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Crítica: Mulher-Maravilha

Após sua aparição em Batman vs Superman, trailers eram quase desnecessários na hype para o filme da Mulher-Maravilha. As expectativas se amontoaram, tanto as de um grande filme de super-herói quanto as de um ícone de representatividade. Hoje, essas expectativas foram atendidas. Maravilhosamente. Com cenas de ação lindamente coordenadas, fotografia envolvente e simbologias e metáforas fortes, não há dúvidas de que o filme definiu um novo patamar para os próximos filmes da DC – isso sem fugir do estilo de Snyder, o que de certa forma, é bem interessante. E se você está se perguntando se isso significa várias explosões e demolições, a resposta é sim.

A história contada é a da origem da heroína. Começamos em Temiscira, a ilha da mitologia grega onde viviam as guerreiras amazonas. Diana é uma criança, e uma criança tão teimosa quanto a heroína com a qual passaremos as próximas duas horas; vemos ser mencionado desde o início um mistério sobre sua identidade, indicando um futuro obscuro e tempos perigosos. Sua mãe, provavelmente a mais coruja de todas as mães de super-heróis, faz de tudo para que ela não siga seu destino e não enfrente o perigo que, nós sabemos, ela eventualmente enfrentará. É aí um dos pouquíssimos pontos fracos do filme: o clichê da “escolhida”, extremamente desgastado no storytelling contemporâneo, cobre praticamente a integridade do roteiro. Em compensação, existem motivos para relevar (até para exaltar) algumas das passagens mais inconcebíveis do filme; isso depende apenas do quão aberto você está para a filosofia do que é ser um super-herói.

O cenário histórico da Primeira Guerra Mundial é importante para dar um tom característico e possibilitar o diálogo feminista. Sempre fazendo as perguntas e comentários que confundem os homens ou marcando presença em lugares onde dizem que ela não pode estar, Diana quebra vários tabus ao longo do filme, inclusive alguns que hoje já estão em processo de desconstrução (como o das mulheres na política). Na batalha final, o vilão sufoca-a com o que representa, basicamente, um corpete: é a metáfora absoluta para a resistência ao patriarcado.

Quanto às cenas de ação, estas estão absolutamente fantásticas. Eu, particularmente, achei que as do Batman em BvS estavam excelentes; em Mulher-Maravilha elas correm fluidamente ao som da trilha composta por Rupert Gregson-Williams. O tema composto por Hans Zimmer e Junkie XL também está presente. Existem algumas cenas, porém, que podem ter parecido um tanto forçadas para algumas pessoas; principalmente algumas nas quais a Mulher-Maravilha enfrenta um número absurdo de soldados e armas. De início, eu mesmo rejeitei um pouco essas passagens, pensando que era pedir demais de mim. Mas aí o nerd lá dentro me lembrou que, por baixo da fantasia e dos super-poderes, é isso que super-heróis são: o exagero de tudo o que é ser humano, e o símbolo de esperança que as vezes precisamos para acreditar que podemos ser o melhor de nós. E em resumo, foi isso que esse filme me mostrou, principalmente com a bela mensagem narrada por Diana no final.

Definitivamente, eu não esperava que esse fosse ser o filme que me fez acreditar novamente na DC, mas foi. Agora é esperar por Liga da Justiça e ver se o estúdio realmente aprendeu a lição!

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Crítica de Cinema: Piratas do Caribe – A vingança de Salazar (2017)

Piratas do Caribe: A vingança de Salazar chega aos cinemas nessa quinta-feira (25), mas o Beco teve acesso a uma sessão exclusiva e vamos contar tudo para vocês. Seis anos após o quarto filme da franquia, Piratas do Caribe volta com muita expectativa e muito investimento da Disney, que não poupou esforços na divulgação, a fim de reconquistar os fãs depois de tanto tempo. O elenco traz de volta as estrelas já presentes nos filmes anteriores e estréia Kaia Scoledario e Brenton Thwaites como o casalzinho da vez, e Javier Bardem como o novo problema na vida de Jack Sparrow (Johnny Depp).

Carina Smyth (Kaya Scodelario) ae Henry (Brenton Thwaites)

A Vingança de Salazar conta a história do filho de Will Turner (Orlando Bloom) e Elizabeth Swann (Keira Knightley), Henry (Brenton Thwaites), e sua busca para livrar o pai de sua maldição. O filme não deixa muito claro, mas, pode-se deduzir que a história se passa uns vinte anos após Will virar capitão do Holandês Voador. Seu filho já é um rapaz e acredita que existe um tal Tridente de Poseidon que pode acabar com toda maldição causada no mar, como a do seu pai. Sabendo que o único jeito de achar esse Tridente é com a bússola de Jack Sparrow, ele começa a procurar o pirata que não vive lá o seu melhor momento. Sim, Jack Sparrow está velho, falido e mais bêbado do que nunca. Sem o Pérola Negra, ele vive em um barco encalhado com uma tripulação faminta que o abandona após um assalto de banco frustrado. Desiludido, ele acaba trocando sua bússola por uma garrafa de rum e é aí que tudo desmorona de vez.

Javier Bardem (Salazar)

Como desgraça pouca é bobagem, o filme nos traz um novo vilão: Salazar (Javier Bardem). Como comandante da marinha britânica, Salazar teve como objetivo de vida livrar o mar dos piratas. Até que um jovem pirata atrevido e muito irritante como um certo pássaro chamado de “Sparrow” cruza seu caminho e faz com que seu navio afunde dentro de uma caverna amaldiçoada, condenando ele e sua tripulação a viverem presos no navio como mortos vivos esperando o dia da sua vingança. E é claro que esse dia chega no dia que Jack trai sua bússola, quebrando a maldição de Salazar, que sai pelos sete mares cumprindo sua missão: livrar o mar dos piratas e se vingar de Jack Sparrow.

