Acordei com essa vontade de escrever, bem no meio da noite. Estranho não? Não. Curioso, sim, mas estranho, não.
Acordei com um diálogo, bem aqui, ao meu lado. Eram personagens, isso, personagens de histórias minhas, histórias de outros, personagens que não deveriam ter aparecido desta forma. Eles discutiam entre si, gritavam uns com os outros, se abraçavam, era uma confusão de sentimentos e ações. Eles eram reais. Todos pararam a medida que notaram minha presença. Todos fitaram-me dos pés até a cabeça. Todos.
Verdadeiramente despertei. Um sonho, um maldito sonho. Foi ai que notei, que a obra é bem maior que o escritor, não, quem seria o escritor diante de sua obra. Quem seria o criador frente à criatura, que além de ter o trabalho de ser tudo aquilo ainda busca significância, ainda tateia no escuro tentando desvendar de onde surgira? Ah, delfos, que inútil. Que inútil, Dante e seu inferno. Não existe nada ali. Conhece-te a ti mesmo e conhecerás a verdade. Sério? Verdadeiramente não nos conhecemos? Ou nos conhecemos demais para não entender aquilo que carimba nosso nariz com um martelo pesado, sem dó, sem piedade.
O literato busca, a todo momento, razão em suas ações. Procura por mais inútil que seja um motivo por existir e outro bem mais forte para escrever tudo e todos. Um homem sentado em um banco de praça, uma senhora voltando da igreja, um menino correndo nu, enquanto seu irmão mais velho o persegue aos gritos. “Pare, João!” “Pare!”. João não para, porque ele não tem noção nem medo do que pode acontecer, não sabe que se continuar correndo ali, nu, pode cair e cortasse todo, ou bem mais belo e trágico, pode ser arremessado por um caminhão que rotineiramente passa por aquela rua. Pare, João.
João irá parar quando algo acontecer, quando sentir cansaço, quando pisar em uma pedra pontiaguda, quando sua mãe aparecer a porta segurando um chinelo e lhe der a primeira olhada. Ah, aquela encarada materna, onde o corpo treme de medo, onde o cérebro se pergunta: “E agora, eu volto e apanho ou aproveito mais o momento e apanho?”.
João agora é um dos meus personagens, não sei porque criei e nem me venha perguntar, ele sentiu necessidade de ser. João explodiu, criou-se, nasceu sem permissão, nem de plano precisou. Assim brotou João, do não consentimento de seu criador, desregrado e sobre tudo, cheio de deboche. João sente conforto e alívio em me negar, vagueia por ai, nu, sem ouvir irmão, mãe, nem a mim que lhe dei vida. Vai, João, vai certo por favor, que nenhuma pedra te faça surpresas no meio do caminho, que ninguém dê risadas de tua atitude, isso não serve de nada, risadas alheias. E se sorrirem de ti, João, ignore, você está certo. Eles também. O mundo é um moinho, João, você bem sabe, corre, vai contra o vento, grita com todas as forças que tiverdes, grita: Eu sou João.
A I Bienal do Livro de Limoeiro chegou ao fim, mas nossa cobertura continua no canal. Já estão programadas as seguintes entrevistas: Com o escritor e Ministro, Marcos Vilaça (Quinta-feira, 20) e com o escritor Marcelo Carrero (Sábado, 22). Hoje (Terça-Feira, 18) a entrevista com o cantor e escritor, Maciel Melo foi ao ar e você não pode deixar de conferir toda uma conversa sobre música, literatura, política e acima de tudo, Brasil. O escritor falou sobre sua infância, seu livro lançado na Bienal e cantou para o Beco. Vem ver:
Graças a Ganesha, vai ter segunda temporada sim de Sense8. A Netflix, como sempre causadora de problemas cardíacos em seus assinantes, desta vez resolveu fazer um mistério tremendo em relação à sua mais nova e mais assistida série do período 2015.1. Hoje, 08/08 seria, de acordo com o enredo da história, o aniversário dos sensates e a Netflix nos presenteou com um vídeo incrível. Os 8 atores (Mais alguns do elenco) gravaram uma mensagem que deixou os fãs literalmente no chão. Você assiste abaixo a RENOVAÇÃO CONFIRMADA de Sense8!
