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Mulheres apagadas da História: Você conhece?

Inspirada pelo filme “Estrelas além do tempo”, comecei a pensar por que eu nunca havia ouvido falar dessa história. Para quem não sabe sobre o filme, ele fala sobre três mulheres negras matemáticas que ajudam a NASA a vencer uma corrida espacial, fornecendo cálculos para o lançamento do astronauta John Glenn e seus colegas ao espaço. Com isso, eu parei para pensar: Quantas histórias mais de mulheres fortes tentaram apagar de nós?

Janelle Monáe, Taraji P. Henson e Octavia Spencer

É o caso de Maria Quitéria, a primeira mulher a lutar no exército brasileiro, em 1822, e que precisou se vestir de homem para isso. Conhecida como “Joana D’Arc brasileira”, ela desafiou o pai e o então noivo para lutar pela independência do país e foi condecorada como cavaleiro imperial por D. Pedro II.

“Querendo conceder a D. Maria Quitéria de Jesus o distintivo que assinala os Serviços Militares que com denodo raro, entre as mais do seu sexo, prestara à Causa da Independência deste Império, na porfiosa restauração da Capital da Bahia, hei de permitir-lhe o uso da insígnia de Cavaleiro da Ordem Imperial do Cruzeiro.” D. Pedro II no pronunciamento oficial da condecoração de Maria Quitéria.

D. Maria Quitéria de Jesus

Na história mundial, temos Stephanie Kwolek, cientista americana que seguiu o ramo da ciência incentivada pela mãe e inventou o Kevlar, uma fibra de alta resistência usada em coletes à prova de balas. A Hendy Lamarr, atriz austríaca que dividiu os papéis em Hollywood com a invenção da tecnologia sem-fio que, durante a Segunda Guerra Mundial, permitiu o envio de mísseis à distância, mas também, foi a precursora da tecnologia celular, do Wi-Fi e do Bluetooth.

Você sabia que quem assinou o Decreto da Independência do Brasil foi uma mulher? Em 2 de setembro de 1822, Leopoldina, nomeada princesa regente interina do Brasil por D. Pedro I, assinou o Decreto da Independência, ao receber notícias de que Portugal estava preparando uma ação contra o Brasil.

Maria Leopoldina

Maria Felipa de Oliveira foi uma mulher negra e pobre que, em 1823, liderou 40 mulheres para seduzirem a maioria dos soldados e comandantes das 42 embarcações que se preparavam para invadir Salvador durante a luta pela independência brasileira. Enquanto os homens estavam nus, elas lhes deram uma surra de cansanção (planta que dá uma terrível sensação de ardor e queimadura na pele), para depois incendiar todas as embarcações. Essa ação foi decisiva para a vitória sobre os portugueses em Salvador, permitindo que as tropas vindas do Recôncavo entrassem sob os aplausos do povo, no dia 2 de julho de 1823.

Aracy de Carvalho Guimarães Rosa nasceu no Paraná, em 1908. Em meados de 1930, se mudou para a Alemanha, onde Hitler já estava no poder. Fluente em alemão, francês e inglês, conseguiu trabalhar no setor de vistos no consulado brasileiro e ajudou, clandestinamente, na fulga de dezenas de judeus para o Brasil. Chegou a usar o carro do serviço consular para transportar judeus que escondia em sua casa, usando de sua imunidade diplomática para transportar na própria bolsa o dinheiro e as jóias para que não fossem confiscados pelos nazistas. Chamada de “Anjo de Hamburgo”, Aracy é a única mulher citada no Museu do Holocausto, em Israel, entre os 18 diplomatas que salvaram judeus da morte. Em 1982, ela foi reconhecida como “Justa entre as Nações”, um título dado pelo governo israelense a pessoas que correram riscos para ajudar judeus perseguidos.

Aracy de Carvalho Guimarães Rosa

A baiana Leolinda Daltro é precursora do feminismo no Brasil no século 19. Engajada na causa indigenista, separou-se do marido e viajou pelo interior do Brasil pregando a integração das populações indígenas por meio da educação laica. Foi escorraçada de Uberada, em Minas Gerais, aos gritos de “mulher do diabo”. Quando teve seu alistamento eleitoral negado, fundou o Partido Republicano Feminino. O objetivo era mobilizar as mulheres pelo direito ao voto. Morreu em um acidente automobilístico em 1935. Seu obituário publicado na revista ‘Mulher’, editada pela Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, assinala que Leolinda “teve que lutar contra a pior das armas de que se serviam os adversários da mulher: o ridículo”.

