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Será que algo disso foi real?
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Será que algo disso foi real?

Frequentemente eu me questiono se alguma coisa entre nós dois foi real em algum dia, em alguma hora ou em algum milésimo de segundo que seja. Parece que escrevo um romance do tipo “será que você algum dia me amou de verdade?” mas a realidade é que questiono tudo: a parte boa e as partes ruins. Sério? Eu não consigo acreditar que isso pode ter sido real agora, com 25. Mas, quando vejo meus olhos com 17, vejo tanto brilho. Eu acreditava naquela época. Como você teve coragem? Como as coisas mudaram tanto? Como a gente mudou tanto?

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Eu chamava isso de amor, mas você nunca deu nome aos bois. Cara, como eu era ingênuo. Que ódio. Como eu te aguentava? Como eu suportava cada vez que você ignorava minhas playlists mas ouvia a do menino ao lado? Como eu conseguia relevar todas as vezes que você soltava minha mão para segurar a dele? É, eu era um babaca abusivo ciumento. Você me guardava como se eu fosse um segredo, o maior segredo da sua vida, enquanto eu… ah, eu te guardava como se fosse uma pérola. E seu egozinho inflado amava, né? Saco.

+ São quatro da manhã no meio da noite

Eu sinto raiva agora enquanto questiono se alguma coisa entre nós foi real, mas eu sei perdoar e entender a pessoa que fui. Mas você sempre foi casualmente cruel em nome da honestidade. A verdade é que sua honestidade era a crueldade. E eu? Eu era seu segredinho perverso que só servia como a porra de um pedaço de carne que você até gosta do sabor, mas que não vale a pena oferecer para a visita. Para as visitas, a gente compra algo melhor. Para a família então… Melhor comer fora, né?

Eu lembro de tudo, mas questiono minha memória. Será que isso foi real? Será que todas as vezes que você olhou nos meus olhos e disse que eu era a melhor coisa que tinha acontecido na sua vida algo passava perto da verdade? Será que todas as vezes que você olhou ao seu redor e viu que eu não estava ali, você sentiu minha falta? Ou será que você só sentiu falta da constante aprovação que eu te dava? Porque convenhamos, a gente sabe que eu não tinha a autoestima das melhores, nem você, mas eu te dava o que restava da minha. E você sugava até o último talo. Até a última mísera gota da minha alma.

É, eu sou legalmente obrigado a fazer terapia porque sou terapeuta mas, quando me perguntam o que me levou pra lá, eu poderia dizer que é você. Isso até inflaria seu ego. Mas a real é que o que me levou até aquela porta branca do consultório seis foram os machucados que você deixou para trás quando você explodia. Você foi uma bomba atômica e eu o território que te recebeu.

E ainda questiono? Será que tudo isso foi real? Será que você foi tão ruim assim? Será que não é minha mente abusando? Será? A gente sempre tende a diminuir nossas experiências depois que elas passam, né? Será que você me deixou mesmo com vontade de chorar no momento mais importante da minha vida? Não, acho que eu era muito emotivo e imaturo emocionalmente. Será que você se sentiu mal por mim quando eu fui promovido para o cargo que eu mais queria no mundo mesmo? Não, era só um dia ruim, né?

Será que todas as vezes que você não quis trabalhar, você estava realmente indisposto? Ou será que você só queria boicotar a minha felicidade da mesma forma que você acha que boicotei a sua quando você não foi embora para a faculdade que queria? Eu sei que você diz que nunca foi por mim, mas a verdade é que você não foi por você. Assuma os riscos das suas escolhas e consequências.

Mas, será que tudo isso foi real mesmo? Todas as vezes que você pegou minha mão em público e disse que éramos nós dois contra o mundo e que você era minha família? Será que foi real mesmo quando você simplesmente cuspiu na minha cara? Será que foi real mesmo quando sua família me ameaçou e você não fez porra nenhuma?

Afinal, a culpa sempre foi minha, né? Eu era livre demais. Eu usava piercing e nunca iam aprovar meu piercing. Chega a ser patético, né? Considerando que o problema “nunca foi” sua sexualidade. Será que foi verdade mesmo quando você me levou pra outra cidade pra boicotar a porra da única festa de aniversário que tive com amigos na minha vida? Não, acho que eu quis ir junto.