Chegamos à segunda edição do Café no Beco (Atrasada, mas chegamos). Nos comprometemos a publicar uma playlist especial para vocês em todas as segunda-feiras depois daquela na qual homenageamos Maria Bethânia. Se você assim como eu está em um estado deplorável no qual a cama tornou-se seu habitat e não percebe que horas são ou em que dia estamos, aqui vai, hoje é sexta e essa coluna não deveria está aqui. Mas vamos brincar de quebrar as regras, vamos ser um pouco “Chico” hoje. E falando no interprete da vez, hoje é dia dele, o garoto Buarque de Holanda, o jovem que cantou rente à todo um regime, da forma mais sorrateira que conseguiu. Vamos à nossa playlist de Chico Buarque.
Como fizemos semana passada, abaixo você encontrará dez músicas, a nossa seleção especial do compositor, cantor, escritor e dono de tantos outros ofícios (Sim, Arquiteto também). Chico Buarque apresenta um acervo gigantesco, sendo assim a tarefa de separar dez músicas não foi fácil. Mas vamos lá!
(Está música apresenta duas versões, a primeira foi VETADA pelo Regime, já a segunda é uma reedição da letra feita pelo próprio Chico Buarque por conta dos acontecimentos que sucederam a Revolução dos Cravos, o vídeo abaixo apresenta as duas e um trecho de entrevista.)
Chico das mulheres, das mensagens políticas, da música perfeitamente planejada. Faltou dezenas de canções nesta lista, sabemos disso, mas outros “Cafés no Beco” virão e você pode sugerir quem será o próximo cantor ou cantora a figurar neste espaço, é simples, deixe sua sugestão nos comentários e atenderemos assim que a segunda-feira chegar!
Fora tu,
reles
esnobe
plebeu
E fora tu, imperialista das sucatas
Charlatão da sinceridade
e tu, da juba socialista, e tu, qualquer outro
Ultimatum a todos eles
E a todos que sejam como eles
Todos!
Monte de tijolos com pretensões a casa
Inútil luxo, megalomania triunfante
E tu, Brasil, blague de Pedro Álvares Cabral
Que nem te queria descobrir
Ultimatum a vós que confundis o humano com o popular
Que confundis tudo
Vós, anarquistas deveras sinceros
Socialistas a invocar a sua qualidade de trabalhadores
Para quererem deixar de trabalhar
Sim, todos vós que representais o mundo
Homens altos
Passai por baixo do meu desprezo
Passai aristocratas de tanga de ouro
Passai Frouxos
Passai radicais do pouco
Quem acredita neles?
Mandem tudo isso para casa
Descascar batatas simbólicas
Fechem-me tudo isso a chave
E deitem a chave fora
Sufoco de ter só isso a minha volta
Deixem-me respirar
Abram todas as janelas
Abram mais janelas
Do que todas as janelas que há no mundo
Nenhuma idéia grande
Nenhuma corrente política
Que soe a uma idéia grão
E o mundo quer a inteligência nova
A sensibilidade nova
O mundo tem sede de que se crie
Porque aí está apodrecer a vida
Quando muito é estrume para o futuro
O que aí está não pode durar
Porque não é nada
Eu da raça dos navegadores
Afirmo que não pode durar
Eu da raça dos descobridores
Desprezo o que seja menos
Que descobrir um novo mundo
Proclamo isso bem alto
Braços erguidos
Fitando o Atlântico
E saudando abstratamente o infinito.
Álvaro de Campos – 1917
Amanhã vai ser outro dia. Bela música por sinal, mas que frase sem conteúdo, ela se enquadra perfeitamente na seção de auto-ajuda. E vamos lá, vamos conversar sobre livros de auto-ajuda: Como alguém consegue ler algo daquele tipo? (Lembrando, se você gosta e tem vários desses na estante, não peço perdão por conta de minha opinião, peço que compartilhe sua defesa a esse material conosco, nada melhor no mundo literário que um caloroso debate) Temos vários modos de ajudar uma pessoa e não precisa ser de forma direta, nada disso, só o fato de ser “Livro” já se torna uma ajuda, um conforto, uma motivação. Algo que preciso declarar sem delongas: Uma xícara de café pode te deixar bem mais alegre que trezentas páginas sobre “mude seu estilo de vida”, “converse com seus amigos”. Sente aqui, criança, se a pessoa for seu amigo ela que vai te procurar nos momentos difíceis, ela que vai ter ajudar até mesmo quando a literatura ou qualquer outra arte não puder. Mas a coluna de hoje não se restringe a livros desse tipo, nós iremos além.
