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LEITURA DE POESIA: considerações sobre o gênero lírico em Mário Quintana

O poema é feito de palavras, seres equívocos que, se são cor e som, também são significado; o quadro e a sonata são compostos de elementos mais simples – formas e cores que em si nada significam.

[leitura de] Octávio PAZ, 1982

O questionamento central deste artigo é “como se faz a leitura de poesia?”, mas antes de responder essa pergunta, é preciso primeiramente entender o que está sendo lido, para depois saber como se dá a leitura. O gênero literário Poesia é caracterizado por suas especialidades, inclusive no aspecto leitura, em linhas gerais, como ser a arte de escrever em versos e por meio de sua linguagem estar agrupada vários fenômenos estilísticos que são utilizados, não só para customizar, mas para tentar abarcar o sentimento por intermédio de palavras, e esses fenômenos linguísticos são denominados de figuras de linguagem.

Para entender todo esse sistema poético que é constituído tal gênero literário, conforme Modesto Carone Netto (1974), em sua obra crítica Metáfora e Montagem, poesia é:

[…] junção de imagens descontínuas. Apresenta-se, dessa forma, como um conjunto de metáforas visuais agrupadas sem necessidade “lógica”, ou seja, reunidas num sistema semiológico em que uma não decorre necessariamente da outra, como acontece no discurso linear comum ou na obra literária que lhe acompanha de perto os passos. (CARONE NETO, p. 15, 1974)

O autor continua discutindo em seu texto que

[…] as imagens isoladas do poema se comportam como as “tomadas” ou as fotogramas montadas num filme, articulando planos e cenas cujo significado seria aferível pela forma em que essas unidades colaboram ou colidem umas com as outras na consciência de quem lê o poema (como ocorre na mente de quem vê o filme).  (CARONE NETO, p. 15, 1974)

Para enriquecer a conceituação de poesia neste trabalho, é válido trazer um teórico que aborda uma teoria mais poética, portanto, mais adocicada durante o ato da leitura.

Octavio Paz (1982), no capítulo intitulado de Poesia e Poema, de sua obra O Arco e a Lira, nos esclarece o significado de poesia. O autor escreve que a poesia é

A poesia é conhecimento, salvação, poder, abandono. Operação capaz de transformar o mundo, a atividade poética é revolucionária por natureza: exercício espiritual, é um método de libertação interior. A poesia revela este mundo; cria outro. (PAZ, p. 15, 1982)

Paz (1982) continua a dissertar logo abaixo, na mesma página de discussão que

Experiência, sentimento, emoção, intuição, pensamento não dirigido. Filha do acaso; fruto do cálculo. Arte de falar em forma superior; linguagem primitiva. Obediência ás regras; criação de outras. Imitação dos antigos, cópia do real, cópia de uma cópia da Ideia. Loucura, êxtase, logos. Regresso à infância, coito, nostalgia do paraíso, do inferno, do limbo. Jogo, trabalho, atividade ascética. Confissão. Experiência inata. Visão, música, símbolo. (PAZ, p. 15, 1982)

Portanto, como ler este texto tão especial?

 

É interessante trazer para a discussão a argumentação defendida por Bosi (1994, p. 477) ou esclarecer que, à medida que o material significante assume o primeiro plano: verbal e visual, o poeta reelabora esse material em vários campos. São eles:

  1. no campo semântico: ideogramas (“apelo à comunidade não-verbal”, segundo o Plano Piloto cit.); polissemia, trocadilho, nosense…;

  2. no campo sintático: ilhamento ou atomização das partes do discurso; justaposição; redistribuição de elementos; ruptura com a sintaxe da proposição;

  3.  no campo léxico: substantivos concretos, neologismos, tecnicismos, estrangeirismos, siglas, termos plurilíngues;

  4.  no campo morfológico: desintegração do sintagma nos seus morfemas; separação dos prefixos, dos radicais, dos sufixos; uso intensivo de ceros morfemas;

  5.  no campo fonético: figuras de repetição sonora (aliterações, assonâncias, rimas internas, homoteleutons); preferência dada às consoantes e aos grupos consonantais; jogos sonoros;

  6. no campo topográfico: abolição do verso, não linearidade; uso construtivo dos espaços brancos ausência de sinais de pontuação;

Exemplo, atente para a leitura do poema logo abaixo:

Das utopias

Se as coisas são inatingíveis… ora!

Não é motivo para não quere-las

Que triste os caminhos, se não fora

A mágica presença das estrelas!

Mário Quintana

 

Neste exemplo de poema, escrito por Mário Quintana, é possível identificar através da leitura, alguns traços da teoria explicada por Philadelpho Menezes (1991). Primeiramente uma leitura morfológica, o poema possui uma única estrofe contendo quatro versos. Não possui emjambement, a linguagem clara e muito subjetiva.  As rimas são intercaladas – A B A B – veja logo abaixo:

 

Se as coisas são inatingíveis… ora!           A

Não é motivo para não quere-las               B

Que triste os caminhos, se não fora           A

A mágica presença das estrelas!                B

 

Como dito no início do parágrafo de análise, segundo a leitura da obra de Philadelpho Menezes (1991) explica que o uso de pontos é um traço contemporâneo, o uso de reticências transmite ao leitor o pensamento profundo e reflexivo do verso, o termo “inatingíveis” carrega em si um peso semântico muito profundo que, ao final, o eu lírico compara as estrelas do ceu. Quem trilha o caminho da vida não consegue alcançar as estrelas do ceu, pois são inatingíveis, mas olhar para elas e deseja-las, vê-las ao cominhar, muda e transforma o sentido da caminhada.