No meio de tudo isso, temos uma nova personagem: Carina (Kaia Scoledario). Uma astrônoma acusada de ser feiticeira que herda de seu pai um diário que, segundo ela, é a chave para achar o Tridente. Como sempre acontece nos filmes dessa franquia, os personagens sempre se encontram no meio de muita confusão, então, Carina e Henry se juntam na busca de Jack, o acham e o convencem a ir atrás do Tridente, já que é a única forma de acabar com Salazar. E é aí que surge Barbossa (Geoffrey Rush), agora, um pirata muito bem sucedido com mais de dez navios. Como Salazar quer acabar com todos os piratas, ele se junta ao grupo para que seus negócios não sejam prejudicados. Todos em busca da mesma coisa, mas cada um com seu próprio motivo, como é de praxe.

Muita ação e excelente produção é o que se deve esperar desse filme. As tradicionais lutas de espadas, canhões dos navios e mortos vivos não faltam, mas os fãs devem se preparar para um Jack Sparrow mais parado e menos brincalhão. Sim, eu notei uma certa amargura no pirata sempre tão sarcástico. Talvez pelo tempo que se passou no filme ou pela idade do próprio Johnny Depp, mas Jack Sparrow não faz mais suas acrobacias como antes. Mesmo assim, não deixa de dar um show de atuação, mesmo estando um pouco mais sério. Contei umas cinco cenas cômicas, o que me causou uma certa estranheza, já que ele é sempre tão brincalhão e com ótimas frases de efeito. Percebe-se um maior investimento nas cenas de luta e nos efeitos especiais e menos na história, um pouco repetitiva. A trilha sonora continua com a musiquinha já há muito conhecida e o ar do filme está mais sombrio do que o normal. Um clima pesado, digamos assim.

Johnny Depp (Jack Sparrow)

Jack Sparrow vê todo o seu prestígio jogado na lama, sua tripulação o abandonando e a recompensa por sua cabeça ser reduzida a 1 dólar. Acredito que a atmosfera do filme quis mostrar isso, passando uma melancolia no ar. Os olhos dele transparecem o cansaço e nunca ficou tão marcada a falta que ele sente do Pérola Negra. Sentimos uma compaixão pelo anti-herói que tanto nos fez rir e nos surpreendeu com suas estripulias. Sentimos o peso do tempo e é difícil não pensar que a reta final se inicia. Como sempre acaba acontecendo nas franquias de sucesso, uma hora a história acaba e começa a enchessão de linguiça, acho que foi isso que deixou o filme um pouco cansativo, com tanta cena de luta e pouca história para preencher as duas horas.

Segundo o próprio Johnny Depp, terá mais dois filmes e, pela cena pós-crédito (sim, tem uma cena pós-crédito bem no final, mas bem no final mesmo, então, não saia do cinema antes que as luzes se acendam) vai ter o sexto filme, pelo menos. Esperemos que a franquia se encerre por cima e mantenha a qualidade e o sucesso, pois logo teremos que dizer adeus a Jack Sparrow. Ou melhor, Capitão Jack Sparrow.

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Review: Twin Peaks 03×01 e 03×02

Os episódios 03×01 e 03×02 de Twin Peaks foram dirigidos por David Lynch. Criaçao da série/roteiro: David Lynch e Mark Frost. Elenco: Kyle MacLachlan, Sheryl Lee, Kimmy Robertson, Russ Tamblyn, Mädchen Amick, Dana Ashbrook, Ray Wise, Grace Zabriskie, Everett McGill, Michael Horse, Brent Briscoe, Harry Goaz, Al Strobel, Jane Adams, Chrysta Bell, Catherine E. Coulson, George Griffith, entre outros.

Cá estamos 25 anos depois com dois novos episódios de Twin Peaks recém saídos do forno. Todos mistérios do final da 2ª temporada nos deixaram com um sentimento de dúvida em relação aos eventos da série. E por mais que uma 3ª temporada pareça tentar responder alguns destes questionamentos, não fique muito esperançoso e lembre-se: estamos falando de uma produção de David Lynch aqui. Dessa forma, por mais que tenhamos certas respostas, mais perguntas e mistérios bizarros surgirão, e essa é a beleza de Twin Peaks. Mais do que se ater em resolver os enigmas propostos, é necessário prestar atenção nas organizações simbólicas dos mesmos. A série apresenta, através do homicídio de uma jovem menina, dualidades muito presentes no nosso imaginário: o bem e o mal, o inocente e o culpado, o puro e o impuro. É necessário compreender as nuances que transpassam essas lutas, que são incorporadas na narrativa através do sobrenatural, antes de somente tentar desvendar a série como se esta fosse um simples suspense policial.

Vivemos hoje em uma época fértil para as retomadas de produções que marcaram seu tempo, e Twin Peaks não só marcou os anos 90, como também influenciou, tanto na linguagem quanto na temática, muitas obras que seguiram. No entanto, é uma tarefa delicada produzir esses retornos e não se deixar afundar em completa nostalgia. Ao assistir os primeiros episódios da série, é possível encontrar um certo equilíbrio, Lynch e Frost não se prenderam somente em reapresentar personagens antigos e secundários das outras temporadas, mas a partir de personagens pontuais conseguiram reatualizá-los e remanejá-los a uma narrativa que, não só retoma o gancho deixado no final da 2ª temporada, mas a desenvolve sob um viés mais contemporâneo. Assim, vemos Lucy (Kimmy Robertson), Andy (Harry Goaz) e Hawk (Michael Horse) quase que parados no tempo, apesar da visível ação do envelhecimento nos atores; vemos o Agente Cooper (Kyle MacLachlan) duplicado, seu corpo sob controle de um espírito maligno (ou podemos chamá-lo apenas de Bob), e seu espírito ainda preso no Black Lodge; vemos Laura Palmer (Sheryl Lee), mais velha porém usando o mesmo figurino de suas outras aparições no Red Room, e apresentando algumas das linhas de diálogo mais interessantes até agora, como quando o Agente Cooper a indaga sobre quem ela é, e ao passo que ela o responde dizendo ser Laura Palmer, Cooper a confronta “mas Laura Palmer está morta”, e Palmer fala “eu estou morta, mas ainda vivo”, logo depois dessa interação com Cooper, Laura é sugada para uma outra dimensão (seria o White Lodge?) ao estilo de Império dos Sonhos (2006).