Estávamos no “Amanhã vai ser outro dia”. Fazemos dessa frase uma palavra e busquemos sua etimologia. Onde surgira essa oração… Digamos que foi na Grécia (Me diga, o que não surgiu lá, até a crise surgiu lá), e lá estava o filósofo, Arisofonés (Sim, pesquisei no google agora mesmo e esse homem não existe, se não está no google não existe, fim, sem poréns (Até minha avó está no google, pode procurar)). Arisofonés tinha a mania de criar frases assim, sem procurar significado para as coisas, até que um dia, em uma reunião na Escola de Atenas, com Platão apontando para as nuvens, procurando seu mundo das ideias, com a presença ilustre do até então desconhecido Rafael Sanzio (Que usou a TARDIS é claro para captar aquele momento ilustre e colocar em um afresco inquietante) e com Hipátia da Alexandria que cruzara o Mediterranio apenas para aquela reunião sem sentido. Lá estavam todos, homens e mulheres, todos discutindo suas teses, tentando provar a existência de um mundo redondo, quadrado, plano, triangular, a inexistência de um mundo, e no meio deles, Arisofonés que ao ver tal balburdia, para não ficar por fora, gritara: “Amanhã vai ser outro dia”. No momento ninguém prestara atenção, como você pode perceber na pintura abaixo:
Se não identificou Arisofonés, aqui está para facilitar a busca:
Ai está nosso amigo, escorado como você há alguns instantes, debruçado sobre problemas e mais problemas e sem vontade alguma de resolve-los. Nesse momento ele tivera algum despertar e falara a frase que está nos guiando na “The Epic Battle” desta semana. “Amanhã vai ser outro dia”, Sanzio não pintara seu instante de alegria e esperança, mas veja nosso outro amigo, bem ao lado de Arisofonés, ele está escrevendo algo, com toda certeza deve ser alguma fanfic de época (Entendeu a referência? Hein, de época…) e seria esse escritor anônimo que observara o grito de Arisofonés e o guardara para a posteridade. Dia após dia as pessoas repetiram: “Amanhã vai dar certo” “Amanhã eu o peço em namoro” “Amanhã eu escrevo aquele capítulo que estou com um bloquei tremendo” “Amanhã eu vivo”. E vem sendo assim, sem tomarmos a atitude correta, sem termos um grito mais prolongado, sem procurarmos transformar um sussurro em canção, sem ter atitude, sim, essa é a palavra certa. Sempre existe algo a mais para fazer, sempre tem aquela coisa que cairia muito bem na quarta-feira, quando estamos na terça, ou na quinta, quando estamos na quarta. Mexa-se, inútil. Mexa-se enquanto o tempo nos pertence. Esse século vive a preguiça, respira a perca de tempo, nada se cria, é um amontoado de mais do mesmo, essa expressão também deve ter surgido na Grécia, mas não vamos focar nela, não hoje. Para explicar um terço de que não existe o fatídico amanhã, que tudo se resume ao agora, precisei brincar com filósofos e matemáticos, necessitei de uma pintura renascentista que já tornou-se clichê, tudo isso produções e mais produções de outros, de homens e mulheres que se moveram quando ninguém mais desejava sair do lugar. Não é questão de auto-ajuda, mas sim de vergonha na cara. Nunca tivemos vergonha na cara e sim, viva às frases prontas.
