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Daniel Galera

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Resenha: Meia Noite e Vinte, Daniel Galera

Uma grande revelação da literatura brasileira, Daniel Galera vem nos presenteando ao decorrer dos anos com romances intensos e que nos colocam dentro da cabeça das personagens de uma forma que muitos tentam e não conseguem. Seu último sucesso, Barba Ensopada de Sangue foi enorme sucesso e tem resenha aqui no Beco, que você pode conferir clicando aqui. Dando seguimento aos seus romances imperdíveis, ele lançou no último o mês “Meia Noite e Vinte”.

 

O livro se passa no final dos anos 90 e logo nos trás uma nostalgia enorme ao falar do começo da revolução na comunicação, com o boom da internet, os comunicadores instantâneos e como isso começava a atingir lentamente o nosso cotidiano. Três amigos escreviam juntos e se publicava na internet, Aurora, Emiliano e Antero. O mais interessante é que aparentemente iríamos ver as histórias todas juntas, mas não. Cada personagem tem a sua linha, tem a sua história separada e acompanhamos elas detalhadamente.

 

Como sempre, a áurea gaúcha está presente na narrativa, e é muito bom ler algo que fuja desse eixo Rio-São Paulo tão presente na literatura nacional. Galera é mestre em não fazer algo comum e nos transportar para lugares diferentes de nosso país. O que é mais difícil em falar deste seu último lançamento é que o enredo em si não chama a atenção, e sim a forma que ele desenrola. Falar muito sobre acaba estragando a experiência que ele proporciona, pois em tese, poderia ser resumida em poucas linhas.
Para os estudantes de humanas, um prato cheio: acompanhar as evoluções tecnológicas no desenrolar dos 15 anos em que a trama se passa é um deleite. “A fragilidade do homem era tocante. Milhões de anos de evolução desembocando em seres incrivelmente não adaptados ao ambiente do planeta, como demonstrava nosso sofrimento diante de mínimas alterações de temperatura”.

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Resenha: Mãos de Cavalo, Daniel Galera

Carregado de detalhes, Mãos de Cavalo é um livro que se você não soubesse que é de Daniel Galera, sacaria que era dele logo nas primeiras páginas. Muito bem narrado, ele demora para engrenar. A demora não é culpa do autor. Ele quis que fosse assim.

As frustrações do cirurgião plástico Hermano os fazem sumir alguns dias de sua rotina, de seus pacientes e de sua família em escapadas para escalar com um amigo, onde exploram as maiores montanhas da região sul país. Esta insatisfação com a vida atual é guiada também por memórias nostálgicas, de sua infância nos anos 90, que são a melhor parte do livro. Os conflitos, brigas, primeiro beijo, aventuras com amigos, e até a morte de um deles: tudo faz sentido e tudo remete a algo que acontece com ele aos 30 anos de idade.

Os capítulos alternados entre os tempos atuais e os tempos passados vão de capturando aos poucos. Demora para se captar a aura desta história dramática e cheia de personalidade. E é disso que Mãos de Cavalo fala: sobre a definição da personalidade de um homem. É como se a trinca de livros de Galera “Cordilheira” e “Barba Ensopada de Sangue” juntas se resumisse a nos dizer que temos que aceitar nosso destino e seguir em frente com eles. É tudo uma construção que vem sendo feita desde nossos primórdios aos tempos atuais.

Hermano resolve abandonar sua última aventura, que era escalar uma montanha de gelo na Argentina para correr atrás de sua base, voltar a sua infância e começo de adolescência e obter respostas, quem sabe, para reavaliar o seu futuro.

Não é um livro para altas expectativas. É apenas uma boa leitura que o fará pensar muito sobre si mesmo.

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RESENHA: CORDILHEIRA, DANIEL GALERA

Moderno e contemporâneo, Cordilheira, de Daniel Galera, nos pega por ser um livro extremamente atual, mas deixando algumas particularidades modernas de lado, nos envolvendo como num romance que se passa há 20 ou 30 anos – e não me refiro apenas a ausência de telefones e celulares nos pontos chaves da trama, mas ao fato dos envolvidos estarem muito bem sem eles.

Conta-se a história de Anita, uma escritora de um único sucesso que renega o seu livro e prefere se manter longe da literatura. Em São Paulo, duas de suas melhores amigas tentam se matar – e uma delas consegue – e querendo se manter longe dessa negatividade e querendo dar uma mudança na sua vida, ela aproveita o lançamento tardio de seu livro na Argentina e decide largar tudo, ficando de vez em Buenos Aires. Antes de partir, a moça termina com o namoro de dois anos porque o namorado não tem intenção de ter filhos tão cedo, e essa passa a ser uma necessidade de vida ou morte para a jovem, que sente que se tornar mãe vai dar uma guinada e sentido para sua vida.

Precisamos ser sinceros em certo ponto: não tem como se morrer de amores por Anita enquanto ela está em São Paulo: ela nos é apresentada como fútil, arrogante, mesquinha e até egoísta. Do momento em que ela põe os pés em Buenos Aires, parece que somos apresentados a uma nova mulher: segura, sombria e determinada. Quando conhece o jovem José Holden, um grande fã de seu trabalho, a ex-autora começa a viver a grande aventura pela qual sua vida pedia, e fascinada, passam a morar juntos. O grande foco do livro é que tanto Holden quanto seus amigos estão interessados em Magnólia, personagem principal do romance da autora paulista, e não nela própria, e é neste ponto que este romance bem peculiar começa.