Eu sei que você guardou aqueles meus dois casacos. Eu sei que eles ainda cheiravam a mim e te lembravam de inocência, dos meus olhos grandes e brilhosos. Eu sei que você tenta desesperadamente caber dentro deles. Será que isso também foi real?

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Eu queria te pedir desculpas

Oi, eu do passado. Eu queria te pedir desculpas. Você tinha só 16 nessa foto e a gente se sentia horrível. A gente se sentia feio, indigno de ser amado, sem o direito de desejar e ser desejado. Tinha que aceitar o que vinha, de bom grado.

+ Resenha: O lado feio do amor, Colleen Hoover

Eu queria te pedir desculpas por não entender que você podia escolher. Você podia ter sido mais gentil consigo mesmo. Se te consola, aqui nos 25 – quase 26 – a gente tá aprendendo a colocar limites. Algumas vezes, a gente estrapola. A gente grita, perde o eixo, mas estamos tentando…

Eu queria te pedir desculpas também por achar que isso é culpa sua. Não é. Hoje, a gente entende tudo o que aconteceu, a gente tenta se entender e evoluir. A gente tá na análise há 2 anos e somos psicanalistas. Quem diria, né? Ah, a gente também se formou em Jornalismo conforme era o plano.

Eu queria te pedir desculpas por não deixar que você acreditasse no amor. Queria te punir, não sabemos ainda o motivo. Ainda temos alguns sintomas que não entendemos mas, aqui nos 25, você encontrou o amor. Não foi tranquilo logo de cara, não foi um conto de fadas mas foi real. Ainda é. Você conseguiu sua casa do jeito que você queria também.

Você aprendeu a ler tarô, publicou três livros, muitas coisas mudaram mas ainda escrevemos esse texto pelos mesmos meios. O Beco Literário continua e continuará aqui pela gente. Pra nos ouvir e nos ver crescer. Ah, você também abriu uma empresa e vive dela. Seu namorado é seu sócio. Você pode se dar ao luxo de acordar a hora que quiser, apesar de constantemente querer acordar mais cedo. E é mais estressante que você pensava.

Eu queria te pedir desculpas por não deixar você ser você logo de cara. Por demorar. Queria te pedir desculpas por tantos descaminhos dos 16 aos quase-26, mas acho que estamos no caminho certo de nos encontrarmos de novo.

Eu queria te pedir desculpas mas, apesar dos pesares, você se sentiria orgulhoso da gente e não acreditaria se eu contasse.

Peguei a ansiedade e transformei
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Peguei a ansiedade e transformei

Querido diário, hoje eu peguei minha ansiedade e transformei em cake pop. Sim, aqueles bolinhos no palito. Dizem que nosso ego é nosso inimigo, mas, na maioria das vezes, ele só quer nos proteger e tem mecanismos fortes para isso. Um deles é a sublimação, quando a gente transforma um sentimento “ruim” em algo melhor. Minha ansiedade é generalizada. Não tem como eu dar voz a ela porque sei que ela é infundada e não vai me levar a lugar nenhum. Não é uma fuga.

+ Transformei o cabresto em liberdade

Hoje, peguei ela e transformei em arte culinária, realizei um dos meus maiores desejos. Hoje estou vendo um filme repetido que está passando na TV, mas é um dos meus preferidos. Estou ansioso por amanhã também, tenho reunião no trabalho. Que eles venham dispostos a serem legais, ou nem venham.

Hoje, o Pirata esteve o dia todo comigo. Hoje, chegaram as cadeiras da minha mesa e ficaram lindas. De manhã, comprei uma samambaia para decorar a sala. É bom demais ter a nossa casa, sabe? Estou feliz e só quero que essa ansiedade pela reunião de amanhã passe logo.

Hoje, fiquei emocionado porque ganhei um presente da minha dentista. Ela soube exatamente a escova que era melhor pro meu dente e comprou pra mim. Ela lembrou, sabe? Isso fez meu dia e deu uma acalmada na ansiedade que eu estava sentindo. Fui na academia, fiquei mais tranquilo. Conforme as palavras saem aqui, esse sentimento vai embora junto e dá espaço para um sentimento melhor, de paz, calma e alegria. Quase pós-terapia.