Tenho um recado para você que passou horas e horas em uma fila, seja na livraria ou no cinema, sim, um recado direto para você que esperou anos e anos por um final e quando este chegara, chorou, e como chorou, parecia uma criança ao quebrar seu brinquedo predileto. Você não está só, nunca esteve. Aposto que na manhã de hoje, assim que pulou da cama (ou se arrastou) um alarme disparou em sua mente: “Hoje é dia 31, caralho!”. Sim, um baita dia 31. Para seus parentes pode não ser nada demais, seu cachorro nem liga para isso, sua irmã não tira os olhos da televisão enquanto come o cereal, mas você sabe o significado deste dia. Você tem que saber, pois se não souber todos esses anos foram em vão. Mas você conhece o simbolismo, se pudesse tatuaria todas as linhas, todos os parágrafos, de certa forma eles estão fixos em seu corpo, vivem a cada símbolo das Relíquias da Morte que você desenha sem querer nos cadernos por ai.
Vamos recordar um pouco, mas só um pouco, estamos em um dia feliz, se puxarmos mais e mais de nossas mentes acabaremos caindo aos prantos. Há alguns anos aguardávamos com todo esforço do mundo um livro novo, não daremos nomes ou datas por fora assim com os sete, e com os depois desses. Não sabíamos o que ela iria aprontar dessa vez, quem morreria, quem venceria, em que enrascada nossos amigos iriam se meter, mas aguardávamos como se o mundo fosse acabar depois daquele lançamento. Atordoávamos a moça da livraria todo dia perguntando “Já chegou”, mesmo sabendo que existia uma data exata para que eles chegassem, xingávamos aquela mulher todos os dias depois da reposta negativa mesmo tendo consciência de que ela não tinha responsabilidade alguma sobre aquilo. Eis que um dia eles chegavam e nós, com as moedas reunidas durante meses, corríamos até à livraria, sempre alguém tinha chegado antes, sempre era esse inferno, mas lá estavam eles, sorrindo, em posição de duelo, bradando varinhas e lhe convocando para a mais bela e rápida leitura, claro, aquela espera de anos resultaria em poucas horas. Nós devorávamos cada página, cada capítulo, era uma leitura sem cansaço, sem receios. Minto, existia um receio sim em tudo aquilo e ele se encontrava nas folhas finais, estava acabando, ficávamos desolados quando acabava, mas existia uma certeza. “Vai ter mais, eu sei que vai”. Mas um dia a fonte secara, não saía um pingo se quer de Harry, Ron ou Mione, isso foi o que pensamos quando lemos aquele “Tudo estava bem”.
Mas aqui está meu recado: Ela é Joanne Rowling. Ela é a escritora mais influente que o mundo literário já viu. Ela pode começar e terminar histórias quando bem entender e nós, seus pequenos leitores, apenas iremos aplaudir e captar sentimentos singulares, sentimentos esses que nenhum outro escritor pode nos proporcionar. Ela é Joanne, nascida ao fim do sétimo mês, assim como sua criação, capaz de derrotar todos os obstáculos, servir de inspiração até para o mais desacreditado homem. Foram sete anos de luta, sete anos sonhando com um garoto que corria até uma estação de trem e atravessava sua parede, foram sete anos sobre os papéis imaginando, tornando aquele castelo sua realidade, nossa futura realidade, sete pequenos anos quando comparados com os que virão, com os que passaremos lembrando e transformando a magia.
31 de Julho engloba bem mais do que podemos ver, trata-se do nascimento de um sentimento, uma vontade de querer mais e mais, vimos isso nas páginas e páginas, não falo apenas do menino-que-sobreviveu, refiro-me também à Krystal, aos moradores de uma Pagford traiçoeira e encantadora, dirijo-me à Robin, a Cormoran e sua mania de sempre acertar, Rowling deixou depositou pedaços de sua alma em cada personagem, do Newt que está prestes a ganhar uma forma bem maior do que a que conhecemos até uma coruja que nos fez chorar por horas. Ela tem esse dom, de não temer o que está por vir, de não se importar por aceitação, fazendo seu trabalho da melhor forma possível e transformando vidas, mudando conceitos, inserindo em nosso dia-a-dia surpresas e mais surpresas, vejam só, chegamos ao tão esperado 31 de Julho e nesse encontro de criatura e criador estamos nós, bem no meio, prontos para abraçar quem quer se seja, prontos para nascermos também, neste sétimo mês.
