Se um nerd nos anos 80 milagrosamente tivesse acesso ao Facebook na semana de estréia de Star Wars: O Despertar da Força, ele sentiria orgulho. Muito, muito orgulho. E é por isso que, 25 de Maio, exatamente 40 anos após o lançamento do primeiro Star Wars nos cinemas, nós celebramos.
Na época em que a cultura nerd começou a florescer entre os jovens “excluídos” estadunidenses, os estranhos e leitores vorazes, era ridículo ser um nerd. Era motivo de chacota. Você seria ridicularizado, subestimado, menosprezado e por fim rotulado, destinado a estar na grande caixa do “estereótipo”, dentro da qual alguém raramente olha.
Mas nós sempre fomos bons em sermos quem somos. Somos tão bons nisso que é difícil para nós quando nos pedem para ser outra pessoa, para conter nossas paixões. Então, apesar da maré de bullying que sufocou a subcultura nerd antes da Era da Internet, perseveramos.
Muito disso se deve ao fato de que o nerd é, por natureza, um ser de criatividade. Seja para produzir ou consumir, nós criamos um mercado de imaginação que hoje movimenta o mundo. Marvel, Google, Ubisoft, Microsoft, Facebook. O quanto essas marcas valem hoje em dia? E elas não seriam nada se não fossem os nerds que as fundaram, incentivaram e popularizaram.
Por menos do que isso é que viemos falar sobre o que precisa ser falado hoje. Viemos falar sobre o que é ser nerd, se existe problema na popularização da cultura, sobre as minorias no mundo nerd e perspectivas para o futuro.
Vem comigo!
UTOPIA NERD
Novamente, vamos voltar um pouco no tempo. Silenciosa, uma garota lê sua HQ do Spider-Man, a luz de uma lanterna, escondida debaixo das cobertas caso seus pais resolvam checar se ela está realmente dormindo.
Ela sonha com como seria se ela pudesse conversar com as pessoas sobre as aventuras que ela lê. Não seus pais, que apenas sorriem e acenam, tudo bem filha, agora vá estudar; mas amigos e amigas que, claro, conhecem o Spider-Man, ele é demais, quem não conhece? Como seria se ela pudesse ver um filme do homem-aranha, com atores de verdade?
Ela estaria vivendo o mundo dos sonhos.
Ela estaria vivendo algo como os dias de hoje.
Atualmente, quase todo mundo pelo menos já ouviu falar das mais famosas obras nerds contemporâneas. Game of Thrones? Conhecido. Vingadores? Conhecido. Star Wars? Conhecido. As pessoas podem não gostar no mesmo nível de intensidade, ou as vezes nem mesmo gostar, mas que essas obras são conhecidas é inegável.
Para muita gente, isso é algo bom. Saber que agora não há motivo para esconder seus gostos, que você não é um excluído e que, em alguns círculos, podem te ver até como um cara descolado. Para outros, porém, a popularização da cultura nerd é motivo de desgosto profundo. Essas pessoas argumentam que a popularização não somente lhes rouba algo que é característico e lhes distingue, mas também que muita gente hoje em dia não é “nerd de verdade”. O que nos leva ao próximo tópico.
O QUE É SER NERD HOJE EM DIA?
John Green tem uma frase famosa sobre “o que é ser nerd”. E ele tem bastante propriedade para falar do assunto. A citação é o seguinte:
“Nerds como nós podem ser abertamente apaixonados por algo… Nerds podem amar algo no nível de se balançar na cadeira de animação. Quando chamam as pessoas de “nerds”, basicamente o que eles estão dizendo é ‘você gosta de algo.’”
Essa frase explica muita coisa. É claro, não é gostar muito de qualquer coisa que vai fazer você um nerd. Existe todo um núcleo de gêneros e atividades que estão associadas com a nossa cultura, mas falando do que é nosso: se você gosta muito, bastante mesmo, você é nerd.
Não importa se você tem coleção. Se você sabe de cor o nome de cada personagem e seu histórico. Se você estaria disposto a fazer cosplay. Tudo isso é extra. O que importa é o quanto você gosta e o quanto aquilo define uma parte de quem você é. Que nerds são antissociais, feios, mega-inteligentes, isso são estereótipos. E estereótipos não nos prendem mais. O que importa é o quanto você ama as space operas, as fantasias, os super-heróis, as viagens no tempo. E o espaço que eles ocupam no seu coração.
STAR WARS, TOMB RAIDER E REPRESENTATIVIDADE
Quando sétimo filme de Star Wars saiu, muita gente assumiu que Finn seria o grande protagonista. Claro, o marketing genial da Disney ao mostrá-lo sempre usando sabre de luz colaborou para isso, mas o motivo mais profundo é que nunca antes uma mulher havia protagonizado um filme de Star Wars. Isso por si só já gerou uma confusão: houveram pessoas que REALMENTE promoveram um boicote ao filme. Porque Finn é interpretado por um ator negro (John Boyega).
Parece bem idiota, quando se para pra pensar, que alguém pense “Ei, esse cara é negro. Não vou poder aproveitar meu filme direito porque ele é negro”. Bem, algumas pessoas que acharam isso idiota conseguiram pensar, quando saiu o trailer Rogue One: “Ei, a protagonista é mulher de novo. Não vou poder aproveitar meu filme direito porque ela é uma mulher”.
O que está acontecendo é uma reação quase alérgica à fuga do clichê que é o protagonista homem branco, junto com um retrato não-sexualizado da mulher protagonista. Tudo isso está confundindo quem não é tão mente aberta.
Lara Croft é a eterna ídola do mundo gamer. Mas infelizmente, como muitas mulheres da vida real são obrigadas a fazer, ela não conseguiu isso só com seu carisma e personalidade. Lara usou de seu corpo. Poucos personagens não-pornográficos na história foram tão sexualizados quanto a heroína-britânica. Em 2012, uma versão atualizada de Tomb Raider foi produzida, um recomeço: sem seios gigantescos, sem sex appeal. Só a heroína. Ela ainda não consegue competir com Nathan Drake, um personagem muito semelhante (explorador) da série Uncharted, cujo único sex appeal é seu rosto bonito e sua pose de garanhão.
Star Wars Battlefront II vai trazer um modo campanha com mais uma protagonista feminina, e é de se esperar que essa tendência se espalhe. Precisamos dessa representatividade, porque nerds não são só homens. E não tem nada de extraordinário ou de fetiche em ser mulher e ser nerd. Assim como um cara nerd, uma garota nerd está simplesmente sendo quem ela é. E ela tem todo o direito de se espelhar em alguém como ela. Assim como negros, latinos, asiáticos, gays, lésbicas, bissexuais, transexuais. Nerds não estão entre esses. Estão englobando todos. Somos todos. E queremos nos ver.