Não consegui fazer tudo o que precisava hoje, mas paciência. Amanhã tento de novo. Vou voltar a assistir meu filme e acho que vou ler um pouquinho antes de dormir. Talvez eu grave alguns vídeos, talvez não. Preciso escrever no Beco.

Até amanhã, diário.

Por que a gente é tão incerto?
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Por que a gente é tão incerto?

Querido diário, às vezes sinto que sou incerto e que minha vida é cíclica. Que a minha ansiedade vem junto com o surto, tudo ao mesmo tempo e que não sei o que fazer. Minha analista vive me dizendo que preciso sair de cena quando isso acontece, que posso só esperar passar. Como esperar passar nessa onda de produtividade que tenho dentro de mim? Preciso produzir, mesmo sendo tão incerto.

+ Resistência e transferência

Quando decido alguma coisa, no dia seguinte faço tudo cair por terra. Eu derrubo os castelos de areia que eu mesmo construí, diário. Como que pode isso? Por que a gente é tão incerto assim, hein? Porque eu não consigo simplesmente decidir. Dizem que sou multidisciplinar e meu talento está na conexão. Mas nunca dizem o fardo enorme e incerto que é ser bom em várias coisas ao mesmo tempo.

Você pode achar que estou me vangloriando, diário. Mas não. Realmente não é legal sentir muito quando muitos sentem pouco. Realmente não é legal saber de todas as coisas ao mesmo tempo. Eu queria ser bom em uma coisa só e fim. Eu não precisava ter esse poder de escolha tão incerto. E olha que eu nem sou geminiano, hein?

Não sei com que intuito te escrevo isso hoje. Não sei onde quero chegar, não sei onde vou chegar, nem sei se quero chegar em algum lugar ou só quero ficar aqui, vegetando, fingindo que nada acontece. Minha analista defende essa versão, mas ela me incomoda tanto. O ócio me incomoda demais.

Hoje resolvi mudar meus ares. Vim trabalhar na mesa da sala, estou assistindo ao meu filme preferido, desmarquei minhas reuniões e desmarquei até a minha analista. Hoje cansei de mim. Não quero. Estou incerto demais. Quero ficar em paz dos meus próprios pensamentos. Hoje não, Gabriel.

Talvez amanhã.

Ingratidão que corrói
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Ingratidão que corrói

Eu sempre te ajudei. Me lembro como se fosse hoje quando você me chamou no chat e perguntou se podíamos marcar um encontro. Topei, fizemos coisas lindas juntos. Fomos ao infinito e além em direção daquilo que a gente sempre sonhava. Até que chegou o dia que chamo de dia da ingratidão. Até hoje não entendi o que aconteceu, nem o porquê, se quer saber a verdade.

+ Quero abraçar o mundo todo, todo o tempo

Eu confiava minha vida em você e você veio, em tom seco e ríspido, cortando meu barato dizendo que eu tinha te decepcionado. Parecia uma projeção. Era de mim mesmo que você estava falando? Hoje, sei que não. Você não se referia a mim. Você estava com seus próprios problemas, mas, chegou com a faca afiada e enfiou dentro do meu peito. Sangrei por dias e noites, sem entender a sua ingratidão. Você não me deu a chance de entender.

Leia ouvindo: You need to calm down, Taylor Swift

Eu recebi a facada com a faca que eu te ajudei a construir e depois, de tão bom grado, te ajudei a afiar. Como se eu fosse uma pessoa qualquer que sequer sabia como afiar ou fazer uma faca, sendo que, eu que tinha aberto as portas para você passar. Como você pôde? “Eu não confio mais em você”, falou de forma ríspida, como se fizesse terapia à fio por anos, como se fosse analisado e estivesse colocando limite em alguém que fora abusivo.

Depois disso, sem falar comigo, você usou as facas que aprendera a construir na minha oficina e jogou fora aquelas primeiras que fizemos juntos, mal feitas, quanto estávamos nos aperfeiçoando. Ingrato. Sim, você fingiu que era um ferreiro profissional e que tinha aprendido tudo sozinho, há anos, quando na verdade tinha me esfaqueado com a minha própria faca. Que fiz com minhas próprias mãos.

