Atualmente, a forte presença das tecnologias avançadas em nossa sociedade fomentou em muitas pessoas o medo de terem seus trabalhos substituídos pela Inteligência Artificial ou robôs, cenário que parece cada dia mais próximo de se tornar realidade. Recentemente, o assunto voltou à discussão quando a Câmara Brasileira do Livro, organizadora do Prêmio Jabuti, decidiu desclassificar “Frankenstein”, editado pelo Clube de Literatura Clássica, da disputa pelo prêmio de Melhor Ilustração do ano.
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O tema da obsolescência humana foi uma das inspirações para o carioca Peter LaRubia (@peter_larubia) a escrever “10 reais e 01 maço de cigarros” (352 pág.), publicado pela Editora Patuá. O livro será lançado no dia 25 de novembro, às 11h, na 21ª edição da Flip, dentro da programação da Casa Gueto, que se localiza na Rua Benedito Telmo Coupê 277, Centro Histórico de Paraty.
No livro, o inseguro ghost writer, Zé García, sonha em ser um escritor reconhecido. É ele quem escreve a maior parte da cultuada série de livros do recluso Toni Brandão, mas é Toni quem leva o lucro e a fama. Quando Robôs tornam obsoleto o seu trabalho e ele se vê jogado na sarjeta, Zé decide matar e roubar a identidade de Toni. Com o pano de fundo da obsolescência humana perante o avanço da tecnologia, o livro traz uma tragédia sarcástica sobre o drama contemporâneo da solidão como saída para relações interpessoais cada vez mais irrelevantes.
Totalmente Livre de Robôs/Escrito por Humano
“Em maio de 2021 uma cena me atravessou a mente: Num futuro muito próximo um homem entra numa livraria, pega um livro, na capa do livro há um selo de qualidade, como esses do tipo “Livre de glúten”, que vemos em embalagens de alimentos, no selo está escrito: Totalmente Livre de Robôs/Escrito por Humano”. Foi a partir dessa cena que construí toda a história”, relata o autor.
E foi com essa semente de medo e fascínio diante da possibilidade da Inteligência Artificial substituir o humano na criação artística que Peter desenvolveu a trama. “Mas tive uma surpresa ao chegar no desenlace do enredo e descobrir que, no fim das contas, eu não estava contando uma história sobre o humano contra a máquina, estava contando uma história sobre o conflito do ser humano com os outros humanos, e que, ao tentar evitar esse conflito, tudo o que conseguimos por companhia são fantasmas, sejam eles digitais ou espirituais”, conclui.
Para “10 reais e 01 maço de cigarros”, suas principais inspirações literárias foram as obras “Androides sonham com ovelhas elétricas”, de Philip K. Dick; “O natimorto”, de Lourenço Mutarelli; “Borges e os orangotangos eternos”, de Luís Fernando Veríssimo; “Angústia”, de Graciliano Ramos e “O estrangeiro” , de Albert Camus.
Como um escritor reagiria ao ser substituído por um robô?
Peter nasceu em Campo Grande, subúrbio do Rio de Janeiro. Também é autor dos romances “Terra do Nunca” (Editora Multifoco, 2013) e “F.Ú.R.I.A. Cyberpunk” (Editora Luva, 2019). Formado em Psicologia e em Letras, já integrou as bandas de rock Nabuco on the Roxy e Barbarella Inc.
Começou a escrever seriamente depois do término de sua segunda banda, em meados de 2010. Para preencher o vazio criativo com o fim do sonho de se tornar um rockstar, passou a frequentar oficinas literárias e a ler todo e qualquer livro sobre escrita criativa e storytelling que tomava conhecimento.
A inspiração para o livro veio quando estava refletindo sobre o avanço das tecnologias na atualidade e como esse cenário tem afetado nosso comportamento como sociedade e em nossas relações interpessoais.
“Me fascina a questão: se uma máquina pudesse escrever um romance, poderia ser considerada tão humana quanto eu? E mais do que isso: como uma personalidade ressentida e vingativa, adjetivos não muito raros num escritor, reagiria ao ser substituído por um robô?”, reflete.
Confira um trecho de “10 reais e 01 maço de cigarros”
“Se ninguém leu meu livro, ele existe? Mas vejam bem, não é verdade que ninguém leu, eu li. Eu sou alguém. Mas isso vale ou é trapacear no jogo? Um romance escondido na gaveta da escrivaninha ou em subpastas do computador ainda é um romance? Se você disser que sim, eu posso alegar que aquele livro todinho elaborado em minha mente e guardado no fundo da minha cabeça redonda também é um livro? Se eu continuar eternamente com medo de que ninguém leia meu livro e isso me paralise de modo que eu nunca efetivamente o escreva, pelo menos serei poupado de terminá-lo e efetivamente ninguém o ler. A consciência antecipada de ser um fracasso te poupa da descoberta por parte dos outros de que você efetivamente é um fracasso. São essas relações escravizantes com o outro que me perturbam cada dia mais, de modo que eu venha a preferir uma sutil dormência a qualquer tipo de prazer, surpresa ou agitação. O inferno são os outros.”
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