Sou apaixonado pelo final
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Sou apaixonado pelo final

Cá estou eu de novo, começando mais uma narrativa, mais uma história na biblioteca da minha vida. Só que pelo final. Sempre começo pelo fim, não sei qual é o meu problema com os inícios. Hoje é quinta-feira, o ano acabou de começar, e eu já cheguei ao final do meu namoro. Na verdade, ele terminou comigo. Ou não. Não sei bem.


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É fato que já estávamos brigando todos os dias no último ano. Mas eu, bem trouxa, sempre perdoei todas as vezes em que ele sumiu nos finais de semana, me deixou falando sozinho, me cortou no banco de trás do carro dos meus amigos quando eu estava falando algo muito importante para mim. O fato é que eu nunca poderia estar em uma posição melhor. Talvez seja normal que casais gays vivam em uma eterna competição. Mas eu sempre achei melhor correr nela a favor dele do que contra. Mas ele nunca pensou da mesma forma.

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Hoje é quinta e desde sábado, ele não fala nada comigo. Não mandou uma mensagem, uma direct no Instagram e nem uma ligação. E ele teve motivos para falar comigo: meu avô está em estado grave na UTI, e ele é tudo para mim. Lucca sempre soube que eu era instável quando se tratava do meu vô Antônio. Eu também descobri que vou ter que operar o nariz. Meu nariz que já serviu de cópia para pelo menos três plásticas, não funciona. E nada me amedronta mais que operar o nariz. Ah, também surgiu uma manchinha perto do meu olho que o Google diz ser câncer de pele. Ele poderia ter sumido em todas as semanas, menos essa. Eu realmente precisava de algum apoio.

— Pi, vamos na balada hoje? Estou sozinha. — Era minha amiga Anna, anos mais velha e mais sábia, que esteve comigo nesses últimos dias. É incrível como a amizade perfeita aparece nos momentos mais improváveis. Conheci Anna em um emprego que ela odiava e eu também. Nunca seríamos amigos, éramos muito diferentes. Mas o destino cruzou nosso caminho. É como dizem, a perfeição jaz na exceção.

— Vamos, Ann. O Lucca não falou comigo até agora mesmo. — Bufei, desanimado.

— Existem níveis e níveis de cuzãozisse, Pietro. Você está solteiro. Não tem como você esperar que ele volte, talvez ele nem volte. — Ela fez uma pausa — Me desculpa. Mas sua vida não pode parar pelas pessoas. Você está solteiro agora, aproveite isso. Passo aí em 15 minutos.

— Estarei pronto. Vamos naquela balada de hétero? — Sorri, já me animando um pouco mais.

— Bff, é o que tem pra hoje, né viado?

Anna é uma pessoa incrível, e poucas pessoas conseguem ver isso nela. Ela é peculiar, mas do jeito que fala na lata. Não economiza nenhuma palavra, e também não mede esforços pelos seus amigos. Sua vida há teve muitos altos e baixos, e muitas das preocupações que tenho, ela não tem mais. Por isso levo os conselhos dela tão a risca.

Coloquei uma calça jeans, uma camiseta neutra e uma camisa xadrez por cima. Ann chegou em ponto, e assim que entrei no carro, ela colocou um sertanejo bem alto para tocar.

— Que porra é essa, Anna? — Ela não gostava, assim como eu.

— Já que vamos para o habitát dos héteros, temos que nos acostumar. — E fomos. Não foi estranho estar sem meu namorado hoje, porque já vim nesse lugar várias vezes sozinho. Me permiti dançar e beber duas latinhas de Skol Beats.

O Trup, bar e casa noturna dos héteros não dava para suportar por muito tempo.

— Pietro, vamos embora? Cansei. — Anna se apoiou no meu ombro.

— A gente chegou tem 47 minutos. Vamos. — Ri.

Fomos embora depois de pouco tempo mesmo, porque simplesmente não dá. E ainda era dia de semana. Também era inevitável parar de olhar para o celular e esquecer Lucca.

— Acho que chegamos ao final, Anna. — Quebrei o silêncio no caminho de volta. Ela abaixou o som.

— Você acha, Pietro? Ele não te mandou uma mensagem sequer, e todo mundo do grupo ficou apavorado quando você deu a notícia da cirurgia. — O grupo era nossa conversa no WhatsApp com os amigos da vida. Um da balada, outro do trabalho, um amigo de outra amiga… — Vamos na Clock Out amanhã? Podemos comer e ir.

— Fechado. Mas só se ficarmos mais de 40 minutos dançando.

— É a noite do funk, bebê. Vamos nos falando. Beijo! — Desci do carro e entrei no meu prédio, ainda sem acreditar que depois de anos, eu ainda conseguia sair no meio da semana. Eu não estava morto não.

Antes de adormecer, baixei o Happn. Se eu estava solteiro, precisava conhecer pessoas novas. Não para beijar ou namorar. Eu precisava mesmo conversar com pessoas novas. Sabe aquelas conversas fúteis que começam com um oi e você chega ao final contando sua história de vida? Então. Deixei ligado e dormi, sem pensar em nada.

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2 comentários

  • Responder Raissa 14/03/22 em 21:09

    Só eu que fiquei curiosa pra saber se o que aconteceu no próximo rolê ? Kkkkk

  • Responder Denise 24/01/22 em 20:41

    Quando a gente descobre que é incrível, e consegue se libertar dos embustes da vida é libertador.

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