Hoje, você sequer tem uma faca para afiar. Você veio e me pediu uma emprestada. Eu até emprestaria, mas sei que não preciso e não quero fazer isso porque, meu anjo, eu nunca precisei esfaquear ninguém para ser um ferreiro de primeira. Posso ter tido recaídas, mas ainda estou aqui e, nessa oficina, você não pisa nunca mais.

É, anjinho. Nunca precisei esfaquear ninguém, mas também não sou um santo, não. Além de facas, sei afiar um bom tridente para te empurrar nos mármores mais quentes do inferno. Você e sua ingratidão.

Lembra que é valente como as águas do mar
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Lembra que é valente como as águas do mar

Algumas semanas aparecem pra gente lembrar o quão valente a gente é. E com grandes responsabilidades e realizações, vem grandes dores e sofrimentos também. Nada é tão quentinho fora da nossa zona de conforto. Essa foi uma semana daquelas e eu me peguei dando voltas pra responder “por quê?”.

+ Meus quase 20 anos

Será que tudo isso vale a pena mesmo? Será que mereço tudo isso? Será que não posso só deitar na cama, chorar, desistir e esperar que as coisas aconteçam? Assim, pelo menos eu vou ter o controle, nem que seja na sabotagem. Quando eu me saboto, eu não realizo o que eu quero, mas pelo menos escolho meu destino. Quando vivo, levanto da cama e dou às caras, eu não tenho controle do que vai acontecer. E se eu não for tão valente assim?

Leia ouvindo: Valente, Mc Tha
Eu sei que sou. Eu sei que consigo. Mas preciso? Será que quero? Será que é autossabotagem ou será que é só falta de vontade? Ou será que excedi no ponto? Quantas perguntas sem respostas girando nessa mente ansiosa que voz fala. Eu sei que a gente tem que sentir tudo: alegria, tristeza, tudo é importante. Mas pra quê? Vale a pena mesmo?

Esse é o preço de ser humano, eles dizem. Que preço caro a se pagar só porque nos anos 90 duas pessoas resolveram se entender no Carnaval e que ocasionou meu nascimento. Eu pedi pra nascer? Meu Deus, agora tô sendo ingrato? Será que tô sendo ingrato com tudo o que eu conquistei?

Será que vou perder tudo isso se eu questionar? É, eu não sou tão valente assim. Eu não sei se consigo ser tão valente assim, eu não sei se consigo sorrir agora que vejo que tudo deu certo. Não foi fácil. Quem disse que seria fácil?

Tem que ser Valente, Thaís. Vai. 

Escritor depois dos 50: os desafios e a importância de tomar uma decisão
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Escritor depois dos 50: os desafios e a importância de tomar uma decisão

Tornar-se um escritor é um processo que une talento, disciplina, determinação e, claro, a tomada de uma decisão. Além da facilidade que algumas pessoas apresentam desde tenra idade com a palavra escrita, escrever é uma descoberta que pode surgir em qualquer momento da vida, inclusive depois dos 50.

É o caso do escritor, palestrante, especialista em negócios e tomada de decisão Uranio Bonoldi, que atua dando suporte a empresas que desejam crescer de forma estruturada e que, hoje, também é um escritor de best-seller.

+ Decisão fácil e difícil: Como escolher qual caminho seguir?

Foi a partir da sua longa experiência executiva em cargos de alta gestão que ele observou a dificuldade das pessoas em tomar decisões, não só nos negócios, mas também na vida pessoal. Tal constatação o levou a integrar sua experiência profissional, suas reflexões pessoais e seus estudos, gerando a ideia para o seu primeiro livro.

“Escolhi trilhar pelo caminho de escrever para o público mais jovem, que representa o futuro do país e é onde estarão os futuros gestores de empresas e de projetos, seja em qual for o campo. E como despertar o interesse dos jovens sobre o tema? Decidi escrever uma história — uma ficção do gênero thriller, que o público jovem adora. Assim nasceu a série A Contrapartida!”, diz.

