não deveria ser eu a pessoa que te parabeniza primeiro, mas, meus parabéns.
essa foi a frase que minha terapeuta me disse hoje depois que eu contei as boas novas pra ela. eu já nem queria mais parabéns.
não dela, pelo menos.
leia ouvindo: my tears ricochet, taylor swift
são valiosos, claro, que são. mas só não valem de nada. eu sei. ela sabe. ela só falou para que eu percebesse.
eu já pensei mil vezes em colocar essas boas novas pra baixo do tapete e fingir que nunca aconteceu. talvez eu faça.
não, não é isso que ela queria que eu tivesse percepção.
talvez eu faça porque, por mais que seja poético dizer que toda vez que a tinta pinga no papel, eu vejo a torre ruir, é igualmente doloroso sentir a descarga elétrica que cai dos céus sem avisar. e eu estou cansado disso. estou cansado de me sentir assim.
toda.
santa.
vez.
como boa terapeuta, ela sabe o que essa intervenção, cirúrgica, faria dentro de mim. não era sobre os parabéns. eram sobre as expectativas criadas.
eu sei, você pode pensar que as expectativas são minhas para criar e alimentar, como parasitas. e foi isso que eu disse à ela.
ela parou de responder.
mas antes de desligar na minha cara, ela soltou, casualmente: se você não puder esperar reconhecimento de quem está ao seu lado, é porque talvez você esteja sozinho enxergando alguém que não está de fato do seu lado.
e você sabe como, casualmente, você cria sentimentos bons em buracos que são totalmente secos e ocos.
é casualmente que nossos olhos abrem, que a gente acorda caindo da nuvem mais alta. é casualmente, em um jantar de sexta que a pessoa que você mais amou na sua vida vai te dizer que não te ama mais e que agora vocês precisam partilhar os bens.
dividir meio a meio a mesa pela qual vocês tiveram que economizar por meses para pagar e deu uma cara nova para a casa que vocês sempre quiseram criar.
a geladeira vai pra um lado. o fogão vai pro outro.
com quem fica a máquina de lavar? e o colchão?
você se sente conduzindo uma autópsia. é preciso examinar o que aconteceu, entender de onde veio, para onde vai… tudo isso em cima de um cadáver que já vinha cheirando mal há alguns meses mas que a gente insistia em achar que era só jogar um perfume que ia resolver.
ele continua cheirando mal.
putrefeito.
eu tentei ligar de volta pra minha terapeuta. ela não atendeu. eu também não atenderia. ela quer que eu crie mais segurança sobre mim.
como eu posso criar mais segurança sobre mim se parece que você foi enviado por alguém que me queria morto, sr. homem-bomba?
como?
você explodiu. eu queria explodir.
devo agradecer pela colisão?
de fato, esse arcano da torre que sai agora nesse jogo do nosso relacionamento diz tudo o que talvez ela gostaria de dizer mas não pode: tudo o que a gente ignora e não constrói sobre bases sólidas, rui com os efeitos das intempéries.
está ruindo. ruiu.
e eu estou arruinando mais uma vez essa energia que faz minhas artérias vibrarem.
Sinopse: Estreia em livro de Ryane Leão, criadora da página onde jazz meu coração, com mais de 150 mil seguidores nas redes Livro de estreia de Ryane Leão, mulher negra, poeta e professora, criadora do projeto onde jazz meu coração, com mais de 150 mil seguidores nas redes. ‘a poesia é minha chance de ser eu mesma diante de um mundo que tanto me silencia. é minha vez de ser crua. minha arma de combate. nossa voz ecoada. nossa dor transformada. nela eu falo sobre amor, desapego, rotina, as cidades que nos atravessam, os socos no estômago que a vida dá, o coração desenfreado, a pulsação que guia as estradas, os recomeços, os dias, as noites, as madrugadas, os fins, os jeitos que a gente dá, as transições, os discos, os tropeços, as partidas, as contrapartidas, os pés firmes que insistem em voar, e tudo isso que é maluco e lindo e nos faz ser quem somos.’
Tudo nela brilha e queima retrata por meio de poemas temas sobre o universo feminino, ressaltando os amores, sabores, encontros, desencontros e relações abusivas. Um livro de empoderamento, cada verso toca de maneira intensa e você não sairá ileso a nenhum deles, isso torna a leitura um pouco pesada, mas necessária.
“só há revolução
quando há amor
por nós mesmas”
Apesar disso, o livro é sem complexidade de entendimento, são frases e pequenos textos que você devora em poucas horas. Quando começa, dificilmente conseguirá parar!
Estava para lê-lo há tempos. Primeiro porque amo poemas, inclusive foi através desse gênero que me apaixonei pelo universo literário. Segundo porque sou fã da escritora, Ryane Leão, uma mulher forte e admirável que escreve para fortalecer e empoderar outras mulheres. Além da questão da representatividade negra, alguns dos seus escritos abordam a força da mulher negra.
