Contrariando o pensamento de muitos, a depressão não é um sinal de fraqueza, falta de pensamentos positivos ou alguma condição que possa ser superada por esforço ou força de vontade de quem a tem. Tampouco se trata de apenas uma “mudança de humor” ou um baixo astral passageiro. Desde o início da pandemia e com a incerteza do futuro, notou-se uma crescente no número de pessoas sofrendo por estresse, ansiedade e depressão. Porém, como identificarmos se um ente querido está realmente sofrendo com esta doença?
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Considerada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como o “Mal do Século”, o quadro depressivo é um Transtorno Afetivo (ou do humor), caracterizado por uma alteração psíquica e orgânica global e como consequência, altera na maneira de valorizar a realidade e a vida. De acordo com a psicóloga do Grupo São Cristóvão Saúde, Aline Melo, “é importante ressaltarmos que o paciente que sofre dela não tem controle ou não age propositalmente nos sintomas que ocorrem devido ao quadro”, revela a especialista.
Para auxiliar quem está passando por tais dificuldades, além de agir de maneira acolhedora, paciente e amorosa, é necessário ter conhecimento sobre a doença para fortalecer o outro no enfrentamento desse processo. “O não entender do quadro faz o parceiro pensar que, assim como um momento de tristeza, as sensações de quem sofre dessa doença também vão passar logo, ou mesmo comparam o quadro da pessoa com outras situações de sofrimento, com o objetivo de fazê-la sentir-se melhor e diminuir sua dor. Porém, o impacto desta atitude é profundamente negativo e pode gerar um sentimento de culpa no paciente ou de que estão minimizando sua dor”, revela a psicóloga do Grupo São Cristóvão Saúde.
Não se pode afirmar a causa exata da depressão, pois varia entre indivíduos. Antes de bater o martelo no diagnóstico, é possível que o médico peça alguns outros exames para verificar se não há outra doença que possa estar causando os sintomas. Problemas de tireoide, por exemplo, podem causar sintomas idênticos aos de um transtorno depressivo. Dentre os fatores de risco que podem ser um gatilho para desencadear o transtorno, podemos citar:
• Hereditariedade (tendência familiar)
• Efeitos colaterais derivados de medicamentos
• Eventos emocionalmente angustiantes, especialmente quando envolvem uma perda
• Alterações dos níveis hormonais (quando se trata do sexo feminino)
• Certas doenças físicas
Com o isolamento por conta do Covid-19, sentimentos de solidão e tristeza podem surgir, dificultando ainda mais o acolhimento do outro. Sendo assim, a especialista recomenda procurar assistência caso apresente alguns dos sintomas abaixo por duas ou mais semanas:
• Tristeza
• Desânimo e fadiga
• Insônia
• Perda ou aumento de apetite
• Falta de esperança
• Dificuldade em sentir prazer nas coisas
• Sonolência excessiva
• Sentimento de culpa
• Falta de concentração
• Libido baixa
• Sentimentos de medo e vazio
• Insegurança
• Dores pelo corpo, como dor de barriga, tensão nos ombros ou nuca, dor de cabeça, pressão no peito ou até mesmo prisão de ventre
Trazer para perto outras pessoas da família ou de confiança pode contribuir para a melhora deste sentimento. Ao não darmos a devida atenção aos sintomas, um episódio de depressão não tratado costuma durar cerca de seis meses, mas, às vezes, prolonga-se por dois anos ou mais e tendem a se repetir diversas vezes ao longo da vida.
Desse modo, além de procurar profissionais da saúde que possam auxiliar nestes momentos delicados, a principal dica é o autoconhecimento. Leituras de autoajuda, podcasts e outros materiais são ferramentas podem proporcionar conhecimento sobre o tema, mas não substituem o atendimento terapêutico. “Quanto mais compreendermos nosso funcionamento emocional, fica mais fácil de identificarmos quando algo não anda bem em nosso psicológico e tratarmos antes que vire uma patologia mais grave”, finaliza Aline Melo.
Quando recebemos um diagnóstico médico difícil na família, pode parecer um pouco contraditório ter que parar e olhar para as suas próprias limitações, não apenas para as do ente adoentado. Segundo Cláudia Barroso, psicanalista à frente do Bem me Care há mais de 10 anos, e que já atendeu inúmeras famílias nessa situação, é preciso desenvolver um novo olhar sobre a doença, o paciente e sobre si mesmo para um melhor enfrentamento das mudanças que virão.
“Uma família abalada por um diagnóstico médico difícil necessita de ajuda para cuidar não apenas de quem está adoecido, mas para entender a saúde emocional de todos os envolvidos, como estão os vínculos diante do diagnóstico que estão enfrentando e como os papéis estão organizados”, explica Cláudia. Muitas vezes, a doença pega todos de surpresa e não há muito tempo para esse processo dentro da dinâmica familiar.