O livro, que é considerado um dos principais thrillers nacionais dos últimos anos, desde seu lançamento, alcançou o ranking dos mais vendidos na Amazon. A Contrapartida conta a história do menino Tavinho, um jovem que para não frustrar a mãe e honrar a memória do pai, vítima da violência da cidade de São Paulo, opta por cortar caminhos durante sua adolescência. Com a ajuda de sua governanta, Iaúna, nascida em uma tribo indígena já extinta, ele aceita tomar o elixir da sabedoria. No entanto, a decisão para se tornar mais astuto tem um alto preço: o assassinato de pessoas em série.

Uranio conta que a decisão de escrever um livro foi fácil, porém ele precisou superar todas as outras decisões que vieram a partir dela, sem recuar e mantendo a disciplina na implantação daquilo que precisa ser feito. “É claro que tive diversos desafios pelo caminho, principalmente com diversas jornadas duplas de trabalho. Precisei decidir e conhecer o mundo literário, – traçando estratégias, busquei experts, mentores e fui superando cada obstáculo sem desistir. Sete editoras me disseram ‘não’. Depois que encontrei o meu ‘sim’, passei por outras decisões que foram tomadas: capa, prefácio, subtítulo, contracapa, revisões, – foram muitas, e todo o processo que envolve a publicação de um livro”, conta Bonoldi.

A jornada literária não parou por aí: após dois anos desde o lançamento do seu primeiro livro, Uranio acaba de lançar A Contrapartida II – O contra-ataque, onde o leitor seguirá envolvido por um clima de suspense e mistério, mas também vai conseguir preencher inúmeras lacunas propositalmente deixadas em aberto no primeiro livro.

Uranio completa dizendo que a grande decisão da sua vida, até este momento, foi trilhar a jornada como escritor literário. “Em poucas palavras, a ideia da escrita surgiu ao perceber, como especialista em Gestão, quanto tempo as empresas e pessoas perdem e se angustiam em não decidindo ou buscando escolhas em campos que não dizem respeito a seus valores, sua missão e sua visão e, no caso de pessoas, a sua essência”.

A gente enfrenta nossos gatilhos pelo amor
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A gente enfrenta nossos gatilhos pelo amor

Saí da minha analista hoje parecendo que eu posso enfrentar o mundo. Eu até diria que ela me deu uma surra, mas não quero relacionar coisas boas com agressão. Diria então que ela chegou e despejou um caminhão de luz solar sobre mim. “Você tem muitos gatilhos, eu sei. Todos temos. Muitos sintomas. E a gente continua enfrentando todos esses gatilhos e todos esses sintomas na gente porque a gente ama. Pelo amor”, ela disse. Claro que eu rebati. Eu não o amo.

Sim, eu amo. E o amor nos força a olhar para um espelho. Ele nos força a chegar e ver no outro tudo aquilo que temos dentro da gente. Por isso incomoda tanto. Porque a gente não quer que o outro seja assim mas, ao acusar, nós relevamos aquilo que temos de mais importante em nós mesmos. Sim, a gente enfrenta os nossos gatilhos por amor. A gente enfrenta tudo aquilo que incomoda, que tira o sono e nos faz chorar em nome desse sentimento. Amor.

+ Depressão ou só tristeza?

Calma, não estou falando de aguentar tudo em nome do amor. Isso é discurso de abuso. Estou falando de detectar os nossos gatilhos inconscientes, aqueles que nos causam sintomas horríveis e não sabemos o porquê… Nós detectamos sua presença, sabemos que ele está ali, sabemos que ele nunca mais vai embora. E a partir disso, conscientemente, temos que dar um passo pra trás e lidar com ele. Sim, isso é igual não se desesperar com uma criança porque nós somos os adultos da situação. O gatilho é infantil. É você. É sua criança interior.

Quando sua criança interior grita, você pode se sentir impelido a gritar de volta. No calor do momento, sim, você pode até gritar. Mas, se você parar, der dois passos para trás e respirar, você não vai gritar. Você vai se organizar. Você vai escolher. Esses dois minutos entre o estímulo e a resposta é o nosso poder de escolha. Vamos escolher deixar nossa criança agir, com todos seus traumas e gatilhos (dos quais o outro não tem culpa) ou vamos acolher o que a criança sente, editar e mudar a nossa narrativa?