Nesta nova temporada há também o desenvolvimento espacial da narrativa, que não é mais centrada na pacata cidade de Twin Peaks, movendo-se entre outras cidades mas sem perder uma certa estranheza ao representá-las. Isso se deve, em parte, ao modo como Lynch situa espacialmente as cenas, com seus zooms e travellings em grande planos gerais carregados de um ar misterioso quando combinados a uma trilha sonora mais tensa. O diretor traz de volta em Twin Peaks uma forma de linguagem mais rígida – com poucos movimentos de câmera e planos mais abertos, estáticos e longos – que parecia estar perdida nas séries atuais, onde prioriza-se um ritmo mais acelerado na montagem e uma construção narrativa baseada nas emoções – talvez seja por isso que a maioria das séries da atualidade abusam do close-up. Por isso, o menor plano encontrado na série são primeiros planos estáticos, alguns deles frontais e com uma duração mais extensa. Somando-se a isso, uma cenografia impecável que deveria ser analisada minuciosamente, temos uma estética carregada de suspense que grita David Lynch.

Embora deva-se reconhecer que foi buscada uma atualização estética e narrativa para que a série atinja novos públicos, um ponto a respeito da aborgagem temática de Twin Peaks é preocupante. Não há como ignorar o fato de que a série foi construída em cima da violência contra a mulher, e a exibição do corpo feminino foi explorada de forma totalmente desnecessária, mesmo para uma série da década de 90. Era esperado que em pleno 2017 esta temática tivesse sido abordada diferentemente, mas infelizmente não foi o caso. Com um olhar antigo e ultrapassado, assistimos a morte de alguns personagens no decorrer dos primeiros episódios, homens e mulheres, mas por que duas delas tinham que estar sem roupa?

Algumas cenas parecem deslocadas, como se tivessem sido colocadas apenas para relembrar de alguns personagens. É o caso de quando, no início do primeiro episódio vemos o Dr. Lawrence Jacoby (Russ Tamblyn) em um trailer no meio da floresta, ou no final do segundo episódio com a cena situada no bar Bang Bang onde encontramos Shelly Johnson (Mädchen Amick) e James Hurley (James Marshall). Há de se considerar a possibilidade de essas cenas se desenvolverem, trazendo novas significações no decorrer da temporada.

De qualquer forma, foi gratificante assistir Twin Peaks novamente, e perceber que Lynch e Frost podem sempre ultrapassar seus próprios níveis de representação do bizarro. E esse é apenas o começo.

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Crítica: Big Little Lies (2017)

(Este texto contém spoilers.)

Baseada no livro de mesmo nome da autora Liane Moriarty. Roteiro por David E. Kelley. Dirigido por Jean-Marc Vallée. Elenco principal: Reese Witherspoon, Nicole Kidman, Shailene Woodley, Zoë Kravitz, Laura Dern, Alexander Skarsgård, Adam Scott, James Tupper e Jeffrey Nordling.

Com um olhar superficial, Big Little Lies pode parecer fútil ou até uma versão cult de mulheres ricas, mas não se engane, há uma narrativa poderosa que se revela entre vidas supostamente perfeitas. O plot inicial da minissérie acontece a partir da premissa “alguém morreu”, e o desenrolar dos episódios trazem eventos envolvendo moradores locais da pequena cidade costeira de Monterey, na Califórnia. Dentro desses eventos estão, além de um assassinato misterioso, violência doméstica, estupro e uma sociedade que se alimenta do drama alheio. Na montagem, Jean-Marc Vallée utiliza a investigação policial para traçar o que pode ter desencadeado o homicídio, e ao que todos indicam, tudo começou quando a filha de Renata (Laura Dern), Amabella (Ivy George), aparece com hematomas de estrangulamento após o primeiro dia de aula, começando o processo de culpabilização da criança suspeita de tal ato. Daí em diante tem-se o crescimento individual de cada personagem e que irá levar ao desfecho do conflito principal, o assassinato, criando através dessa espera uma tensão crescente em cada episódio.

Com uma trilha sonora que merece ser ouvida separadamente (já tem playlist no Spotify, inclusive), contando com bandas/artistas como Babe Ruth, Frank Ocean, Alabama Shakes, PJ Harvey e Neil Young, a música em Big Little Lies desempenha um papel de mediadora dos sentimentos e conflitos dos personagens. Não é atoa que as músicas que Jane Chapman (Shailene Woodley) ouve quando sai para correr são Bloody Mother Fucking Asshole da Martha Wainwright e Hands Around My Throat da banda Death In Vegas. Da mesma forma, é de se espantar, por exemplo, que a personagem com o melhor gosto musical da série seja Chloe (Darby Camp) a filha de 6 anos de Madeline (Reese Witherspoon). Sendo que algumas vezes ela mesma introduz as músicas na cena, conferindo uma boa fluidez entre a trilha sonora e a própria narrativa.

É impossível não entrar na discussão feminista ao assistir Big Little Lies, já que cada arco narrativo traz, em diferentes níveis, uma reflexão sobre o papel da mulher na sociedade. Dessa forma, tem-se na personagem de Renata o exemplo das mães que não abdicaram da profissão em prol da família, rejeitando o modelo pronto de que o único trabalho da mãe é cuidar dos filhos/da casa e, em consequência, os olhares enviesados da sociedade a respeito de tal prática; já Madeline apresenta uma imagem de mulher forte que não hesita em expressar seus pontos de vista e brigar por aquilo que acredita, sendo rotulada por muitos como encrenqueira; Bonnie (Zoë Kravitz), ainda que sendo muito jovem, incorpora o papel de uma mulher mais desconstruída a respeito ao mundo; Jane (Shailene Woodley) mostra o trauma psicológico irreparável de uma vítima de estupro; e Celeste (Nicole Kidman) representa o difícil papel da mulher que se encontra em um relacionamento abusivo e o conflito da mulher que é constantemente agredida e abusada por seu parceiro.