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Cláudia lembra: “é natural que o foco seja quem tem a doença ou a nova condição. Mas receber o diagnóstico e fazer os ajustes necessários pode ser um processo muito doloroso, que se assemelha a um processo de luto”. Aquela pessoa já não pode mais desempenhar todos os papéis que antes lhe cabiam, e talvez precise de cuidados extensivos e com certa urgência, o que toma tempo e interfere no funcionamento emocional de todos.
“Entretanto”, enfatiza a psicanalista, “quanto mais rápido fizermos essa análise e resolvermos não apenas as questões burocráticas, mas as emocionais envolvidas, mais fácil será a adaptação”. Existem casos bem específicos, em que é preciso preparar os membros da família para todos os tipos de mudança, da rotina da casa à da empresa, por exemplo.
“Quem cuida pode adoecer também. Pode desenvolver culpa, angústia, ansiedade”, explica Cláudia, “e é uma realidade que precisa ser observada, mesmo ainda sendo um tabu”. Quem cuida precisa ser cuidado, também. E, muitas vezes, esse processo é esquecido em meio a tantas obrigações com quem está doente.
O Bem me Care desmistifica o fato de que só o familiar adoentado precisa de cuidados. As sessões, que funcionam de forma emergencial, são realizadas em grupo com os familiares, amigos e pessoas próximas que têm suas vidas modificadas pela situação. “É nesse ambiente acolhedor e no qual não há julgamentos que todos podem colocar suas dúvidas, incertezas, fragilidades, e encontrar uma forma de, juntos, desenvolver um novo olhar sobre a situação”, finaliza a especialista.
Em “A redoma de vidro” conhecemos a história de Esther, uma bonita jovem que estuda numa ótima universidade e está trabalhando na redação de uma revista popular em Nova York. Teoricamente a vida de Esther é perfeita e invejável, mas algo ainda não está certo para ela, que não se sente parte integrante daquele grupo.
“Não teria feito a menor diferença se ela tivesse me dado uma passagem para a Europa ou um cruzeiro ao redor do mundo, porque onde quer que eu estivesse – fosse o convés de um navio, um café parisiense ou Bangcoc -, estaria sempre sob a mesma redoma de vidro, sendo lentamente cozida em meu próprio ar viciado.”
Mesmo convivendo com pessoas importantes e bonitas, entrando e saindo de festas, fazendo compras e sendo admirada, Esther sente um vazio inexplicável e, em certos trechos, é possível sentir como a personagem se sente presa e sufocada dentro de si.
“Me sentia muito calma e muito vazia, do jeito que o olho de um tornado deve se sentir, movendo-se pacatamente em meio ao turbilhão que o rodeia.”
Após o término do seu estágio, Esther volta à casa de sua mãe, onde fica constantemente isolada e não sente vontade de fazer nada. O que me chamou atenção nesta parte da leitura, foi o descaso da sua mãe com o sofrimento da filha. Depois de um tempo, Esther tem um surto (que ocorre de uma maneira muito rápida), e retorna a uma clínica psiquiátrica onde já esteve antes, e é neste momento que temos a dimensão da depressão que a personagem sofre.
Como o livro se passa na década de 50, uma vez que a personagem entra em crise, ela é internada em uma clínica onde os psiquiátrias da época acreditavam em terapias de choque e o uso de muitos medicamentos como forma de cura de qualquer doença psiquiátrica, submetendo Esther a um tratamento traumático e pouco efetivo. Somente na segunda clínica em que se interna Esther conhece uma médica com a qual se sente confiante para se tratar e melhorar.
Mesmo sem nunca antes tendo passado por essa situação, o leitor consegue compreender o nível do desolamento do paciente depressivo, e mesmo utilizando palavras leves, Sylvia consegue nos transmitir esses sentimentos tão pesados.
“O ar da redoma me comprimia, e eu não conseguia me mover.”
Ainda não compreendi muito bem até que ponto a obra é autobiográfica, uma vez que alguns fatos da história realmente aconteceram na vida da autora Sylvia Plath. Talvez por já saber dessa possibilidade de proximidade entre o livro e a vida da autora, muitas vezes senti a leitura muito mais íntima do que deveria, como se estivesse realmente invadindo os pensamentos de Sylvia Plath.
O livro termina de uma forma aberta para interpretações. Em seus últimos paragráfos, ficamos com a sensação de que Esther (e de certa forma, Sylvia) irá sair da depressão e encontrar um sentido na vida, mas infelizmente o livro e a vida real terminam de forma bem diferente, uma vez que Sylvia se suicidou um mês após a publicação.
“Resolvi que nadaria até estar cansada demais para voltar. Enquanto avançava, eu sentia o coração batendo como um motor surdo nos meus ouvidos. Eu sou eu sou eu sou.”