Em terapia, editamos histórias. Pegamos tudo aquilo que aconteceu com a gente e mudamos a forma com a qual reagimos a isso no presente. Temos a tendência a continuar encenando todo o nosso passado, de forma inconsciente, no nosso presente. Quando aprendemos a editar, percebemos o quão excitante é poder ter o poder de escolha. É poder mudar o caminho, é poder dizer “quero fazer diferente agora”, quero ter a chance de escolher como vou reagir.

No fim das contas, quanto mais acolhemos nossa vulnerabilidade e todos os nossos sentimentos, menos medo nós sentimos. Mas mesmo assim, o medo é importante. Ele dispara o gatilho, e quando você sabe lidar com o disparo, você se acolhe, põe as cartas na mesa, sai de cena e escolhe como agir.

Você escolhe agir diferente por aqueles que ama. Aquilo que vemos no outro e nos dá ódio, é aquilo que temos de mais profundo dentro da gente mesmo e não queremos admitir. Por isso, enfrentamos os sintomas dia após dia…

O uso da letra cursiva está com os dias contados?
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O uso da letra cursiva está com os dias contados?

Atualmente, o valor da escrita à mão (letra cursiva) tem sido debatido nos círculos acadêmicos. Mais precisamente neste século 21, a discussão sobre o uso da letra cursiva tem reverberado de forma considerável no cenário educacional mundial.

A escrita é um processo simbólico, uma construção que revolucionou o pensamento e está inserida na formação do ser humano. Escrever é um ato complexo e baseado em inúmeros processos neurológicos.

+ A falsa inclusão social de surdos no Brasil

Ao longo da história da humanidade, a escrita das letras passou por mudanças consideráveis, desde a adoção das letras góticas nos anos 500 d.C. (uso da pena), permeando pela escrita escolar e caligráfica, até chegar à escrita contemporânea (escrita mais livre e com diversidade de materiais, como lápis, canetas esferográficas e papel), sem falar que, por muito tempo, uma boa caligrafia já foi associada a um alto nível de instrução.

No Colégio Presbiteriano Mackenzie, antiga Escola Americana, o uso da caligrafia mackenzista era uma marca registrada dos alunos e professores que passaram pelas suas salas de aula até os anos 90.

Com características peculiares da caligrafia americana — especialmente na grafia das iniciais maiúsculas do alfabeto –, a escrita cursiva mackenzista era facilmente reconhecida em diferentes contextos, atribuindo-lhes a singularidade de uma leve inclinação à direita, destacando a origem da caligrafia amplamente ensinada, com livros de autoria própria, para a execução correta dos movimentos.

Em 2015, países como a Finlândia e alguns estados americanos já se pronunciavam a respeito da possível exclusão desse “conteúdo” devido à expansão das ferramentas digitais presentes dentro das salas de aula, apontando o ensino da “letra de mão” como algo obsoleto para os tempos atuais.

Com a pandemia e a implantação do ensino remoto, o debate veio à tona novamente, reduzindo-se a caligrafia a um ato mecânico, que precisaria ceder espaço para o aprendizado de outras competências, como a navegação por meio de recursos digitais.

Alguns especialistas entendem que o ensinamento da letra cursiva pode ser ineficiente e segregador, e apresentam o fato de que muitas crianças com excelente aproveitamento acadêmico foram rotuladas por não apresentarem uma letra cursiva legível ou “bonita”.

Outros profissionais afirmam que a caligrafia em letra cursiva é uma habilidade não mais essencial, já que, nos dias atuais, com a existência das teclas, a escrita com lápis, caneta e papel tornou-se anacrônica.

Diante das discussões acaloradas sobre o uso da letra cursiva, estudos e especialistas dividem opiniões, mas uma significativa parcela advoga em favor da continuidade do ensino da letra cursiva e do traçado das letras, apontando habilidades e benefícios especiais para as crianças.

Segundo os estudos da professora de Psicologia Educacional, da Universidade de Washington, Virginia Beringer, escrever à mão, formando letras, envolve a mente e isso pode ajudar as crianças a prestarem atenção à linguagem escrita. Ela também argumenta que “a caligrafia e a sequência dos traços envolvem a parte pensante do cérebro”.