À Joanne e a Harry só temos uma pequena frase a dizer: Obrigado por tudo. Tudo se resume a isso, agradecimento, por ter nos proporcionado experiências únicas (e continuar fazendo-as), por nos oferecer aquela palavra no momento exato mesmo nem estando ao nosso lado. Ela mesmo já dissera, “Nenhuma história vive, se não tiver ninguém para lê-la”, sendo assim garantimos que a magia persistirá, independente das eras, ela estará com sua chama mais que acessa, pois não pegamos chuva e sol atoa, não lemos está história várias e várias vezes (Em línguas diversas em alguns momentos) para desistirmos com o passar do tempo. Isso vai além da literatura ou do cinema, vai muito além de atores ou diretores, existe uma família, uma imensa família que abraça quem quer que seja, que comemora cada data como se fosse a primeira, que renasce a cada fim de julho.
A Rocco enfim, cedeu. Ano passado nos EUA a Scholastic publicara uma nova versão de capas, ilustradas por Kazu Kibuishi. Você pode conferir todas no acervo do Beco. Agora a editora Rocco finalmente anuncia pré-venda e preparem os bolsos, sim, custará apenas 230 reais. A edição será em brochura e você pode adquirir seu box agora mesmo, é só clicar aqui.
Abaixo imagens do box (clique para ampliar):
Informações atualizadas sobre todo o mundo de Harry Potter e os livros de J.K. Rowling você encontra aqui, no Beco.
Ser um e apenas um é pouco, mas muito pouco para mentes criadas não para o presente, mas para um futuro, um distante futuro que tornou-se atual, que tornou-se o passado de muitos. Não existe cronologia ou lógica, não existe razão ou sentimento, nada existe ao mesmo tempo que tudo se restringe à existência, às existências. É uma constante de pensamentos, uma mistura de atitudes, uma junção de vidas e vidas. Uma criação que resultou em diversas. Não, não é uma série normal, não falamos de algo comum, é peculiar em todos os sentidos, fogo de nosso entendimento.
A confusão criada na mente do telespectador no primeiro episódio é proposital, é claro que seria, somos jogados para os diversos universos mentais dos personagens. Para resumir a introdução da série: A história acompanha outras oito, segue o rastro de oito seres, esses espalhados por todo mundo, mais precisamente em: Londres, Seul, Mumbai, Nairóbi, Berlim, Cidade do México, São Francisco e Chicago. Nessas cidades temos os respectivos personagens: Riley, Sun, Kala, Capheus, Wolfgang, Lito, Nomi e Will. Você pode conferir essa lista abaixo:
Ao decorrer dos episódios eles descobrem, ou pelo menos começam a notar as conexões que existem com outras pessoas. Muitos sentem frio quando o clima, o seu clima, o do lugar onde o corpo físico realmente está, exala um calor infernal. Sensações e mais sensações invadem as mentes dos sensates. Até que chega um momento onde a confusão criada no psíquico de cada um torna-se algo proveitoso. Eles, assim como os pensamentos, herdam certas habilidades, uma hora eu sou você, outra hora você consegue ser cada parte de meu corpo, é uma dança de cortes, imagens, ações. Os oito personagens claramente se unem para formar um ser indestrutível, nutrido das diversas qualidades, sendo hábil quando é preciso usar a inteligência e mais eficiente ainda quando é necessário usar a força. Tudo isso não passa de um plano de fundo, um proposito para a história existir, se não fosse pelo “fenômeno sensate”, onde pessoas podem se conectar apenas telepaticamente com outras, a série não passaria de uma história maçante, sem nexo. Mas o impressionante é isso, o que mais nos impacta não é o “dom”, e nem essa evolução humana. O que nos deixa boquiabertos é a humanidade exposta. É impactante como a ficção de Sense8 só relata bruscamente o real.
Por se tratar de vários ângulos, de várias pessoas, podemos ter diversas experiências de vida. Comecemos por Capheus, meu segundo personagem predileto. Capheus mora na capital do Quênia, Nairobi. A cidade nos é apresentada em um misto de alegria e balburdia, todo aquele espírito cansativo e acolhedor que uma capital pode proporcionar, mas com um ponto a mais, a pobreza do país consegue passar despercebida diversas vezes, até que chegamos à mãe de Capheus. A mulher está infectada com AIDS e Capheus, filho de uma classe pobre, sem ter onde apelar, vive um drama psicológico, mas sua sorte muda, ou melhor dizendo, o azar bate em sua porta. O motorista do “Van Damme” acaba parando onde não deveria estacionar e recebe um soco do destino. A partir dai, graças às habilidades de Sun (A nossa personagem favorita, sim, você irá ama-la), e sua vontade de vencer, Capheus entra em uma montanha russa. Mas vamos, enfim, até Sun.