“você até sugeriu que eu usasse
um prendedor de roupas no rosto
ou que eu guardasse dinheiro pras plásticas que apagariam todos os meus traços de mulher negra
uma lembrança tão agressiva
que me apavora
e tem gente que me pergunta se foi fácil romper silêncios”
É um livro incrível, de uma escritora incrível. Eu super recomendo para aqueles que gostam e aos que não se aventuraram ainda com o gênero. Para aqueles que não tem muita afinidade, convido a começar por Tudo nela brilha e queima , se encantar e querer mais.
Vou terminar com um dos meus poemas favoritos, mostra a força feminina. Ser forte nunca foi uma opção, nascemos assim e vamos descobrindo a intensidade ao longo da nossa jornada.
“olhe todas as que vieram
antes de nós
não há segredo
a potência de ser mulher
atravessa suas veias
nada acontece como se espera. as coisas vem quando não se precisa mais pra te voltar a órbita. já nasci fora dela, meu bem. nada pode me colocar de volta.
não sou planeta anão, sou supernova, gigante vermelha. anã branca não mais. estar só não é viver em vão e isso me fez sentido só agora, no terceiro de sua sequência. o mundo não possui solução. tanta gente aí sem amor pra dar, tanta gente aí sem brilho nos olhos. hoje é minha independência, e calhou de ser xará de data com os estados unidos. meu lugar nunca foi aqui mesmo.
você chegou atrasado. chegou antes quando o tempo não era seu, atrasado quando era. na verdade, acho que nunca foi. eu me sentia a hannah, eu me sentia o charlie. eu me sentia especial. especialidades mudam, assim como os gostos. você me fazia sentir especial, agora qualquer um faz. eu entendi quem eu sou. entendi como devo ser.
vim escrever imediatamente depois do calote. fiz o mesmo caminho de três atrás e cai em mim. engraçado porque faço esse caminho todos os dias. não ouço mais taylor swift nele, talvez por isso tenha parecido tão diferente hoje quando percebi que era o mesmo. quando percebi que eu era o mesmo.
e eu percebi que te amava porque me amava. sim. eu te amava tanto que via meu amor em você, quando você não tinha um pingo de amor próprio no meio dos seus pensamentos autodestrutivos. eu sempre me amei. sempre amei o amor. mas ele estava refletido em você, ora. é mais fácil olhar para os outros que para o próprio umbigo, não é? então. esse foi o caso.
engraçado porque eu te amei tanto, até nas vezes em que eu não deveria. até nas vezes em que eu não te amava mais. até nas vezes em que eu estava no escanteio quando não deveria estar. mas hoje fiz morada nele. na verdade, fiz morada nele e me mudei. deixei a casa mais bonita para o próximo inquilino. inquilino porque sou meteoro e você planeta. milhões de anos para tirar minha marca da sua superfície.
e me mudei.
me mudei como alguém que é assaltado na casa térrea e compra uma cobertura sem financiamento, mesmo pagando o financiamento da casa. me mudei pra uma cobertura com visão ampla. eu consigo ver o céu. eu consigo ouvir os pássaros.
eu estava lendo aquele livro, textos cruéis demais para serem lidos rapidamente e nele vi que quando um braço quebra, ele pode voltar a ser o mesmo. mas não aguenta tanto quanto aguentava antes. meu braço aguentou.
aliás, não só ele, mas o todo eu. todo eu quebrado que já foi remendado e segurou o peso de nós mais uma vez. segurou o peso da insistência.
estar só não é viver em vão.
parte dois da parte três – diga não aos canudos. por mim. pelas tartarugas.
leia ouvindo: aqui, jão
não dança pra mim não. você é bom demais se articulando na vida. já era. o meteoro já caiu, mas eu era o forte e você o frágil. claro que nunca fui forte, mas agora sou.
e quem a gente vai culpar se o erro não é claro?
insano. pra mim sempre foi claro. o erro foi meu, assumo. mas não assumo o que não fiz e você me acusou sem fundada suspeita. meu advogado disse que se um dia tomasse enquadro, era pra perguntar a fundada suspeita.
ele nunca me disse o que fazer se o enquadro fosse vindo de você. eu sabia lidar com policiais, mas não sabia lidar com você, justamente porque você sabia lidar comigo e não de um jeito bom. não de um jeito que a gente sabe lidar com alguém que pode explodir a qualquer momento ou é mentalmente frágil.
lidar como se o seu conselho fosse advindo do arcano da força invertido. lidar como se você tivesse domínio sobre mim. e de fato, você teve, mas tão fraco. bastava eu fazer uma força pra romper essas algemas feitas de bala fini. porque você não teve a decência de comprar uma de ouro.
eu nunca fugi, nunca.
e se eu tentar fugir de novo qual vai ser meu preço? de te entregar conforto e paz mas eu sem ser inteiro?