Berninger ainda registra que os estudos realizados com a caligrafia têm por objetivo defender a formação de crianças que sejam escritoras híbridas, ou seja, utilizando primeiramente a letra de forma para a leitura, auxiliando o reconhecimento das letras na educação infantil, depois com o uso da letra cursiva para a escrita e composição dos textos e, apenas ao final da séries iniciais do ensino fundamental, a digitação.

Recentemente, um estudo publicado na Revista Nature, em 26 de março deste ano, intitulado “Hight performance brain to text communication via handwriting”, abordou o impacto da caligrafia no cérebro e sua importância cognitiva como uma habilidade a ser desenvolvida ainda nos dias de hoje, mesmo com todo o aparato tecnológico.

A escrita em letra cursiva traz inúmeros benefícios, pois ela permite a continuidade do pensamento por meio do traçado uniforme e ligado, promovendo fluência e imprimindo velocidade ao ato de escrever. Há vantagens no aprendizado ortográfico e na composição das palavras, frases e textos, favorecendo a memorização, a concentração, o foco e auxiliando na produção de textos mais coesos, assim como constitui um componente importante no desenvolvimento de uma escrita pessoal.

Entende-se que, no atual cenário socioeducacional, há a necessidade de se repensar sobre o uso da escrita cursiva no que diz respeito aos extensos exercícios de cópias, sem nenhuma reflexão sobre o que está sendo feito, mas podemos otimizá-lo da melhor forma.

É compreensível o ajuste sobre qual tipo de letra usar para casos específicos, como por exemplo, os alunos com necessidades especiais, para quem a demanda do ensino e uso da letra manuscrita seria fator desagregador no processo de ensino-aprendizagem.

Considerando-se os estudos e pareceres nos círculos acadêmicos, a constatação dos benefícios elencados e as prerrogativas sobre a importância da escrita à mão, compreende-se que a apresentação da letra cursiva e o ensino do traçado das letras à mão devam ser mantidos nas escolas, destacando seu valor cognitivo e educacional na vida acadêmica das crianças.

Tarô, revele meus segredos mas não conte se houver coisas ruins
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Tarô, revele meus segredos mas não conte se houver coisas ruins

Entrei no supermercado com Mary e fiquei no canto com ela e o carrinho enquanto sua mãe ia atrás das melhores frutas para a sobremesa do almoço. Lembrei que meu tarô tinha ficado em casa, droga.

— Socorro, Mary, dei um match no tinder! — Falei, querendo contar para alguém que era Hugo. Mas ela nem sabia da existência dele. Ou sequer lembraria, já fazia muito tempo.


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— Como assim Tinder, menino? Você não namora?

— Não mais. — Sorri de lado. — Como eu mando oi no Tinder? Será que “Hey” é uma boa?

— Meu Deus. Você está impossível. Saiu quinta e sexta, né? — Ela estava me julgando.

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+ Coisas pequenas (e ir na balada) ferem mais

— Não me julgue, bitch.

— Tá. Mas “hey” é ridículo. — Ela disse, e saiu para ir encontro com a mãe dela. — Fica de olho no meu carrinho.

Abri a janela do Hugo e mandei hey. Desliguei meu 3G e guardei no celular. Não queria ver o momento exato em que ele me responderia ou desse unmatch, depois que se lembrasse de tudo que fiz no passado.

E nada de Lucca aparecer. Honestamente, ele estava sendo a mentira mais bem contada que eu vivi e acreditei por dois longos anos. Não temos reciprocidade. E sem reciprocidade não é amor, é insistência. E qualquer número multiplicado por zero, continua sendo zero.

— Vamos, migo? Minha mãe já pegou tudo. — Mary quebrou meu diálogo interno e fomos encontrar Rose no centro da cidade. Ela estava surtada por esperar meia hora na chuva, com razão.

— Eu vou dar na cara de vocês dois, ridículos. — Rose era muito amorosa.

— Vamos comer? — Eu não tinha comido nada desde ontem.

— Vamos, mas você vai contar todos os detalhes do seu término na mesa.

Topei e fomos para o shopping. Pedi meu Subway vegetariano e assim que elas voltaram, me olharam com cara de quem diz “vai, desembucha”.