Chegamos em Seoul com toda a desconfiança do mundo, sem saber realmente quem é aquela mulher, sem saber se podemos admira-lá por fazer tudo aquilo ou teme-lá. Mas eis que em um belo dia, onde nada teria acontecido, onde Sun continuava a ser quem era, mudamos de opinião. Ela só se estressou um pouco, tinha sido ignorada pelo próprio pai, dono da transnacional onde trabalha, tinha ficado aborrecida por instantes, poucos segundos esses que a fizeram apunhalar a mesa de uma secretária desavisada como se fosse uma bolacha e ali, sem mais nem menos, partir um pedaço do móvel fora. Sim, essa é a melhor personagem de Sense8. Olhamos para Sun com outros olhos, lhe admiramos e será assim por toda temporada, a cada atitude que tomar, a cada rasteira que der no predestinado. Sun fora criado para algo que nunca desejou, fora obrigada a dar passos que não eram seus. Assim como Kala em seu casamento. A garota de Mumbai vive um dilema: Casar para ajudar sua família ou rejeitar a oferta por não amar a pessoa que lhe pedira tal coisa? Kala nos apresenta a Índia religiosa, a Índia de uma cultura vulcânica onde a cada segundo jatos de lava são expurgados por diversas montanhas humanas.
Nesse contratempo que vive Kala, aparece Wolfgang, o alemão cresceu à sombra de um pai criminoso e por esse e outros motivos, tornara-se uma cópia. Ao seu lado um fiel amigo, geralmente cada sensate terá um, seja ele uma namorada, como no caso de Nomi e Lito (Para Lito um namorado, e uma namorada, falsa, mas uma namorada, viva ao poliamor, não é o caso de Lito, ele é muito fiel por sinal, mas vamos lá, viva ao poliamor do mesmo jeito) ou um cachorro como acontece com Sun. É meio de praxe, seja para aliviar a barra, para reprimir aquela “loucura” que o personagem esteja vivendo ou para brigar por seus anseios. Com Will as coisas ocorrem de diversas formas, ele, por ser policial, não pode ficar avistando quem quer que seja do nada, ou conversar com pessoas que não estão ali, mas ele o faz e por isso reforça um drama interno. Will se envolve fortemente com Riley, que não apresenta muitas funções em toda a trama, mas seu papel é essencial para unir o grupo em torno de uma causa.
Eles estão espalhados por todo o mundo, vivendo suas vidas, transformando o dia após dia em algo mais que maçante, mas o acaso resolve bater na porta e quando a situação fica complicada eles se envolvem em torno de tudo aquilo, aceitam o que já deveriam ter aceito há muito tempo e transformam-se em um só. Isso não é spoiler para ninguém, longe disso, temos plena consciência que isso ocorreria cedo ou tarde, a série deixa explícito, mas diversos obstáculos são postos propositalmente caminho após caminho e nessa rede de mentes se cria pontos de confiança, pontos que os motivarão. Você ficará com essa frase pulsando em sua mente todo santo dia: “Eu sou nós”. Ou na melhor das hipóteses, “Somos um só”.
