Tarô, revele meus segredos mas não conte se houver coisas ruins
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Tarô, revele meus segredos mas não conte se houver coisas ruins

Entrei no supermercado com Mary e fiquei no canto com ela e o carrinho enquanto sua mãe ia atrás das melhores frutas para a sobremesa do almoço. Lembrei que meu tarô tinha ficado em casa, droga.

— Socorro, Mary, dei um match no tinder! — Falei, querendo contar para alguém que era Hugo. Mas ela nem sabia da existência dele. Ou sequer lembraria, já fazia muito tempo.


Leia ouvindo: Heaven, Julia Michaels

— Como assim Tinder, menino? Você não namora?

— Não mais. — Sorri de lado. — Como eu mando oi no Tinder? Será que “Hey” é uma boa?

— Meu Deus. Você está impossível. Saiu quinta e sexta, né? — Ela estava me julgando.

+ Sou apaixonados pelo final
+ Coisas pequenas (e ir na balada) ferem mais

— Não me julgue, bitch.

— Tá. Mas “hey” é ridículo. — Ela disse, e saiu para ir encontro com a mãe dela. — Fica de olho no meu carrinho.

Abri a janela do Hugo e mandei hey. Desliguei meu 3G e guardei no celular. Não queria ver o momento exato em que ele me responderia ou desse unmatch, depois que se lembrasse de tudo que fiz no passado.

E nada de Lucca aparecer. Honestamente, ele estava sendo a mentira mais bem contada que eu vivi e acreditei por dois longos anos. Não temos reciprocidade. E sem reciprocidade não é amor, é insistência. E qualquer número multiplicado por zero, continua sendo zero.

— Vamos, migo? Minha mãe já pegou tudo. — Mary quebrou meu diálogo interno e fomos encontrar Rose no centro da cidade. Ela estava surtada por esperar meia hora na chuva, com razão.

— Eu vou dar na cara de vocês dois, ridículos. — Rose era muito amorosa.

— Vamos comer? — Eu não tinha comido nada desde ontem.

— Vamos, mas você vai contar todos os detalhes do seu término na mesa.

Topei e fomos para o shopping. Pedi meu Subway vegetariano e assim que elas voltaram, me olharam com cara de quem diz “vai, desembucha”.

— Ah, não estávamos bem há algum tempo. Muitas promessas não cumpridas e logo na segunda semana do ano, brigamos. Agora ele sumiu, não fala comigo há mais de uma semana…

— Sumiu? Caralho, que embuste. — Rose era bem parecida com Ann nesse quesito, desbocada.

— Sim. E eu baixei o Tinder. Estou tentando não ligar muito para isso, já que 2018 é o ano do karma, regido por Júpiter, tudo o que a gente plantou, vamos colher. — Continuei. — O tarô também disse que tínhamos que dar um tempo…

— É verdade. Tem muita gente reatando. — Mary completou.

— Caralho, lê meu tarô? Não estou bem com o corno do meu namorado também… – Rose era do Rio, por isso ainda falava palavrão como se fosse bom dia.

— O que houve? E como assim ele é corno, Rose? — Mary e eu rimos, Rose só ficava mais indignada.

— Ai, longa história. Depois conto para vocês. Vai rolar o tarô?

— Posso fazer, mas estou sem meu baralho. Tem algum lugar aqui perto que vende? Preciso comprar um novo. — Por favor, que sim. Eu quero muito um baralho novo.

— Tem. Vamos comer, passamos lá e ficamos em casa de tarde, pode ser?

— Fechado, Mary. — Respondemos juntos.

Depois que comemos, paramos em uma lojinha super pequena que vende velas e imagens de vários tipos de santo. De várias religiões diferentes.

— Boa tarde, você tem baralho de tarô? — Perguntei.

— Tenho baralho cigano, tarô de marselha e esse simples aqui. — A moça, com uma energia ótima, me respondeu. Eu sabia sentir a energia das pessoas, e isso é algo que eu digo ter herdado da Sasha, minha cachorrinha. Foi por ela que virei vegetariano. Sabe que, a primeira vez que Lucca foi em casa, ela sentiu uma energia estranha vindo dele? Achei que era pela altura. Lucca era bem alto.

Você acredita em energias? Há quem diga que somos seres humanos e por isso não emanamos nenhum tipo de força. Maior besteira que alguém pode dizer. Energia é física. Movimento produz energia. Um carro andando, uma cachoeira… Tudo gera energia, e ela é a moeda de troca no universo em que vivemos. Se você faz o bem, você recebe o bem. Se faz o mal, recebe o mal. Se te derem o mal, dê a eles o perdão. Você também vai receber quando precisar.

Tive um tio-avô super homofóbico, que zoava todo mundo, inclusive meu avô, que tinha menos dinheiro que ele. Ele era uma pessoa nojenta energicamente. Existem pessoas com energias boas, ruins e energias nojentas. Sabe quando você conversa com alguém e sente vontade de vomitar? Então, é isso. Ele pegou câncer uma vez, e virou a melhor pessoa do mundo. Se curou. Achou que o rei morava em sua barriga de novo, e voltou ao mundo de maldades.

Agora, o câncer voltou. Ele não tem mais sistema digestório e está vivendo entubado dentro de um hospital, quase morto de remorso. Fui vê-lo, apesar de eu ser a bichinha da família. Dei o perdão quando ele me deu o inferno, e é assim que devemos ser.

— Quero o simples. Vou passar no cartão de crédito. — Respondi.

— Certo. — A moça cortou um pedaço de papel e embrulhou a caixinha do baralho com todo o cuidado do mundo. Entreguei meu cartão de crédito.

Recusado.

— Ué, acho que deixei bloqueado no aplicativo. Deixa eu ver aqui, moça… — Peguei meu celular. “Nova mensagem de Hugo em Tinder”. Tremi.

— Cobra aqui no dinheiro mesmo, moça. — Ela cobrou e saímos. Guardei meu celular, ansioso para ler a mensagem de Hugo.

— O crush respondeu, socorro. — Disse, mas as meninas nem ligaram.

Chegamos na casa da Mary e a primeira coisa que fiz foi abrir o Tinder.

“Hey”

“Tudo bem?”

Hugo havia me mandado duas mensagens.

“Tudo e você?”

“Quanto tempo. :(”

Desliguei o celular mais uma vez.

— Vamos consultar o tarô?

— Vamos, mas se sair coisa ruim não me fala, tá? Não vai mudar nada. — Rose estava com medo.

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