— Ah, não estávamos bem há algum tempo. Muitas promessas não cumpridas e logo na segunda semana do ano, brigamos. Agora ele sumiu, não fala comigo há mais de uma semana…

— Sumiu? Caralho, que embuste. — Rose era bem parecida com Ann nesse quesito, desbocada.

— Sim. E eu baixei o Tinder. Estou tentando não ligar muito para isso, já que 2018 é o ano do karma, regido por Júpiter, tudo o que a gente plantou, vamos colher. — Continuei. — O tarô também disse que tínhamos que dar um tempo…

— É verdade. Tem muita gente reatando. — Mary completou.

— Caralho, lê meu tarô? Não estou bem com o corno do meu namorado também… – Rose era do Rio, por isso ainda falava palavrão como se fosse bom dia.

— O que houve? E como assim ele é corno, Rose? — Mary e eu rimos, Rose só ficava mais indignada.

— Ai, longa história. Depois conto para vocês. Vai rolar o tarô?

— Posso fazer, mas estou sem meu baralho. Tem algum lugar aqui perto que vende? Preciso comprar um novo. — Por favor, que sim. Eu quero muito um baralho novo.

— Tem. Vamos comer, passamos lá e ficamos em casa de tarde, pode ser?

— Fechado, Mary. — Respondemos juntos.

Depois que comemos, paramos em uma lojinha super pequena que vende velas e imagens de vários tipos de santo. De várias religiões diferentes.

— Boa tarde, você tem baralho de tarô? — Perguntei.

— Tenho baralho cigano, tarô de marselha e esse simples aqui. — A moça, com uma energia ótima, me respondeu. Eu sabia sentir a energia das pessoas, e isso é algo que eu digo ter herdado da Sasha, minha cachorrinha. Foi por ela que virei vegetariano. Sabe que, a primeira vez que Lucca foi em casa, ela sentiu uma energia estranha vindo dele? Achei que era pela altura. Lucca era bem alto.

Você acredita em energias? Há quem diga que somos seres humanos e por isso não emanamos nenhum tipo de força. Maior besteira que alguém pode dizer. Energia é física. Movimento produz energia. Um carro andando, uma cachoeira… Tudo gera energia, e ela é a moeda de troca no universo em que vivemos. Se você faz o bem, você recebe o bem. Se faz o mal, recebe o mal. Se te derem o mal, dê a eles o perdão. Você também vai receber quando precisar.

Tive um tio-avô super homofóbico, que zoava todo mundo, inclusive meu avô, que tinha menos dinheiro que ele. Ele era uma pessoa nojenta energicamente. Existem pessoas com energias boas, ruins e energias nojentas. Sabe quando você conversa com alguém e sente vontade de vomitar? Então, é isso. Ele pegou câncer uma vez, e virou a melhor pessoa do mundo. Se curou. Achou que o rei morava em sua barriga de novo, e voltou ao mundo de maldades.

Agora, o câncer voltou. Ele não tem mais sistema digestório e está vivendo entubado dentro de um hospital, quase morto de remorso. Fui vê-lo, apesar de eu ser a bichinha da família. Dei o perdão quando ele me deu o inferno, e é assim que devemos ser.

— Quero o simples. Vou passar no cartão de crédito. — Respondi.

— Certo. — A moça cortou um pedaço de papel e embrulhou a caixinha do baralho com todo o cuidado do mundo. Entreguei meu cartão de crédito.

Recusado.

— Ué, acho que deixei bloqueado no aplicativo. Deixa eu ver aqui, moça… — Peguei meu celular. “Nova mensagem de Hugo em Tinder”. Tremi.

— Cobra aqui no dinheiro mesmo, moça. — Ela cobrou e saímos. Guardei meu celular, ansioso para ler a mensagem de Hugo.

— O crush respondeu, socorro. — Disse, mas as meninas nem ligaram.

Chegamos na casa da Mary e a primeira coisa que fiz foi abrir o Tinder.

“Hey”

“Tudo bem?”

Hugo havia me mandado duas mensagens.

“Tudo e você?”

“Quanto tempo. :(”

Desliguei o celular mais uma vez.

— Vamos consultar o tarô?

— Vamos, mas se sair coisa ruim não me fala, tá? Não vai mudar nada. — Rose estava com medo.