Cordilheira explora o limite da realidade e ficção e nos convida a pensar o que leva um escritor a falar sobre os assuntos que estão em seus livros, onde está o limite da arte com a vida. Terceiro lugar no prêmio Jabuti foi o penúltimo livro de Daniel Galera, anterior a Barba Ensopada de Sangue, e mantém as suas peculiaridades de detalhar bem o cenário em que se contam os fatos narrados, fazendo uma introdução muito bem feita não apenas do ambiente, como dos personagens. Breve, sombrio e bastante envolvente.

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Resenha: Até O Dia Em Que O Cão Morreu

Até o Dia Em Que O Cão Morreu é quase uma biografia do autor Daniel Galera (Barba Ensopada de Sangue) pelas semelhanças entre o protagonista e quem o escreve. O personagem principal sem nome não tem sua identidade revelada em nenhum momento da história, o que torna toda tudo mais interessante, pois você passa a imagina-lo como qualquer pessoa do seu cotidiano (ou no meu caso, como Daniel).

O rapaz que trabalha como freelancer como tradutor e intérprete de russo, vivendo de uns bicos aqui e ali. Vive do dinheiro dos pais que o ajudam no final do mês pois não tem trabalho fixo e não vê necessidade de ter um, já que sempre conta com esse impulso quando necessário. A descrição do apartamento em que ele vive já nos remete a vida de uma pessoa triste e solitária, pois ele vive sem móveis, com um colchão no chão e está ok com isso.

Somos levados e guiados por uma vida básica, sem muitos acontecimentos, até o dia em que ele encontra com um cão na rua, que passa a acompanha-lo até seu apartamento diariamente. Em nenhum momento ele toma a atitude de adotar o cão. Ele trata a relação dos dois como “se quiser vir, venha”. Nessa idas e vindas com o cão, em uma balada ele conhece uma jovem modelo chamada Marcela. Rapidamente eles entram em sintonia, e ambos começam a se apaixonar, porém ele enfatiza que não quer relacionamento sério e isso os faz arrastar essa situação até o dia em que, por obra do destino, são obrigados a se separar.

O sexo sem cerimonia, a interação dos personagens, os diálogos que não são indicados por pontos e travessões são um chamariz e diferencial que torna tudo mais simples, assim como tudo que permeia a história, transforma a leitura em algo agradável, de modo que o desejo é terminar aquilo de uma tacada só. É uma obra madura e convidativa. A parte mais triste é começar a se identificar em alguns pontos, pois a realidade está tão crua e direta que dá um calafrio só de se imaginar tendo aquela vida.

Falar deste livro é um pouco difícil, pois são apenas 104 páginas, e caso eu entre em maiores detalhes, acabarei estragando a experiência de muita gente, por isso, apenas digo que é uma leitura extremamente prazerosa, detalhada – como já é característico de Daniel Galera – e pautada em nos mostrar o quanto uma vida aparentemente vazia tem suas cores e fatos marcantes. Após a leitura, eu recomendo também o filme Cão Sem Dono, que é inspirado neste livro e tem a incrível atriz Taina Müller interpretando Marcela.

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Resenha: Barba Ensopada de Sangue

Complexidade pode definir bem Barba Ensopada de Sangue, de Daniel Galera. É um livro de leitura agradável, porém trabalhosa. Conta à história de um professor de educação física, que ao visitar seu pai, é informado que o mesmo pretende se matar nos próximos dias, e faz um pedido: que após isso, ele sacrifique sua companheira de anos, a cachorra Beta. No meio desta confissão, o pai conta as aventuras do avô do rapaz no balneário de Garopaba, que acabou sendo “assassinado” pela população local anos atrás. E é aí que começa nossa jornada: com uma pulga atrás da olheira, o jovem resolve se mudar para a cidade com o objetivo de saber mais sobre o avo.

Após a morte de seu pai, o pedido que lhe foi feito não é realizado, e a cachorra Beta se torna a leal escudeira do professor, e nos aproximamos dela e seu atual dono. A forma como ela passa a acompanha-lo em todos os locais e a preocupação que um tem pelo outro, os laços criados de forma tão rápida nos atraí com muita facilidade.

O livro não é investigativo, e o a vida do personagem principal é tão bem contada, com ricos detalhes durante toda a trama, que em determinado momento esquecemos do plot inicial e somos imergidos no seu cotidiano. Seus jeitos, manias, forma de relacionar. Tudo rico em detalhes – ah, os detalhes! São muitos – e até por isso torna “Barba Ensopada de Sangue” um pouco cansativo a certo ponto. Com alguns paralelos dispensáveis, bastante coisa poderia ser resumida em algumas páginas, mas a intenção do autor foi justamente nos mergulhar no universo que ele criou e no fim, você consegue pensar “esse mergulho tão profundo em tudo que foi contato foi necessário”.

Não é uma narrativa que você mata em cinco dias ou duas semanas. Acredito que para ser prazeroso, ela deve ser consumido aos poucos, um pouquinho por dia. Eu demorei cerca de um mês e acho que foi o tempo ideal para absorver tudo. Daniel Galera é um dos mais promissores autores de nossa geração. Nascido em São Paulo, mas gaúcho de tudo tem outros títulos muito elogiados publicados, como “Mãos de Cavalo” e “Até o dia em que o cão morreu”. Barba é seu último lançamento, feito pela Companhia das Letras, em 2012 e não posso esperar pelo próximo. Leitura recomendada e com aviso: vão querer mais.