Além de tudo isso, encontramos uma sociedade de aparências que revela, embaixo de vidas lindas e perfeitas, um oceano profundo e escuro que esconde mentiras e problemas sociais. Nesse sentido, há cenas que Celeste – apesar de ainda ter hematomas da violência do marido em seu corpo – é vista colocando várias fotos da família no Facebook, em uma tentativa de sustentar a aparência de vida feliz e completa com uma família linda e um marido atencioso e cheio de amor. Mas relacionamentos abusivos não são baseados em amor, há controle, há violência, há machismo na sua forma mais comum, mas não há amor, de forma alguma. Perry (Alexander Skarsgård) pode ser extremamente carinhoso, gentil e atencioso com Celeste, mas somente após deixá-la com vários hematomas. Isso não é amor, isso é tortura. Mesmo quando Jane confessa às amigas o seu caso de abuso, Celeste mantém a máscara, muito embora tenha sido um ponto catalisador para reconhecer que, assim como Jane, também é uma vítima. A partir daí temos uma sequência complexa, apresentando a parte mais difícil de se estar em um relacionamento abusivo: reconhecer que se está nele. Assistimos pouco a pouco, episódio a episódio, a evolução de Celeste, o reconhecimento da sua posição nessa relação e a sua possível influência na criação de seus filhos.

Em oposição ao clima de hipocrisia da sociedade de Monterey, Jane Chapman entra na história para romper com o padrão: jovem, solteira, um filho pequeno e uma vida simples (financeiramente falando). O contraste da personagem pode ser percebido através das cores do seu figurino, enquanto as outras mulheres usam roupas coloridas ou em tons claros, Jane varia entre preto, cinza ou tons escuros. Há um ar de mistério carregado pela personagem, que acaba revelando mais tarde que seu filho Ziggy (Iain Armitage) é fruto de um estupro. Sem tempo de processar o que aconteceu, um dia Jane era vítima, no outro ela já era mãe. Sem procurar as autoridades, nem ajuda psicológica, a personagem tenta enterrar a memória e os sentimentos provenientes desse abuso, e sua forma de lidar com a situação é dormir com uma arma embaixo do travesseiro. Desde o primeiro episódio, durante sua rotineira corrida, já são introduzidas cenas de flashback em que Jane corre na praia, perseguindo pegadas na areia. Mais tarde esses flashbacks serão mesclados com cenas imaginadas, Jane passa a perseguir um homem, e quando o alcança, pega sua arma e atira. Os cortes secos na transição entre as cenas reais e imaginadas conferem um tom de pensamento incontrolável. Essas sequências aparecem [quase] sempre quando a personagem sai para correr ou a noite antes de dormir, momentos em que deixa o pensamento se soltar e vagar livre, e é compreensível que o único lugar onde a mente de Jane a leva é até o seu agressor.

Ao som de You Can’t Always Get What You Want dos Rolling Stones, o último episódio, intitulado “You Get What You Need”, traz o triunfo das mulheres. A revelação de que Bonnie matou Perry apresenta, de forma metafórica, que o modo de ultrapassarmos as barreiras da sociedade patriarcal é através da sororidade. Nossa melhor defesa contra o machismo se encontra na relação que nutrimos entre nós mesmas. Nós nem sempre conseguimos o que queremos, mas o que precisamos, definitivamente, é reconhecer que juntas somos mais fortes.

(Apesar de falar de temas importantes na pauta do movimento feminista e ser baseada em um livro escrito por uma mulher, tanto o diretor quanto o escritor da série são homens. Vale a pena a reflexão a respeito de uma obra audiovisual que prega o empoderamento e a sororidade não usar a oportunidade para fazer o mesmo. É sabido que há um aumento no número de mulheres no audiovisual, sobretudo na área de direção e roteiro, mas ainda assim, este número continua pequeno. Na produção nacional, por exemplo, segundo levantamento da Ancine, das 2.583 obras audiovisuais registradas ano passado na agência apenas 17% foram dirigidas e 21% roteirizadas por mulheres.)

(E falando em feminismo, Big Little Lies passa no Bechdel Test.)

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Crítica de Cinema: A Bela e a Fera (2017)

No dia 16 de março, chega aos cinemas o live action de A Bela e a Fera, estrelado por Emma Watson, mas o Beco teve o privilégio de poder assistir antes e vai te contar tudo em primeira mão. Antes, vamos relembrar um pouquinho sobre a história.

A Bela e a Fera ou A Bela e o Monstro é um tradicional conto de fadas francês. Originalmente escrito por Gabrielle-Suzanne Barbot, Dama de Villeneuve, em 1740, tornou-se mais conhecido em sua versão de 1756, por Jeanne-Marie LePrince de Beaumont, que resumiu e modificou a obra de Villeneuve. Adaptado, filmado e encenado inúmeras vezes, o conto apresenta diversas versões diferentes do original que se adaptam a diferentes culturas e momentos sociais.

A versão mais conhecida de todos os tempos foi a animação em estilo musical feita pela Disney em 1991, que foi a primeira animação a ser indicada ao Oscar como melhor filme e consolidou a canção Beauty and the Beast. Nele, conta-se a história de uma moça chamada Bela, que vive em uma pequena vila no interior da França, junto com seu pai. Ao contrário das outras moças, Bela adora ler e sonha em conhecer o mundo, e seu pai é um inventor tido como alguém meio excêntrico para a época, o que os fazem ser mal vistos pelos outros moradores. Porém, uma coisa não se pode negar: o nome de Bela faz jus à sua beleza inigualável, o que chama a atenção de um dos moradores do lugar. Gaston, um típico francês interiorano da época, é rude, não vê a menor graça em um livro sem figuras e acha que lugar de mulher é na cozinha e cuidando dos filhos.

