Colunas

21/03/1960: O massacre de Shaperville

Dia 21 de Março de 1960. Joanesburgo, capital da África do Sul. O apartheid reinava no território africano e veladamente por toda a extensão do globo. As leis repressivas eram criadas pela minoria branca a fim de segregar negros e brancos. Uma delas era a Lei do Passe, citada pela primeira vez em 1945 e obrigava negros a portarem uma caderneta onde estavam escritos os lugares que estes podiam frequentar. E assim seguiam, não entravam em bairros brancos, nem em cafeterias de brancos, nem em ônibus de gente branca, nem em nada, porque o mundo era de gente branca, governado por gente branca e ditado por brancos. Mas aí, no bairro de Shaperville, 20 mil negros resolveram protestar para mudar a situação. Foi um massacre, matou e feriu centenas de manifestantes. E hoje, 57 anos depois do episódio, não mudou muita coisa.

Jovens negros inocentes baleados pela polícia esquecidos por todo mundo. É tão comum que chega um momento que você toma aquilo por normal. Só acontece. Que tal pensar sobre os seus privilégios hoje? Por eles, os que foram escravizados, segregados e humilhados por tanto tempo, e ainda são. Nós, brancos, não somos culpados pela escravidão ou por tudo aquilo que começou bem pequenininho durante o neocolonialismo do século XIX, mas carregamos todas as consequências desses acontecimentos. No Brasil, somos minoria populacional e ainda assim somos maioria em universidades, escolas particulares e no meio científico. Já parou para pensar que talvez o mundo seja assim por falta de oportunidade? Tudo isso dentro de um sistema estruturalmente racista, que continuamente perpetua essa situação perversa.

Não por coincidência, vários filmes e documentários abordam o tema de maneiras diferentes e perspectivas diversas. Em 2016, a Netflix lançou o longa “13th”, indicado ao Oscar de melhor documentário em 2017. Com um roteiro e direção sensacionais, o filme argumenta que a escravidão continua viva dentro do sistema carcerário americano, o maior do mundo, que afeta desproporcionalmente a população negra nos EUA.

Mesmo sendo abolida em 1865 através da 13ª emenda da constituição, a escravidão ainda teve espaço legal dentro do sistema prisional americano. Essa cláusula, que permite o uso de força involuntária como punição para crimes, vem sendo utilizada em campanhas políticas nacionais, como é o caso da guerra contra as drogas de Richard Nixon, que pesava muito mais sobre a comunidade minoritária negra das cidades estadunidenses. A conclusão chega a ser óbvia: o complexo carcerário se tornou uma indústria lucrativa e é um grande aliado do sistema discriminatório dos Estados Unidos.

Ainda, o vencedor do Oscar 2017 de melhor filme, “Moonlight” é atual e ousado, tratando sobre homofobia dentro da comunidade negra. O longa é contado em três partes e narra a busca de um jovem por sua identidade no meio social intolerante no qual vive. É, sobretudo, uma história de libertação e quebra muitos tabus modernos. A visão paradigmática de que o jovem negro é da rua, do futebol e da heterossexualidade, conceitos propagados também pelo próprio grupo étnico. Os três momentos da narrativa, “Little”; “Chiron” e “Black” são progressivos e abordam de maneira envolvente os estágios de aceitação pelas quais o personagem principal precisa passar.

Um queridinho do público, “Histórias Cruzadas”, aborda a história de empregadas domésticas que conseguem a ajuda de uma jornalista para escrever um livro e denunciar o racismo que sofriam em suas jornadas de trabalho. O filme foi baseado no livro “The Help” e vai além da biografia dessas mulheres marcantes, contextualizando toda uma época de terror dentro da comunidade negra no Mississipi.

A narrativa começa em 1963, ano em que Medgar Evers, ativista do movimento dos Direitos Civis foi morto por supremacistas brancos da Klu Klux Klan. Os depoimentos das empregadas revelam a humilhação e o descaso com o qual eram tratadas, mesmo cuidando dos filhos de mulheres brancas por anos e ganhando um quinto do salário mínimo da época. Ademais, o filme tem uma preocupação em mostrar, também, a imensa desigualdade de gênero existente na década de 60.

Além destas, várias outras obras merecem ser citadas.

  •  “I am not your negro”: Documentário narrado por Samuel L. Jackson que explora a história do racismo nos Estados Unidos por meio das figuras de liderança do movimento dos direitos civis Medgar Evers, Malcom X e Martin Luther King Jr. 
  • “Menino 23: Infâncias perdidas no Brasil”: Documentário do brasileiro Belisário Franca, acompanha a pesquisa do historiador Sidney Aguilar, que descobriu que, durante os anos 1930, 50 meninos negros foram levados de um orfanato no Rio de Janeiro para uma fazenda no interior de São Paulo, onde foram submetidos a trabalho escravo e identificados por números.
  • “O.J.: Made in America”: O documentário, produzido pela ESPN e dividido em episódios, conta a história da tensão racial dentro dos EUA  através de uma das figuras mais polêmicas do país, Orenthal James Simpson, astro de futebol americano. Ganhador do Oscar de melhor documentário em 2017.
  • “A boneca e o silêncio”: Curta-metragem de Carol Rodrigues que acompanha a jornada penosa de uma menina de 14 anos depois de ter decidido interromper a gravidez. Segundo a diretora, o objetivo era mostrar uma visão diferente do aborto no Brasil, que atinge significativamente a população negra e pobre no Brasil.
  • “12 anos de escravidão”: O filme narra a história real de Solomon Northup, negro livre que em 1841 foi sequestrado e vendido como escravo, condição na qual permaneceu por 12 anos. É baseado no livro de mesmo nome.

Depois dessa lista de filmes, não tem como reclamar da falta de conteúdo para entender a abrangência e importância do assunto. Por isso, vamos deixar o orgulho de lado e observar o quão importante são, por exemplo, as ações afirmativas que encontramos pelo Brasil, o dia nacional da consciência negra e as leis que protegem uma minoria há tempos prejudicada.

 

Anterior Seguinte

Você também pode gostar de...

Comentários do Facebook







Sem comentários

Deixar um comentário