“Rainha Teresa”, como ficou conhecida em seu tempo, Teresa de Benguela viveu no início do século XVIII no Vale do Guaporé, no Mato Grosso. Ela liderou o Quilombo de Quariterê e sua liderança se destacou com a criação de uma espécie de Parlamento e de um sistema de defesa. Ali, era cultivado o algodão, que servia posteriormente para a produção de tecidos. Havia também plantações de milho, feijão, mandioca, banana, entre outros. Segundo documentos da época, o lugar abrigava mais de 100 pessoas, com aproximadamente 79 negros e 30 índios.

Teresa de Benguela

Todos conhecem o grande Zumbi dos Palmares, mas e a Dandara? Mulher de Zumbi, Dandara lutou com armas pela libertação de negros e negras e contra a invasão holandesa em Pernambuco, por volta de 1630. Ao ser capturada, Dandara recusou-se a ser presa e se tornar escrava novamente e atirou-se de um penhasco. Passou muitos anos apagada pela sombra do marido, mas recentemente passou a ser celebrada, principalmente pelo movimento feminista negro.

“Se a Terra gira em círculos em torno do Sol, por que o Sol se aproxima e se afasta da Terra, gerando as quatro estações do ano?” Pergunta simples para a gente hoje, mas uma das questões mais polêmicas discutidas em meados de 400 d.C. Foi nessa época que viveu Hypatia, a primeira filosofa, matemática e astrônoma que se tem notícias. Num universo totalmente masculino, Hypatia ensinou no Museu de Alexandria e tornou-se chefe da Escola Neoplatônica. Foi a primeira mulher a fazer uma contribuição substancial para a matemática, especialmente ao criar soluções sobre as propriedades das formas geométricas e suas relações.

Hypatia desenvolveu instrumentos usados até hoje da Física e na Química, como o hidrômetro, instrumento usado para a determinação do peso específico dos líquidos, e o astrolábio plano, dispositivo usado não apenas na astronomia, mas também para fazer cálculos de navegação. O que se sabe atualmente sobre as ideias de Hypatia estão em relatórios e obras de seus contemporâneos e em cartas que ela trocava com seus alunos. Conhecida entre os gregos como “A Filosofa”, escreveram sobre ela:

“Havia em Alexandria uma mulher chamada Hypatia, filha do filósofo Theon, que fez tantas realizações em literatura e ciência que ultrapassou todos os filósofos de seu tempo. Tendo evoluído na escola de Platão e Plotino, ela explicava os princípios da filosofia a quem a ouvisse, e muitos vinham de longe para receber seus ensinamentos.”

Hypatia

Hypatia viveu num período muito conturbado para Alexandria, pois, neste período, o cristianismo crescia e diversos grupos de fanáticos cristãos desejam o domínio sobre as outras religiões. Pagãos eram forçados a se converter ao cristianismo, judeus eram expulsos da cidade, e Hypatia, recusando-se a converter-se, foi envolvida em boatos políticos e acusada de herege, uma “bruxa pagã”. Seu interesse em comprovar que a Terra girava em torno do Sol, sua vida livre e a sua convivência com grupos intelectuais (apenas permitido aos homens), serviram de argumentos para a sua acusação. Hypatia foi assassinada por religiosos fanáticos quando tinha, aproximadamente, 60 anos.

Vítimas de uma cultura machista e patriarcal, essas são só algumas das mulheres que tiveram seu nome riscado da História. Se eu fosse contar a história de cada uma que eu achei, levaria dias escrevendo, mas eu percebi uma coisa boa: eu consegui achar a história delas. Ou seja, as coisas estão mudando, muito lentamente, mas estão. Vários movimentos têm se levantado em defesa da participação da mulher em todos os âmbitos da sociedade e, inclusive, ressuscitando cada uma dessas histórias, exaltando a participação da mulher e lhe dando o reconhecimento roubado por tanto tempo.

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