A ação começa quando o pai de Bela, Maurice, vai para outra cidade expor sua nova invenção em uma feira e se perde na floresta, indo parar em um castelo aparentemente abandonado. Neste castelo, vive uma besta feroz que, outrora, fora um belo príncipe, mas, ao rejeitar ajudar uma velha que lhe pediu abrigo em uma noite de tempestade, foi amaldiçoado. A ele foi entregue uma rosa mágica e, no dia em que cair a última pétala da rosa, ele se tornará uma fera para sempre, junto com todos os outros moradores do castelo que viraram utensílios domésticos. Mas claro que toda maldição tem um porém: se ele se apaixonar por uma moça que também o ame por quem verdadeiramente é, a maldição será quebrada.

Voltando ao pai de Bela, ele acaba no jardim do castelo e, lembrando que sua filha adora rosas, pega uma, achando que não tinha dono. Nesse momento, a Fera aparece e o prende por roubar uma rosa de seu jardim. Bela estranha o sumiço do pai e, indo procurá-lo, também acaba no castelo, onde faz um acordo com a fera para trocar de lugar com ele na prisão. Isso, claro, acende a esperança dos moradores do castelo que acreditam que ela pode ser a escolhida que vai acabar com aquela maldição e passam a fazer tudo para que seu príncipe se apaixone pela bela camponesa.

Nos últimos anos, vários contos de fadas tradicionais tiveram seus live actions com algumas mudanças de pontos de vista, como Malévola que mostra que, no fundo, a fada má não era tão má assim, ou A garota da capa vermelha, que conta uma história bem mais sombria sobre a Chapeuzinho Vermelho. Mas, como Cinderela, A Bela e a Fera não teve mudanças tão drásticas na história, a não ser sobre a menção da mãe da Bela. No filme, descobrimos de onde a Bela veio e o que aconteceu com sua mãe, isso nos ajuda a entender melhor por que ela é tão diferente. Cenas clássicas como o baile com o tão tradicional vestido amarelo e a linda música romântica cantada pelo bule de chá foram mantidas e me levaram de volta à infância. Algumas outras canções foram acrescentadas junto com números de dança belíssimos. Efeitos especiais também não faltam, levando ao clássico a modernidade de 2017.

Emma Watson dá um show e mostra que é uma atriz completa, cantando e dançando. Gaston, apesar de ser um personagem odioso (pelo menos, para mim), é muito importante para a trama e não poderiam ter escolhido um ator melhor. Na verdade, cada ator escolhido para o filme pareceu ser feito sob medida para o papel. Para quem ama a história assim como eu, vai ser um deleite rever Lumière fazendo o show da sala de jantar e o adorável Chip com suas bolhas de chá. O destaque vai para a Fera, a qual, durante o filme, não tem como dizer que não é real. As expressões da cara, a voz e aquele olhar aflito de quem está gritando dentro de si o tempo todo que está aprisionado nos leva a não prestar toda a nossa atenção só para a Bela, como acontece com a animação, mas a entender e sofrer com a dor que o príncipe sentiu durante tanto tempo.

Sou um pouco suspeita para dar uma crítica imparcial, pois Bela é a minha princesa/não princesa preferida e, ao contrário das outras que são salvas por seus príncipes e buscam um felizes para sempre em um casamento, ela quer mais. Bela é chamada de estranha por pensar diferente do que era tido como adequado para as mulheres da época. Bela é inteligente, esperta, intelectual e sonha em viver grandes aventuras e ir para todos os lugares que já leu nos livros. Bela salva o príncipe de uma maldição terrível e mostra que se apaixonar não é o fim da história, mas só o começo.

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Crítica de Cinema: Cinquenta Tons Mais Escuros

Já tínhamos falado aqui nossas expectativas para essa sequência, e agora viemos contar o que achamos de Cinquenta Tons Mais Escuros.

(Obs: os tópicos podem conter alguns spoilers para quem não viu o filme).

Primeiramente vamos falar da trilha sonora: que coisa ma-ra-vi-lho-sa foi essa? Ela é perfeita! De cara dá um outro aspecto ao filme. Já faz parte daquela playlist que vai ficar no repeat até enjoar!

Sobre o filme: O enredo é mais elaborado que o do primeiro filme, já no início vemos os resultados da nova direção. Os flashbacks foram bem colocados mostrando o passado de Christian, dando um ar melancólico na dose certa. Muito mais romance gira em torno desse filme, criando  cenas perfeitas com uma fotografia lindíssima (o que é aquela cena do veleiro gente?!). 

O amadurecimento dos personagens tornam o filme mais envolvente (tanto Dakota quanto Jamie estão mais bonitos e mais à vontade nesse filme), o que o torna mais real e convincente. A atuação da atriz principalmente, segue melhorando cada vez mais, o que acabou salvando uma Anastacia que tinha tudo para ser chata. A sintonia do casal melhorou bastante, o que ajudou bastante em todas as cenas quentes. Que aliás, foram muitas (e é disso que o povo gosta!). O toque de comédia em algumas partes  deu uma suavizada e boas risadas.

Para quem leu o livro e estava com as expectativas lá em cima, vai rolar um pouco de decepção. Algumas cenas fora mudadas, outras nem passaram perto do livro. O que é normal, já que essas adaptações  são feitas para dar um ar mais dinâmico ao filme.  A maioria das cenas excluídas não fizeram falta. Mas um personagem que fez  falta  foi o Dr. Flynn (psiquiatra de Grey),  em algumas partes da trama ele seria essencial. A resposta de Ana ao pedido de Christian (no chaveiro), simplesmente não teve o mesmo significado.

O enredo pecou pela falta de aprofundamento dos novos personagens, foi tudo muito rápido. O que traria um fator maior de suspense para o filme não foi tão bem trabalhado, ficou aquela sensação de “cadê aquele suspense todo? cadê o desespero?“. Todo mundo parece muito calmo e tudo foi resolvido rápido demais.

