A Secretaria de Educação de Santa Catarina determinou às bibliotecas escolares na última terça (7) que nove livros fossem retirados de escolas de Florianópolis e fossem armazenados em “local não acessível à comunidade escolar”. O ofício ainda dizia que em breve chegariam novas orientações.
Entre os livros censurados estão títulos como “Laranja Mecânica”, que aborda temáticas de regimes autoritários, “O Diário do Diabo”, que critica uma figura importante próxima a Adolf Hitler e “A Química Entre Nós”, que retrata o romance entre duas adolescentes.
Procurada pela CartaCapital, a Secretaria de Educação negou a censura e alegou que se trata de uma redistribuição das obras dentro da rede estadual. “A Secretaria de Estado da Educação (SED), por meio da Coordenadoria Regional de Educação de Florianópolis, informa que está redistribuindo alguns dos títulos das bibliotecas das unidades escolares da região, buscando melhor adequar as obras literárias às faixas etárias das diferentes modalidades oferecidas na rede estadual de educação”.
A decisão causou preocupação e indignação nas redes sociais, uma vez que a pasta ainda não anunciou o destino das obras, nem como será feita a redistribuição.
Lista de obras que sofreram censura:
A química entre nós, Larry Young e Brian Alexander
Coração satânico, William Hjortsbert
Donnie Darko, Richard Kelly
Ed Lorraine Warren: demonologistas – arquivos sobrenaturais, Gerald Brittle
Exorcismo, Thomas B. Allen
It: A coisa, Stephen King
Laranja Mecânica, Anthony Burguess
Os 13 porquês, Jay Asher
O diário do diabo: Os segredos de Alfred Rosenberg, o maior intelectual do nazismo, Robert K. Wittman e David Kinney
Veja abaixo a reprodução completa do ofício enviado às escolas:
A Bienal do Livro do Rio, evento esperado com muita ansiedade para diversos leitores, foi palco de uma tragédia para aqueles que amam a literatura no país, ao ser alvo de censura por meio da Prefeitura da cidade. Com o objetivo de calar e tirar a voz de autores LGBT+, diversos fiscais foram enviados ao evento com o objetivo de envolver diversas publicações em plástico preto e determinar uma classificação de 18 anos para tais obras, mesmo aquelas sem qualquer cunho sexual.
O QUE ACONTECEU E O MOTIVO
O prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella, determinou ontem (05) que exemplares dos quadrinhos “Vingadores: A Cruzada das Crianças” fosse recolhida da Bienal do Livro, que está ocorrendo no RioCentro. Segundo o prefeito, a história contém “conteúdo sexual para menores”, e por tal motivo, deveria ser retirado de circulação. O tal conteúdo sexual relatado, na verdade, se trata de um beijo entre dois rapazes, completamente vestidos, conforme pode ser visualizado na imagem ao lado. Publicado originalmente em 2016 pela Panini Comics, a obra se esgotou na manhã desta sexta-feira no evento. Fiscais da Prefeitura estiveram na Bienal, com o objetivo de lacrar e censurar diversos livros que, segundo nota, “contenham histórias ou cenas de homotransexualismo”. Tal ação ocorreu após a mãe de uma criança que comprou o livro na Bienal se revoltou ao ver um casal homossexual sendo relatado na história.
Logo após o ocorrido, os mesmos fiscais foram enviados para grandes e pequenos estandes, com o objetivo de encontrar tais obras – importante reforçar que livros de cunho erótico, como a saga 50 Tons de Cinza, passaram batidos pela fiscalização, deixando claro que se trata de uma censura ao público LGBT+. A organização da Bienal do Livro se manifestou de forma oficial com o seguinte parecer: “A Bienal Internacional do Livro Rio, consagrada como o maior evento literário do país, dá voz a todos os públicos, sem distinção, como uma democracia deve ser. Este é um festival plural, onde todos são bem-vindos e estão representados, inclusive, no próximo fim de semana, a Bienal do Livro terá três painéis para debater literatura Trans/LGBTQA+.”.
Apesar da posição oficial, diversos fiscais foram enviados com uma ordem extrajudicial para retirar as obras de circulação ou às envolver em plásticos pretos. Hoje, às 9:00 tais profissionais estavam carimbando e censurando obras conforme imagens compartilhadas pelo perfil no Twitter @valelerumlivro:
Importante reforçar que, envolver tais livros em plástico e sinalizar conteúdos eróticos é uma prática para obras com cunho eróticos, e o que está acontecendo é que histórias com personagens LGBT, que muitas vezes apresentam apenas beijos entre os personagens, estão sendo o grande foco de tal ação.
Operação encerrada, os fiscais estão indo embora e disseram que não voltarão amanhã. Agora a questão é que um beijo gay ser enquadrado como pornografia daria poder para a prefeitura fazer esse tipo de atuação? Não seria só o ministério público que pode atuar neste caso? pic.twitter.com/HvKjdJPpdq
Neste meio tempo, Luiz Schwarcz, CEO e fundador da editora Companhia das Letras afirmou em carta aberta que “Essas medidas, mais a suspensão do edital que daria apoio a produção de filmes LGBTQ+ por parte do governo federal, indicam uma perigosa ascensão do clima de censura no país – flagrantemente inconstitucional – e que traz a marca de um indesejável sentimento de intolerância discriminatória”. O autor do livro “Você Tem A Vida Inteira”, da editora Galera, Lucas Rocha, reforçou em seu twitter: “A gente não pode parar. Não dá pra parar. É tipo quando a gente sai do armário e percebe que não tem volta. Lutar para simplesmente TER PAZ é um processo quase de alcoólico anônimo, um dia depois do outro, uns melhores do que outros.”. Além de Lucas, a mesma editora possui diversos títulos voltados ao público LGBT, entre eles diversos de David Levithan; em seu instagram, a editora reforçou que não se deitar para a tentativa de censura: “Homofobia é crime e acreditamos que o papel do estado é incentivar a leitura e não criar barreiras que marginalizem uma parcela da população que já sofre com a intolerância. Nossos livros estão à venda no estande e em todas as livrarias brasileiras, online e físicas. Vamos continuar lutando para que todos os jovens se vejam representados em nossas histórias.”.