mas sempre tentei te entregar o conforto e paz. mesmo sem ser inteiro. jão, é possível. não sei como te ensinar agora, mas eu sei que consegui.
mas não consigo mais agora. eu me lembro da nossa listinha de datas.
eu me lembro dos capítulos da nossa história.
eu me lembro.
eu me lembro que eu quis te contar as fofocas absurdas do trabalho. tentei te escrever um email, mas você nunca respondeu. tentei te contar pessoalmente, mas dentro da sua carcaça não era mais você. não era mais a pessoa pela qual eu tinha me apaixonado como a bella se apaixonou pelo edward.
não era mais a pessoa pela qual as lágrimas da rua eram destinadas. nem a pessoa pela qual o meio fio ouviu minhas lamentações.
não era mais a pessoa que causou dó no taxista a ponto de ele dar desconto na minha corrida. não era mais. eu tentei te ligar, eu tentei te mandar uma mensagem. mas não era mais você.
possuído.
sabe quando a gente gosta tanto de alguém e sonha com o velório da pessoa? nunca aconteceu, mas te velo em pensamento todos os dias vendo memórias de quando você me achava ridículo.
me dei uma diária sozinho no hotel. me reconciliei com o meu passado. fui na balada sozinho. aprendi francês. misturei vodka com catuaba. vendi dois livros. fiz uma tatuagem. tirei o piercing. benzi minhas células. contei pra minha mãe. pro meu pai ainda não, ele ficaria feliz, eu acho. e eu quero tristeza.
apesar de que não estou triste. aquele lá morreu também. você levou junto.
eu te olhei com calma e compreensão. eu te entendi mesmo quando não me entendia. eu não passei como as línguas, eu fiquei. sem nada, mas fiquei.
eu também chorei.
mas você gostava do olho do furacão né? e eu era o próprio furacão. não somente o olho dele. você não pode segurar. ainda guardo os tickets do cinema no meu livro de roma.
ainda guardo o guia de viagens da disney de agosto.
tive medo de ir para a faculdade sozinho. tive medo da recusa, então busquei a reclusa. não me fale sobre entrega. eu te entreguei no dia que hoje faz aniversário.
mergulhei fundo.
você colocou um pé, com medo da água fria. eu era mais baixa que nitrogênio líquido.
e você disse que eu era baixa mesmo. uma pessoa baixa. não de estatura, de caráter. disso não posso debater, você tem sua opinião.
Estou de volta com a segunda parte da minha pretensiosa lista. O leitor há de decifrar o meu gosto particular e deduzir os limites do meu conhecimento de poesia principalmente nesta segunda parte. Sem mais delongas, vamos a ela.
5. Poema de Sete Faces, de Carlos Drummond de Andrade
Quando nasci, um anjo torto desses que vivem na sombra disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.
Uma confissão memorável da fraqueza do ser humano. A inteligência poética de Drummond é bastante notável nesse poema.
4. Timidez, de Cecília Meireles
Basta-me um pequeno gesto,
feito de longe e de leve,
para que venhas comigo
e eu para sempre te leve. . .
Resistência do eu lírico em confessar o seu amor à pessoa amada. Não se sabe se algum dia a pessoa notará ser objeto de afeição da poetisa. Só se tem certeza de que o tempo – a única coisa certa – há de pôr fim à existência de quem ama.
3. Canção do Exílio, de Gonçalves Dias
Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá;
Sem que desfrute os primores
Que não encontro por cá;
Sem que ainda aviste as palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Memorável retrato do sentimento de um exilado. Talvez um clichê, mas pela importância histórica, pela beleza dos seus versos e pelo patriotismo do autor deste texto, mereceu um lugar nesta lista.
2. Amor é fogo que arde sem se ver, de Luís de Camões
Amor é fogo que arde sem se ver;
É ferida que dói e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer;
Soneto do grande poeta da língua portuguesa sobre as contradições do amor.
1. A Divina Comédia, de Dante
Acabara o ladrão, e, ao ar erguendo
as mãos em figa, deste modo brada:
“Olha, Deus, para ti o estou fazendo!”
E desde então me foi a serpe amada
pois uma vi que o colo lhe prendia,
como a dizer: “não falarás mais nada”.
Outra os braços na frente lhe cingia
com tantas voltas e de tal maneira
que ele fazer um gesto não podia.
Ah! Pistóia, porque numa fogueira
não ardes tu, se a mais e mais impuros,
teus filhos vão nessa moral carreira?
Poema épico que narra a imaginária passagem de Dante pelo Inferno e pelo Purgatório até chegar ao Paraíso. As geniais alegorias tornam o poema atemporal.
Encerro aqui a minha módica lista. O leitor pode encara-la como um incentivo e um guia para adentrar no maravilhoso universo da poesia. Uma ótima leitura a todos.