Resumidamente, Gostamos do filme, ele terminou com uma ar de “chega logo Cinquenta Tons de Liberdade!”. Está bem melhor do que o primeiro, vale à pena tirar suas próprias conclusões em relação à ele. E no final das contas, sempre há a versão estendida!

 

E você já assistiu? Conta pra gente o que achou!

Moonlight
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Crítica de Cinema: “Moonlight: Sob a Luz da Lua”

Moonlight: Sob a Luz da Lua é considerado um dos favoritos ao Oscar de melhor filme, ao lado de La La Land, além de concorrer em várias outras categorias. O roteiro e a direção são de Barry Jenkins, que fez um trabalho incrível a partir da peça In Moonlight Black Boys Look Blue, de Tarell Alvin McCraney.

O filme é dividido em três partes, cada uma referente a uma fase da vida de Chiron, um menino negro, de aproximadamente 9 anos de idade, que vive com a mãe na periferia de Miami. O garoto nos é apresentado durante uma fuga: sob os gritos de “pega esse viadinho”, ele corre apavorado, conseguindo se esconder em uma casa abandonada. É nessa casa que Little (como é conhecido na época) conhece Juan, um traficante local que o ajuda e, a partir dali, se torna parte de sua vida. Ao lado de Juan, Chiron vive belas cenas. Nem sempre felizes, mas muito significativas para a criança.

Já na segunda parte do filme nos deparamos com um Chiron adolescente, ainda mais retraído e magrelo. Encontramos novamente os garotos que costumavam persegui-lo e vemos agora a violência em relação à ele ainda mais radicalizada: o garoto é perseguido por conta das roupa que usa, por conta da mãe que tem e pelo fato de não transparecer os traços de virilidade típicos do adolescente heterossexual naquele contexto. Afinal, Chiron cresce ao lado de crianças que, como ele, se encontram em situação de abandono, descaso e violência e que se veem obrigadas a reproduzir estereótipos que garantam sua sobrevivência e inserção naquele ambiente. Acontece que nem todos reagem da mesma forma ou se sentem da mesma forma diante da mesma realidade material. Por não reproduzir esse estereótipo é que Chiron encontra ainda mais dificuldades para estabelecer vínculos ou encontrar um lugar onde se sinta acolhido.

O adolescente assiste à degradação da própria mãe, cada vez mais doente e incontrolável. Vive também sua primeira experiência sexual, em uma cena muito sensível e bem feita. E é também nessa fase que o jovem sofre um ataque violentíssimo, do qual sai bastante machucado. A soma de todas essas experiências fazem com que Chiron “finalmente” perca a cabeça. Aqui nos despedimos do adolescente enfurecido para encontrarmos Black.

A terceira e última parte do filme traz as consequência de uma infância e adolescência complicadas, construídas com base no medo, na dúvida e na violência. Chiron não parece o mesmo: é um homem forte, sério, com um belo carro e aparentemente temido e respeitado pelos que o cercam. Muito parecido com Juan, na verdade. Agora atendendo por Black – apelido que traz da adolescência, dando a entender que nem tudo fora deixado para trás -, vemos o jovem ser confrontado pelo passado, e vemos a quantas andam suas antigas relações.

Em Moonlight, palavras são poupadas. O diretor nos dá a oportunidade de preencher as lacunas sozinhos e ao respeitar o silêncio, estimula o público a abandonar a postura contemplativa comum diante da tela. O silêncio de Chiron é violento, e não vazio. Me arrisco a dizer ainda que caso essa violência fosse expressa de forma mais direta, por meio de diálogos, por exemplo, seria menor a qualidade artística e o impacto social do filme.

A história de Chiron, no fim das contas, é a história que todos os dias vemos nos jornais, seja no Brasil ou nos EUA. Dessa vez, no entanto, nos contaram a outra versão. Nesse sentido, o filme oferece a possibilidade de refletir quanto a muitos preconceitos, e ao optar por tratar de temas como a pobreza, a sexualidade, as drogas e o crime pela chave da subjetividade, pode fazer com que os mesmo “cidadãos de bem” defensores de máximas como “bandido bom é bandido morto”, se peguem enxergando o mundo através dos olhos daquele que costuma ser visto como inimigo.

Indicado ao Oscar de:

– Melhor Filme
– Melhor Direção
– Melhor Ator Coadjuvante (Mahershala Ali)
– Melhor Atriz Coadjuvante (Naomie Harris)
– Melhor Roteiro Adaptado
– Melhor Trilha Sonora
– Melhor Fotografia
– Melhor Montagem

 

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Crítica: Lemony Snicket – Desventuras em Série (2017)

Você não deveria ler essa crítica, ela com certeza vai te deixar profundamente abalado e perturbado para fugir, enquanto há tempo, das desventuras dos irmãos Baudelaire. 

Depois de muito alarde, finalmente estreou a nova série da Netflix “Lemony Snicket – Desventuras em Série” baseada na série de livros homônimo de Lemony Snicket, pseudônimo do autor Daniel Handler. Livros que viraram sucesso de vendas e que já tiveram seus pézinhos nos cinemas, com a adaptação estrelada por Jim Carrey em 2004.

Lembro-me muito bem quando fui assistir a adaptação do cinema e sai super satisfeito da sala, aguardando uma provável continuação, mas fui desiludido dias depois quando uma de minhas professoras colocou em pauta na sala de aula os livros e mostrou que o enredo do filme era uma teia de ganchos dos 13 livros da série. Fiquei decepcionado, pois esperava ver o que aconteceu com os irmãos Baudeleire. Me animei para ler os livros e fiquei encantado com a narrativa de Snicket e aguardei anos para testemunhar ela tomando vida no audivisual outra vez.

Acredito que não existe outro lugar que esse livro pudesse ter sido tão bem tratado para uma nova adaptação em forma de seriado, pois o entusiasmo colocado pela Netflix só na divulgação foi de encher os olhos. O anuncio de Neil Patrick Harris como o temido Conde Olaf foi o bastante para que a internet fosse a loucura e aguardasse com ansiedade a estreia.