O Professor, mediador, pode desenvolver a leitura em sala de aula que as estrelas é uma metáfora para qualquer sonho inalcançável de seus alunos, e ao desejar/sonhar/querer esses sonhos e anseios impossíveis não os faz ser iludidos ou perdidos na vida, pois é o brilho das estrelas e a mágica de sua presença que faz a caminhada da vida se tornar mais divertida, a existência se torna mais fácil, visto que lidar com as adversidades, lutos, dificuldades e imprevistos da caminhada podem paralisar ou abater.

  1. no campo semântico: estrelas é a metáfora de sonhos inalcançáveis, sonhos distantes, difíceis de se concretizar;
  2. no campo sintático: construções sintáticas usuais como expressas segundo a gramática, não há rupturas;
  3. no campo léxico: linguagem fácil e simples de fácil acesso;
  4. no campo morfológico: não há desintegração do sintagma nos seus morfemas; ou separação dos prefixos, dos radicais, dos sufixos; ou uso intensivo de ceros morfemas;
  5. no campo fonético: figuras de repetição sonora (aliterações, assonâncias, rimas internas, homoteleutons); preferência dada às consoantes e aos grupos consonantais; jogos sonoros;
  6. no campo topográfico: construção tradicional do verso, linearidade; não há o uso construtivo dos espaços brancos, mas o uso do recurso das reticências que transmite um peso semântico ao entendimento do texto;

 

 

 

 

Referências 

BOSI, Alfredo. História Concisa da Literatura Brasileira. Editora Pensamento Cultrix LTDA – São Paulo, SP, 1994.

PAZ, Octavio, A tradição da ruptura; A revolta do futuro. In: Os filhos do barro: do romantismo à vanguarda. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984, p.11- 58.

______. O Arco e a Lira/ Octávio Paz; tradução de Olga Savary. – Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1982.

UNGARETTI, Giuzeppe. Razões de uma Poesia./ Organizacäo de Lucia Wataghin – Edusp/Irnaginfirio, São Paulo, 1994.

Informações sobre o livro: https://www.livrariacultura.com.br/p/livros/literatura-internacional/teoria-e-critica-literaria/o-arco-e-a-lira-30738284

Autoria: Versos de uma doce Alvorada
Autoria: Versos de uma doce Alvorada
Autorais

Autoria: Versos de uma doce Alvorada

– O Leão andava de um lado para o outro na terra nua, cantando a nova canção. Era mais suave e ritmada do que a canção com a qual convocara as estrelas e o sol; uma canção doce, sussurrante. À medida que caminhava e cantava, o vale ia ficando verde de capim. O capim se espalhava desde onde estava o Leão, como uma força, e subia pelas encostas dos pequenos montes como uma onda. Em poucos minutos deslizava pelas vertentes mais baixas das montanhas distantes, suavizando cada vez mais aquele mundo novo. Podia-se ouvir a brisa encrespando a relva.

C.S. Lewis, As Crônicas de Nárnia

Aprecio o azul do céu, tão límpido, distante, embaçado com algumas pinceladas de branco neve, esfumaçadas por toda a dimensão de tom cárdeo celeste… Sim, estou falando das nuvens, seres mágicos do ar perdidos pelo paraíso azulado. Safira para quem quer sair um pouco da terra, voar e não andar, extasiar do ar mais puro e não simplesmente respirar.

Sonho. Realidade. Viver…

É arrebatador ficar observando como muda a tonalidade do céu ao amanhecer, os raios solares ao incidirem sobre o firmamento anuviado e sereno, se transforma do azul anil para uma coloração mais avermelhada, e então passam a surgir tons alaranjados e por um pouco mais afastado, longínquo até, bem perto do sol, riscas de amarelo canário.

Foi um dia difícil, tirei minhas sandálias e fui caminhar pela areia. Um lugar paradisíaco, isolado, fúnebre de tanta perfeição. As gaivotas assoviam enquanto sobrevoam as águas e a maré que, vagarosamente aumenta, banha os meus pés me convidando para entrar e estar com ela.

Em um pequeno rochedo, camuflado por algas e pequenos crustáceos e cascos velhos dos pequenos animais encouraçados, leves e singelos reflexos de um pote de vidro incide sobre meus olhos. O limpo e então percebo que estou segurando uma garrafa de vidro que se mostra exausta de tanto perambular pelo mar aberto com uma pequena rachadura no envolto de seu casco.

Cristalizo minha atenção naquela garrafa e encontro um pequeno papel envolto de uma fita dourada acompanhada por um lindo laço carmesim que tinha como função fixar o formato cilíndrico do papel que de grossa espessura, logo se mostrava amarelado devido a pequenas gotas de água salgada ter conseguido penetrar no vidro pela fenda na garrafa.

No papel estava escrito um poema. Para quem, não sei responder, por qual motivo… Essa eu respondo, e digo que, com toda certeza, era o amor.

Sinto-te mesmo sem te tocar
Estou contigo mesmo sabendo da sua… Distância

Conheço-te sem te conhecer
Entendo-te sem te entender
Penso em você imaginando tudo ou nada

Conheço tua voz sem nunca tê-la escutado
Reconheço teus olhos sem nunca tê-los visto
Lembro-me do teu sorriso mesmo nunca estado ao teu lado quando se alegrou

Sinto junto a ti a lágrima que escorre em tua face,
Meras presunções
Plausível veracidade

Sinto-te
Por mais que precises, te espero
Por mais que chores, te consolo
Por mais que desejes, te amo
O tempo não é o inimigo do amor