, como andar no nosso parque de volta do meu trabalho e sem querer falar ai meu deus, e ouvir sua voz sorrindo e repetindo a maneira com que eu falava. Porra, você e eu poderíamos ser a melhor coisa de todas.

Automaticamente, seu gosto volta à minha boca e as memórias preenchem o meu peito, de uma vez, como um soco naquele ponto que você sabe que eu tenho cócegas. E então, eu penso que, mesmo com tudo, a pior coisa que poderia ter acontecido, pode ser a melhor coisa de todas.

Quero querer em dobro, mas só se você quiser também
Autorais, Livros

Quero querer em dobro, mas só se você quiser também

Se eu te disser sorrindo de orelha a orelha que acordei um pouco triste, você vai acreditar? Sabe, eu mascaro muito bem os meus sentimentos. Menos aqueles que são seus. Esses eu acho que demonstro demais. Eu quero demonstrar muito. Quero demonstrar em dobro, quero querer em dobro, mas só se você quiser também, afinal, não há como eu querer por você.

Talvez você fuja de mim. Bem feito. Queria que não, mas se fosse eu, talvez eu fugisse também. Mas eu sempre fico. Talvez no vácuo ou sem, com apenas esses ecos dos meus pensamentos gritando seu nome repetidas vezes. É que nada disso faz sentido, sabe, mas me faz sentir.

+ Eternamente responsável por aquilo que cativo?
+ São quatro da manhã no meio da noite

Entre tantos devaneios e lágrimas, me descobri tão desastrado. Entre o país das maravilhas e a terra do nunca, acabei por tropeçar e deixar cair sobre você todo o amor que eu tinha a oferecer. Eu quero que seja assim. No planeta do Pequeno Príncipe, com lágrimas nos olhos eu disse que te amo. E foi significativo, foi em voz alta.

Dizia em um livro que amo, Coração de Tinta, que tudo ganha vivacidade ao ser falado em voz alta. Eu te disse as três palavras repetidas vezes, em voz alta. Eu sou caos. Nada de bom poderia vir de mim, não é isso que você diz?

Leia ouvindo: Sad beautiful tragic, Taylor Swift

Caos total. Eu sei, nem eu mesmo me encontro, sabe. Mas no meio dessa bagunça toda eu ainda conseguia encontrar o meu amor por você. Que saco. Era como ver o céu escuro e estrelado e encontrar a Lua. É certo, é imediato. É brilhante como nada mais, ilumina a escuridão, leva luz para todas as extremidades e me ilumina em sorrisos.

Mas não, para você, eu sou um caos. Sou indigno de te dar amor e você é bom demais para receber o meu amor. A gente dá aquilo que tem e eu sei, dei amor demais e você se sentiu sufocado, sem ar. Foram longos anos de martírio e de terapia para mim. Você dizia que eu era emocionado.

Se não for pra ser emocionado, não quero nem ser. Eu sei querer em dobro, em triplo, em quádruplo… Eu sei querer mais que você, sei querer por você. Mas só vou querer se você quiser também.

E infelizmente você não quer, então, faça o favor e vá para o inferno.

O Pequeno Príncipe: Eternamente responsável por aquilo que cativo?
Autorais, Livros

Eternamente responsável por aquilo que cativo?

“Vamos ver ‘O pequeno príncipe’ hoje de noite?”, propus a ele. Eu estava responsável por alguns convites por conta do meu blog. Fomos. Pegamos as habituais poltronas no fundo da sala. Sempre que íamos ao cinema, não víamos o filme por conta dos beijos que não se acabavam – não reclamando, óbvio. É maravilhoso. Sempre é com ele. Incrível se torna pouco para descrever tanto.

Nós sentamos e o filme começou. Eu sempre amei o pequeno príncipe. Foi um livro que meu avô comprou, deu ao meu pai e ele me deu. Na sexta série, escrevi uma resenha sobre ele com uma reflexão que emocionou a professora. Mas isso era coisa de conexão. Nós nos conectamos com certas palavras. E eu me conectava com esse livro, então, fiquei bem animado para o filme, apesar de ser uma espécie de releitura.

