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Crítica de Cinema: Spotlight – Segredos Revelados

Em tempos de mídias golpistas e parciais, que fazem de tudo por uma boa história, que aliás, nem precisa ser boa, ou mesmo verídica, mas precisa render. Spotlight traz uma visão do que o jornalismo realmente deveria ser: ético, justo, que expõe ao público informações verdadeiras, crimes que ficaram impunes e que não tenta manipular o leitor. O jornalismo que trabalha para o bem da sociedade.

“Spotlight” é a equipe de investigação do Jornal “The Boston Globe”, formada por Michael Rezendes (Mark Ruffalo), Sasha Pfeiffer (Rachel McAdams), Matty Carroll (Brian D´Arcy James) e chefiada por Walter Robinson (Michael Keaton). A equipe descobre casos isolados de padres da Igreja Católica da arquidiocese de Boston que abusaram sexualmente de crianças e, como esses casos, mesmo sendo de conhecimento de vários líderes religiosos e de outros setores da sociedade, foram encobertos e permaneceram impunes por um longo tempo.

Eles resolvem então, fazer uma investigação a fundo, entrevistam adultos que foram abusados por padres quando eram crianças, advogados e o próprio cardeal. Acabam se deparando com uma realidade grotesca e repugnante, casos de pedofilia são muito mais numerosos do que eles podiam imaginar, é um problema enorme dentro da Igreja Católica, que com seu poder gigantesco, conseguiu abafar os escândalos. Em momento algum o filme critica a religião católica, mas sim, a instituição, que como toda instituição formada por homens, é falha.

Os jornalistas conforme prosseguiam em suas investigações, viram que os padres, geralmente abusavam de crianças de classes mais baixas, em situação de grande vulnerabilidade, cativavam-nas e depois as abusavam, roubando a infância delas, a dignidade e a fé. A Igreja, quando tinha ciência dos casos, fazia de tudo para acobertar os criminosos, mudando eles de paróquia, diocese ou simplesmente, afastando-os por “problemas de saúde”.

A história de “Spotlight – Segredos revelados” é baseada em fatos reais. Boston tem uma das maiores comunidades católicas dos Estados Unidos, mais de 70 padres foram acusados de pedofilia, tornando o escândalo mundial e trazendo muita dor de cabeça ao Vaticano. É comovente ver como os jornalistas se envolveram pessoalmente com o caso, principalmente Mike Rezendes, interpretado brilhantemente por Mark Ruffalo, sendo ele português, tem uma relação mais forte com o catolicismo, então fica extremamente decepcionado e horrorizado com o que descobre.

Tom McCarthy, o diretor do longa, coloca-nos dentro da redação do jornal, é possível ver como as coisas funcionam lá e como os repórteres vão a campo atrás de informações e documentos. A Igreja possui um esquema obscuro, dificulta burocraticamente o acesso a documentos com informações ruins sobre seus sacerdotes, faz um jogo sujo e vai contra os dogmas dela mesma.

O filme prende nossa atenção do começo ao fim, ficamos motivados em saber mais e mais sobre a história. O que também achei interessante foi como cada jornalista da equipe foi afetado com o caso, Matty, por exemplo, fica assustado ao saber que um dos pedófilos é seu vizinho e alerta aos seus filhos evitar passar perto da casa do padre. Sasha, que costumava ir a igreja com sua avó, não consegue mais ir, não consegue esquecer das entrevistas emocionadas que fez com as vítimas. Cada um deles sabe a enorme responsabilidade que eles têm de trazer a verdade a tona.

A atuação de todos é muito boa, segura e precisa. Mas quem se destacou foi, sem dúvida, Mark Ruffalo. Ele incorporou o jornalista de uma tal maneira que nos faz esquecer que é apenas um filme. Trouxe toda a paixão que Mike tem por sua profissão e em fazer o bem para os outros. Todos os personagens são trabalhados de forma bastante realista e fiel à história verdadeira. O filme se concentrou na vida dos personagens enquanto profissionais, não sabemos muito do lado pessoal de cada um.

Spotlight tem um ritmo lento e rápido ao mesmo tempo, lento pois não possui clímax, momentos dramáticos, nesse sentido o filme é bastante morno e, rápido, pois é fácil ficar perdido em meio a tantas informações e descobertas, é necessário estar atento a tudo o que eles falam.

O diretor inseriu em diversas cenas uma monumental Igreja no plano de fundo e à frente uma escola ou parquinho, onde seria um lugar de acolhimento e amor, passa a ser assustador e opressor. O interior da igreja também é caracterizado de forma em que ficasse um clima pesado. Boston é sempre mostrada de maneira fria e escura.

O ambiente do “The Boston Globe” é claro, limpo e usa tonalidades de branco e cinza, trazendo um aspecto higiênico e frio. A sala de Spotlight tem um acesso mais difícil dentro do prédio do Jornal,fica “escondida”, reclusa, afastada de todo resto, podemos entender isso como uma referência aos segredos que essa sala guarda.

A trilha sonora é muitas vezes melancólica, aumenta a tensão e a dramaticidade de certos momentos. Para mim, foi muito bem pensada a cena em que a matéria, finalmente, está sendo escrita e ao fundo temos crianças de um coral da igreja cantando “Noite Feliz”, o que seria algo bonito e puro, enche-nos de horror ao pensar o que poderia ter acontecido com uma dessas crianças dentro da própria instituição religiosa.

Spotlight mostrou de forma realista, que a sociedade se cala diante de crimes sexuais e, principalmente, quando quem sofre vem de uma classe mais baixa. É mais fácil ignorar a dor e os traumas alheios. Fingir que esses abusos não acontecem dentro da própria Igreja Católica foi a opção de muitos e o filme deixa isso bastante claro.

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