Eis que 2015 começara, cheio de promessas, histórias a serem escritas, novidades aos montes. Entre tantos acontecimentos que nos sucederiam estava a turnê que ocorreria durante esses 365 dias, uma turnê comemorativa em alusão aos 50 anos de uma carreira vitoriosa, de uma trajetória invejável a qualquer cantor. Maria Bethânia personifica as letras que dedilhadamente deixa ecoar, vive a cada verso, a cada poema lido sobre os palcos que passou. “Abraçar e Agradecer”, como foi intitulada a turnê, após passar por diversos estados do Brasil, chega ao Nordeste com parada em Recife. A cantora cantará no Teatro dos Guararapes nos dias 30 de Setembro e 1 de Outubro, o primeiro show, que fora marcado para Julho não ocorreu por conta da uma virose, e Bethânia, com toda classe, cancelara para que ocorresse dois, dois espetáculos estonteantes. Os ingressos para o dia 1 de Outubro esgotaram em três horas de vendas, já os de 30 de Setembro se foram em trinta minutos. Recife aguarda Maria Bethânia com todas as honrarias destinadas à uma entidade, pois é isso que ela se tornou, desde o dia em que substituíra Nara aos seus dezenove inocentes anos até agora, em homenagem aos cinquenta anos da Maricotinha, selecionamos dez interpretações incrivéis para que seu início de dia fique bem mais leve, motivador e além de tudo, encharcado de Bethânia, uma das vozes mais marcantes que brotaram nesse país. Estreando o nosso “Café da Manhã”, senhoras e senhores, Bethânia, da Bahia, de outro planeta, para nós, pequenos mortais.
Sim, doeu fazer essa playlist, mas conseguimos fazer. Enumerar 10 interpretações de Bethânia é algo difícil demais, mas se você sentiu falta de sua música predileta aqui (Claro que sentiu) é só deixa-la nos comentários. Até a próxima segunda com um outro “Café da Manhã” e quem sabe será com seu cantor ou cantora preferido.
Não é só um documentário bibliográfico, é uma obra-prima. A desumanidade viva de Simone, o pulsar de seu timbre, sua performance infernal sobre o palco, tudo isso estampado a cada cena, a cada relato emocionado de sua filha, a cada soco no estômago que nos é dado. É uma armação direcionada ao psicológico, não é um relato histórico e musical e somente isso, o filme mexe com seus conceitos de liberdade e satisfação, é um embate filosófico do início ao fim.
O ser humano sempre fora uma controvérsia. Sempre desejou passar essa imagem de uma hora aqui, outra ali. Miss Simone não fizera diferente. A Netflix nos premei-a com um dos documentários mais realistas que já vi, nada daquela lenga-lenga saudosista, elevando o estudado em pedestais, nada disso. Nina Simone é adorada quando deve ser, expurgada quando necessário, é um misto de amor e ódio que ela mesmo sofrera, é um misto que fica evidente em cada minuto do filme. Posso assistir mais uma, duas ou três vezes, mas o furor de Simone ainda me atinge, a necessidade de ser por ser alcança níveis inimagináveis. Eternizaram a imortal loucura racional de Simone.
Imagens raras foram inclusas no filme, com a qualidade que só a Netflix consegue obter, não ficou nada fragmentado ou sem nexo, cada situação em seu tempo, sem adiantar algo porque deixaria a produção mais veloz ou coisa do tipo. E falando em ritmo, “What Happened, Miss Simone” chega a ser curto, você sentirá saudades do filme logo assim que este terminar, Simone nos aparece atual e natural demais. Um ponto que é fortemente destacado é sua face política, a face política necessária para tornar a produção algo gigantesco, não se trata só de Nina, se trata de toda uma causa, a luta conjunta de homens e mulheres por uma liberdade tão falada e repassada por entre as cenas. Sr. Martin Luther King e tantos outros figuram no plano de fundo. A marcha em Selma é eletrizante, arrepia qualquer um que se interessa e se importa com as formações sociais, que se deixa levar por mortes e vidas em prol de uma causa. Algumas partes nos remetem ao indicado ao Oscar, “Selma”, por conta é claro do tema, mas principalmente por toda a frieza e não piedade que nos é imposta.
Conseguiram dar uma roupagem totalmente nova para as músicas de Nina Simone, elas se entrelaçam criando uma linha emocional constante, onde somos arremessados para o íntimo e o externo de Simone, nos deixando fazer esse questionamento várias e várias vezes: “What happened?, porque ela não sustenta uma só personalidade, monstros e monstros devoram Nina e nos devoram, pois sofremos com as fases, assim como seus parentes sofreram, seus amigos sofreram, como Simone sofreu friamente. Perturbador, do inicio ao fim, inquietante, preciso, impiedoso, um dos melhores filme que assisti do gênero.