+ Resenha: O Pequeno Príncipe
+ Vlog: O Pequeno Príncipe

Sentei-me abraçado a ele. Seu colo era tão confortável, seu abraço era capaz de me fazer esquecer qualquer outra coisa. Seu cheiro era único, do tipo que te deixa alerta. Eu estava calmo, mas meu coração dava cambalhotas e era o grande responsável pelas borboletas no meu estômago. Ele era analgésico. Diziam que nossos signos jamais combinariam, mas quando queremos, fazemos. Quando queremos, noite vira dia, vazio vira cheio e o quebra-cabeças se encaixa.

“Eu gosto muito de você, sabe?”, ele disse e meu coração tremeu em felicidade crescente. “Muito.”

“Eu também”, respondi, tímido. As palavras travavam um pouco ao saírem assim, em voz alta. Era medo da decepção.

“Queria te dizer uma coisa…”, ele começou e eu só assenti. Porra, eu também quero te dizer uma coisa. Eu quero. Eu sabia o que ele ia dizer a seguir. Tinham algumas lágrimas no seu olho e essa era a cena mais linda que tinha a honra de estar acontecendo comigo. Nunca nada tinha passado perto do que eu estava sentindo ali, naquela sala escura que parecia iluminada pelos seus olhos. Cada centímetro meu sorria, cada célula do meu corpo dançava Macarena em velocidade máxima. Na tela grande, a raposa dizia Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas… Se me cativas, teremos necessidade um do outro. Serás para mim, único no mundo. E eu serei para ti, única no mundo…”

Tudo sorria em mim, tudo explodia como jamais antes. Minha mão estava em seu rosto e meus olhos estavam nos seus quando finalmente ouvi. “Eu te amo.”

E eu não soube explicar como milagrosamente sorri mais. Como minha felicidade transbordou e me paralisou, tirando minha voz e minha capacidade de pensamento. Eu só conseguia olhar para ele, me perder em suas entrelinhas. “Eu também te amo… Muito”, falei por fim, um pouco paralisado por ser a primeira vez responsável em voz alta com alguém ouvindo.

Era tão sincero que eu sentia meu coração bater em cada centímetro da minha pele. Mas era como deveria ser. Eu o amava, estava convicto de tudo. Convicto de que estava perdida e irremediavelmente apaixonado. E sabe, além de tudo. Contra a razão. Contra a promessa de jamais permitir. Contra a paz. Contra a esperança. Contra a tristeza. Mas, acima de tudo, eu o amava contra todo o desencorajamento que poderia existir. E foi ali, com meu filme preferido de plano de fundo numa quarta-feira fria de agosto, quase dez da noite que eu ouvi e admiti uma das melhores coisas da minha vida.

Sempre escrevi romances sem jamais ter chegado perto de viver um. Sem jamais ter entendido o infinito dentro de mim. Porque sim, posso dizer com propriedade agora: amor não machuca, conserta a alma. Não tira os pés, dá pezinho. Te eleva nas nuvens, como uma âncora de garantia. Não dói, sorri, dança…

Dizem que cicatrizes vem de machucados e naquela noite fui marcado de um jeito eterno e inexplicável em palavras. Só feche os olhos e imagine a sensação de se explodir em um infinito de galáxias brilhantes… Talvez chegue perto. Pouco, mas chega.

Isso te faz sorrir todos os dias e te dá novos motivos para acordar todos os dias. Te deixa mais que completo e, ao chegar em casa com o cheiro dele cravado em mim, sinto o melhor tipo de saudade. Aquela que só passa quando engulo a sua presença. E eu, fico sem palavras.

É algo novo pra mim que sou exagerado e vivo falando bosta por aí. Aconteceu sem enredo, sem ensaio ou histórias pré-escritas por romancistas fãs de finais felizes. E sabe, talvez isso já estivesse destinado a acontecer, porque voltando, vejo que O Pequeno Príncipe me define no momento mais que qualquer outra coisa.

“Se tu vens, por exemplo, às quatro da tarde, desde as três eu começarei a ser feliz.” Impossível me definir mais. Ou “Se tu vais, por exemplo, às onze da noite, desde as nove eu começarei a sentir a sua falta e te querer ver de novo.”

Lembra quando eu disse que existia alguém responsável por te abraçar tão forte que juntaria todas as suas partes?

Então, meu dia finalmente chegou.