Você percebeu que eu te enrolei até aqui? Estou te dando a chance de fechar essa aba e procurar algo melhor para fazer!

Já que insiste, vamos falar sobre o que te aguarda. A série narra a história dos irmãos Baudeleire, Violet Baudelaire, a mais velha, é uma inventora e tem quatorze anos; Klaus Baudelaire, o irmão do meio, é fascinado por bibliotecas, guarda em sua mente todas as suas leituras que faz e tem doze anos; e Sunny Baudelaire, a mais nova, uma menininha de três anos que tem uma língua que só os irmãos entendem e que ama morder qualquer tipo de objeto.

Os irmãos são muito ricos e moram em uma grande mansão com seus pais, certo dia, inexplicavelmente os pais pedem para que eles façam um passeio na praia em um dia tempestuoso e eles aproveitam para testar uma invenção de Violet, lá eles são abordados pelo Sr. Poe, testamenteiro dos pais das crianças que ama seu trabalho no banco, que acabava de sair da Mansão Baudeleire para procurar as crianças e contar que seus pais pereceram, nesse caso, perecer significa que eles haviam morrido e que a mansão estava incendiada.

Esse é o ponto de partida da série, divertidamente narrada por Lemony Snicket, na série interpretado por Patrick Warburton que deu ao personagem todo mistério e suspense que ele precisava para transcrever as desventuras que se iniciavam.

Os irmãos Baudelaire após uma noite não muito agradável com a família de Sr. Poe são encaminhadas para o seu tutor, o temido Conde Olaf, uma criatura que nenhum dos irmãos nunca tinha ouvido falar. O banqueiro conta que Olaf é um grande ator e possuí uma trupe teatral, fato que não anima as crianças. Chegando ao local eles se deparam com uma mansão caindo aos pedaços e são apresentados finalmente ao tutor Conde Olaf, vivido brilhantemente pelo Neil Patrick Harris, que entrega a esse personagem uma composição completa de voz, figurino, manias e jeitos que superaram minha expectativas.

Olaf só está interessado na fortuna herdada pelos irmãos Baudelaire, mas que só pode ser ativada quando Violet for maior de idade, nesse meio tempo, o tutor deverá cuidar das crianças por sua própria conta. Como na vida dos irmãos Baudelaire nada são rosas, assim que Sr. Poe sai da mansão eles conhecem todo horror que existe nesse caricato vilão que os obriga a fazer tarefas absurdas e trama um plano, no mínimo, desprezível para ficar com a fortuna o quanto antes.

Esse primeiro plano de Olaf foi gota que faltava para Sr. Poe levar as crianças para outro tutor e ver que ele só estava interessado na fortuna Baudelaire. O desenrolar da série basicamente é as crianças sendo seguidas a cada novo tutor que passam por personagens criados por Conde Olaf, onde ele trama um plano para ficar com a fortuna, desenvolvendo desventuras lamentáveis na vida das crianças, em paralelo com uma misteriosa organização secreta representada em forma de um olho, que é recorrente em vários lugares da série.

É inevitável fazer comparações com o filme e acredito que chegue até ser válido dizer que tudo fluí de maneira muito melhor quando detalhes são contados e uma ordem é seguida. No filme existem semelhanças interessantes com o começo da série, um exemplo é na parte que o Sr. Poe conta as crianças sobre a morte dos pais. É interessante ver que os irmãos de ambas as versões se parecem muito, mas dou minha total preferência para os atores do seriado, tenho a impressão que souberam desenvolver mais o personagem e lembram os irmãos que encontramos no livro. além disso, Conde Olaf que não deixa de ser brilhante em ambas versões tem em sua interpretação no filme o grande ator Jim Carrey que naturalmente tem o seu estilo um pouco mais escrachado e que podemos chamar “dele”, diferente do Neil Patrick Harris que combina mais com as características de Olaf e criou durante a série tão bem os outros personagens que o temido vilão interpreta para ficar com a fortuna.

Provei para você, não assista a série, você vai ficar viciado e assistir os oito capítulos que compõe a primeira temporada em uma tacada só. Já está abrindo o Netflix? Não diga que não avisei!

 

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Crítica de cinema: “La La Land: Cantando Estações”

Damien Chazelle é um cara corajoso. Depois do brilhante Whiplash: Em Busca de Um Sonho (2014), o jovem diretor arrisca e investe num gênero decadente – o musical. Aliás, é nessa ousadia que reside parte da magia de La La Land: Cantando Estações, um musical que homenageia o cinema e os musicais da Era de Ouro em Hollywood.

Logo nos primeiros minutos o clima de nostalgia toma conta. A complexa e belíssima sequência de abertura, em meio ao caos do trânsito de Los Angeles, insere o espectador num mundo de música e cores vibrantes. É no meio do congestionamento, da fria vida urbana, que os sonhos resistem, enquanto os sonhadores lutam bravamente para torná-los realidade.

Em meio aos sonhadores conhecemos Mia (Emma Stone), uma aspirante a atriz que trabalha num café dentro de um grande estúdio de cinema. Apesar de talentosa, Mia não consegue ser aprovada em nenhuma das inúmeras audições que participa. Nos encontros e desencontros do destino, ela conhece Sebastian (Ryan Gosling), um pianista apaixonado por jazz, que sonha em abrir um bar para resgatar a antiga glória do gênero musical que tanto ama. Juntos, eles precisam encontrar o equilíbrio entre amor, realidade e sonho, numa jornada de crescimento e amadurecimento.

Emma Stone e Ryan Gosling cantam, dançam e emocionam. A química perfeita entre eles resulta num dos casais mais marcantes do cinema. Além disso, Gosling também aprendeu a tocar piano para compor seu personagem. Mas Emma Stone consegue se destacar ainda mais, esbanjando emoção e carisma toda vez que a sua personagem está em cena. O filme só confirma os dois atores entre os melhores dessa nova safra de estrelas que vêm surgindo nos últimos anos.

Fundamentado no clichê “homem encontra mulher”, o filme pode até parecer ingênuo e simples. Mas Chazelle pode ser tudo, menos ingênuo. Visionário e calculista, o roteirista e diretor faz uso de todos os elementos técnicos para contar sua história. Direção de arte, fotografia e figurinos remetem diretamente às décadas de 1950/60. Não fosse por um toque de celular aqui e acolá, o espectador facilmente acreditaria estar vendo uma produção de época.

A trilha sonora casa perfeitamente com o filme, o que é fundamental num musical. As músicas instrumentais pontuam bem as emoções retratadas, sem apelar pra melancolia. As canções não são cansativas e nem estão ali simplesmente por alegoria. Pelo contrário, são contagiantes e fazem parte da narrativa.

Repleto de referências sutis aos clássicos do cinema, em falas, cenários e ações, o musical não é simplesmente uma homenagem. É também o retrato do jovem artista que corre atrás do reconhecimento por seu trabalho. Um caminho de muitas dificuldades e desilusões, que na maioria dos casos acaba em frustração, com a morte do sonho. Aliás, essa é a principal reflexão levantada pelo filme. O que somos capazes de fazer para alcançar os nossos sonhos?

Um presente fino em meio a tanta pirotecnia das produções mais recentes do cinema, La La Land: Cantando Estações chega como um refresco. E também como uma aula de história. A reinvenção de um gênero, outrora muito bem-sucedido, e hoje desprezado pela indústria cinematográfica.

Críticas de Cinema, Filmes

Crítica de Cinema: “Passageiros” (2017)

ATENÇÃO: Contém alguns Spoilers que achei necessários para expressar minha opinião sobre o filme!

Passageiros (Passangers) estreou no Brasil nesse dia 05 e chegou carregado de expectativas já que tem em seu elenco ninguém mais ninguém menos do que a queridinha de Hollywood Jennifer Lawrence e o galã Chris Pratt. Dirigido pelo norueguês Morten Tyldum, o filme se passa no futuro, onde a Terra é o centro da civilização com vários planetas colônias. Há uma empresa especializada em viagens interplanetárias que transporta as pessoas para as colônias, que vão em busca de mais espaço, mais qualidade de vida, um recomeço.

A história começa quando 5 mil pessoas estão indo para um planeta colônia e devem ficar em estado de hibernação durante 120 anos. Uma chuva de meteoros causa uma pane na nave e faz um passageiro acordar 90 anos antes da hora, Jim Preston (Chris Pratt). Ele passa 1 ano tentando voltar a dormir: estuda todo o funcionamento das cabines de hibernação, tenta falar com alguém da Terra e até tenta acordar alguém da tripulação, mas nada funciona. Enlouquecido e embriagado, depois de pensar em se soltar no espaço e morrer, Jim esbarra na cabine de Aurora Lane (Jennifer Lawrence), que vira sua obsessão.

Aurora é uma escritora que, para escrever a maior história de todas, se aventura nessa viagem para passar 1 ano na colônia e voltar para a Terra e conquistar muitos leitores. Preston pesquisa tudo sobre ela, assiste seus vídeos diariamente, lê todos os seus livros e se convence que está apaixonado por ela. Aí entra o dilema do filme: ele deve acordá-la ou não? Depois de muito deliberar consigo mesmo e com o robô barman, sua única companhia na nave, Jim decide por acordá-la, mas é claro que ele não conta para ela, deixando que acredite que seu despertar antes da hora foi um erro como o dele.

Passageiros tenta juntar vários gêneros em um só filme: romance, suspense, ação, ficção científica e até um pouquinho de terror, pois, quando ela descobre a verdade, se vê presa em uma nave até sua morte com seu próprio assassino. O problema é que, com tantos gêneros juntos, nenhum lado da história se mostra forte o bastante para prender a atenção e convencer o expectador.

Depois que Aurora descobre a verdade e se afasta de Jim, eles descobrem que a nave está com problemas mais sérios do que pensavam e se juntam para consertar as coisas e salvar a vida dos outros passageiros que, ao contrário deles, ainda têm chance de chegar até a colônia e realizar seus sonhos de uma nova vida. Como mágica, isso faz com que eles se aproximem novamente até o ponto em que, mesmo podendo voltar a dormir depois que tudo foi resolvido, Aurora escolhe ficar com Jim porque o ama.

Nessa parte, eu cheguei a um impasse muito grande: ele tinha direito de acordar Aurora e condená-la ao mesmo destino que o dele? E, assim sendo, é verossímil que ela o perdoe e abra mão de uma vida toda de realizações tão sonhadas? Alguns vão defendê-lo e dizer que ele estava desesperado e que qualquer um faria a mesma coisa e eu não sou ninguém para julgar o desespero do outro, mas o jeito que foi colocado no filme ficou muito superficial e não convenceu. A própria Aurora diz que ele é um assassino, que tirou a vida dela sem consentimento e, no fim, declara amor eterno.

Li várias críticas que dizem que o filme traz em sua essência a “cultura do estupro”, onde coloca a mulher como o ser inferior que deve aceitar a vontade do homem e sempre perdoá-lo, pois ele é homem e é assim mesmo. Eu não levaria a esse extremo, mas Passageiros tenta nos fazer engolir um romance água com açúcar onde a mocinha vê no homem seu cavaleiro no cavalo branco que tem todas as atitudes justificadas, salva o dia e se redime no final.

Da mesma forma, as cenas de ação tiveram muitos efeitos especiais, mas poucas coisas para serem feitas. A ficção científica que poderia ter sido mais explorada terminou só como um pano de fundo e ficou claro que o romance era o foco das atenções, mas, para um filme com a tão aclamada Jennifer Lawrence, Passageiros merece, no máximo, um horário na Tela Quente da Globo.